sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

A COLECÇÃO ARQUEOLÓGICA (?) DO BPN


Nunca se me proporcionou (nem seria fácil...) a ocasião para observar esta misteriosa e no mínimo controversa colecção. Soube que alguns colegas arqueólogos -para além do arqueólogo que a avaliou a pedido do BPN ou da conservadora do Museu Nacional de Arqueologia referida no (excelente) artigo publicado em 15 de Fevereiro de 2009 no suplemento "Domingo" do Correio da Manhã- terão  entretanto tido essa oportunidade, a pedido das autoridades competentes (Polícia Judiciária ?). As opiniões expressas por esses especialistas, tanto quanto se comentou em alguns meios, terão sido no sentido de que a generalidade da coleção, seria integrada por objectos falsos... Ou seja, ao contrário da coleção "Miró" de que tanto se falou e que pela sua autenticidade e mais valia artística  acabou por manter-se na esfera pública, a coleção arqueológica que terá custado 5 milhões de Euros ao BPN, desapareceu dos radares do interesse público ou mesmo da curiosidade dos media. Apesar das muitas questões levantadas e não respondidas no que o artigo, excelentemente ilustrado, que aqui reproduzimos.

Pessoalmente e meramente por efeito colateral, tive posteriormente alguma notícia do assunto. No final de uma reunião de trabalho com a Polícia Judiciária, cujo tema e data não posso precisar, mas que terá já sido posterior a 2011, o agente ao saber que eu era arqueólogo, quis saber se eu conhecia a coleção BPN e qual era a minha opinião sobre a mesma. Respondi-lhe que apenas conhecia alguns objectos a partir da reportagem fotográfica do Correio da Manhã mas que, com todas as reservas decorrentes da não observação directa das peças, estas me pareciam falsas, se não na totalidade, pelo menos na sua maioria...

Não sei, entretanto, que caminho este assunto tomou e se foi objecto de tratamento no âmbito do longo julgamento do caso BPN que terminou em Maio do ano passado. Mas tinha alguma curiosidade de conhecer as conclusões da investigação empreendida pelas "autoridades" e qual o destino dado entretanto à "colecção". Aqui está um tema interessantíssimo para o jornalismo de investigação, ou mesmo, de futuro, para alguma tese de mestrado ou doutoramento...sobre "contrafação ou tráfico" de antiguidades.










 ADENDA- 29 Agosto 2018

Uma vez que esta "carta aberta" diz respeito a este controverso assunto, aqui se transcreve a mesma a partir da publicação de hoje mesmo do ARCHPORT

-------- Mensagem original --------
De: Manuel de Castro Nunes 
Data: 29/08/18 11:33 (GMT+00:00)
Para: José d'Encarnação 
Assunto: Carta aberta aos arqueólogos portugueses.

Carta aberta aos arqueólogos portugueses.

Excelentíssimos Senhores.

O meu nome é Manuel Maria Guimarães de Castro Nunes.
Privei, de perto e de longe, com a larga maioria de três gerações de arqueólogos que constituem hoje a elite ou ''intelligentzia'' veterana da arqueologia portuguesa.
Sou filho do Professor Doutor João de Castro Nunes.
Devo pois começar por declarar, sem assombro ou assombramento, que nunca usufruí de qualquer vantagem no exercício de qualquer actividade profissional por ser filho de meu pai. Não apenas por feitio mas sobretudo por isenção, fiz sempre o possível e o impossível por dissociar a minha carreira e a minha actividade profissional do patrocínio do meu pai. A maioria de vós foi sem dúvida mais filho de meu pai do que eu. E declaro-o para, se o quiserdes, o poderdes contraditar.
Poderia, se partilhasse o vosso mau carácter, alegar mesmo que fui vítima e réu de ter sido filho de meu pai.
Importa pois que fique também claro que, ao dirigir-me a vós para expor esta matéria, orienta-me uma opção de princípio que sempre me orientou na vida. Recuso por princípio, se não for rigorosamente indispensável, personalizar assuntos, personalizar as matérias que há muito suscitam a minha crítica consequente e contínua à comunidade arqueológica, à sua hipócrita e conspirativa sociabilidade, à distorção e comércio das práticas, à cultura tosca de cidaddania que se instalou entre vós, ao oportunismo.
Dirijo-me pois a vós sem assombro, consciente de que salvaguardei sempre a minha isenção e a minha consciência e de que, sobretudo, excedendo exorbitantemente o que talvez fosse meu dever, salvaguardei a solidariedade, a confiança, a lealdade.
Ora muito bem, Excelentíssimos Senhores.
Transitou em julgado no passado mês de Abril a sentença final relativa ao Processso 91/09.9 JDLSB, julgado na 1ª Secção da Instância Central, Secção Criminal, do Tribunal da Comarca de Lisboa Oeste, em que, entre outras matérias, se determinou judicialmente a contrafacção ou ''falsidade'' de dois acervos de artefactos alegadamente arqueológicos.
Decidiu o Doutíssimo ou Venerando Colectivo condenar três réus. Dois por burla e um por ''falsidade''. Dos dois condenados por burla, um fui eu, Manuel Maria Guimarães de Castro Nunes, um estranho sujeito, de indefinido estatuto, que vós dizeis que sou historiador e os histariodores que sou arqueológo, embora eu, com sinceridade, nem saiba bem o que sou, porque nunca quis partilhar a obscenidade de uma nem de outra das comunidades.
O réu condenado por ''falsidade'' foram os dois acervos de artefactos alegadamente arqueológicos. Fostes vós quem, numa primeira instância, alegou que eram arqueológicos. Mas que eu, para ser sincero, após tão Doutíssima e Veneranda decisão judicial, já nem sei bem o que são. Nem tenho que saber, pois a matéria está julgada e a sentença transitou em julgado, após sucessivos recursos, nunca de minha iniciativa, pois nem requeri Instrução do Processo de Acusação.
Sabia de antemão qual seria o desfecho, pois conheço muito bem a justiça e melhor ainda os arqueólogos.
Nem tenho nada que saber, digo. Porque agora quem terá que saber serão Vossas Excelências, que confrontarei até à exaustão com a vossa hipocrisia, com a obscenidade do vosso mau carácter e das vossas conjuras de ''vendilhões do templo''. Adiante orientar-vos-ei na hermenêutica desta expressão, ''vendilhões do templo''.
Devo também declarar que, durante todo o julgamento, pouco ou nada me defendi da acusação de burla. Entendi desonroso para mim defender-me de uma acusação que, recaindo sobre mim, competiria mais a vós do que a mim refutar.
Por essa razão concentrei-me na defesa do réu acusado de ''falsidade'', os dois acervos de artefactos alegadamente arqueológicos, que, não sendo obviamente arqueológicos, como sempre propus, seriam, caso não fossem judicialmente condenados, bens culturais de indiscutível apreço. E que vós, hipócritas defensores do património cultural e artístico, teríeis condenado irreversivelmente à destruição material, como determina a Lei, não fosse o recurso à manha judicial que, face ao iminente risco, transitoriamente os livrou do patíbulo.
E que manha foi essa e que transitoriedade a ameaça?
Lede então este extracto da sentença em epígrafe.
''(...)
O Tribunal considera que o o reingresso dos objectos (artefactos integrantes das duas colecçõs) no comércio jurídico (sic!) redundará em sérios riscos de, com os mesmos, virem a ser cometidos novos ilícitos penais ou civis, com utilização dos mesmos, mormente a sua comercialização (...)
Nesta conformidade todos os objectos integrantes das colecções vendidas pelo arguido Joaquim Pessoa à Fundação Estrada e à GESLUSA TRADING são declarados perdidos a favor do Estado.
Com vista ao seu destino final, deverão ser consultados os Directores do Museu da Polícia Judiciária e do Museu Nacional de Arqueologia a fim de se pronunciarem, desigadamente quanto à existência de interesse museológico ou comparativo das peças, a fim de as mesmas virem a integrar o acervo de um ou de ambos desses museus.
Sem prejuízo de o Tribunal vir a considerar, consoante o respondido por estas entidades, o sugerido a fls 3296 pela DLVT da PJ.
(...)''
O sugerido a folhas 3296 pela Divisão de Lisboa e Vale do Tejo da Polícia Judiciária é a destruição material.
Imaginai então, Venerandos e Doutíssimos Senhores Arqueólogos, porque quanto aos Venerandos e Doutíssimos juízes está tudo dito em outros foros, que eu reccorria à mimese do vosso mau carácter, da vossa hipócrita e obscena manha, para vos confrontar, pessoalmente e nomeados, com o vosso papel, de todos e de cada um, nesta tramóia.
Não conto fazê-lo ou ter que o fazer. E esta tem por propósito o propósito que sempre orientou a minha intervenção no decurso não só do julgamento mas de todo o processo que lhe foi preliminar.
Recorrer a alguma réstea de coerência, de isenção, de prudência talvez que vos reste ou sobre. Que reste ou sobre nas vossas atormentadas consciências de hipócritas conjurados.
Que fazer agora?
Que fareis agora para cumprir o vosso compromisso de honra de salvaguardar o património?
E que esperais que faça?

Alqueidão da Serra, 29 de Agosto de 2018.
Manuel de Castro Nunes



A resposta de Luis Raposo no ARCHPORT-30 de Agosto de 2018


Meu caro Manuel Castro Nunes,

Cá recebi a sua carta aberta, que por ser aberta respondo também abertamente, pedindo desculpa por só agora o fazer, não sendo ademais tão conciso quanto quereria, e costumo ser. A verdade é que, como dizia Vieira, me falta tempo (quiçá a arte também) para ser breve.

Recebi, pois, a carta, sim, mas noto que no percurso do correio, devido talvez a lapso do carteiro, na circunstância o nosso bom amigo José d’Encarnação, ficou a faltar o anexo que certamente seria constituído pela sentença final transitada em julgado, que o próprio Manuel considera “doutíssima e veneranda” e que eu muito gostaria ler extensivamente, para meu deleite e porque me ocorre remotamente ser mister fazê-lo para melhor e mais cabal avaliação do seu conteúdo. Não por podendo assim ser, tomo por boa a selecção de conteúdos que o Manuel faz – e sem rebuço tomo por fiável. Em todo o caso, porque nestas coisas de sentenças judiciais sou pouco mais do que analfabeto, sempre lhe pediria o obséquio de, mesmo atento o nosso mau carácter de arqueólogos (e manda o espírito corporativo que enfie a carapuça), no-la facultar ou então nos indicar onde a podemos consultar, se possível à distância de um ou alguns cliques apenas.
Pelo que percebo, após anos de recursos (encontro referência à sentença inicial no relatório de acusações do DCIAP referente a 2014, onde se diz: “NUIPC 91/09.9JDLSB / ACUSAÇÃO DE 2-06-2014: Após julgamento foram condenados 3 arguidos pelos crimes de burla qualificada, falsificação simples de documento, detenção de arma proibida e fraude fiscal simples, a penas de prisão de 5 anos e 100 dias de multa diária de 10€, suspensa mediante regime probatório e ainda uma pena de 3 anos e 6 meses e outra de 8 meses, ambas suspensas mediante regime probatório. Foram declarados perdidos a favor do Estado os objectos das colecções vendidas, as armas e munições apreendidas e ainda outros bens móveis e imóveis apreendidos. Acórdão não transitado em julgado.”), o processo transitou definitivamente em julgado e pode, pois, falar-se neste caso em burla e burlões, assim como em falsificação e falsificador.

Fico contente em saber que assim é. Mas não pela razão que porventura o Manuel antecipará – e aceito ser a mais óbvia: a do comprazimento com a condenação dos agentes materiais ou morais dos referidos crimes. Quaisquer que estes fossem, seriam sempre para mim pessoas com percursos e porventura riquezas de vida que se não poderiam nunca subsumir à prática de um ou mais crimes, quando o tivessem feito. Lembro, aliás, burlões célebres pelos quais nutro alguma distante simpatia – Alves do Reis, por exemplo. E neste caso tenho até estima pessoal, intelectual e mesmo cívica por pelo menos dois, o Manuel e o que presumo ser o outro, o poeta Joaquim Pessoa. Desejo-lhes, por isso, com sinceridade e sem qualquer ironia, as melhores venturas na vida, esperando que este episódio – e trata-se apenas disso – lhes tenha servido de aprendizagem e crescimento.

Não, aquilo que verdadeiramente me contenta neste processo é o facto de ele ter sido iniciado e levado até ao fim (coisa que parece não ser assim tão frequente na justiça), especialmente pelo que ele contém de paradigmático. Entendo até que deveria constituir caso de estudo e andaria avisado o estudante universitário que lhe decidisse consagrar trabalho de pós-graduação.

O que há, pois, de paradigmático neste caso, a meu ver?

Existe em primeiro lugar a questão dos limites do “verdadeiro” e do “falso” em objectos e colecções de Arqueologia. Sabemos bem que a Ciência constitui, por definição, o domínio da dúvida – por oposição à Fé, domínio das certezas. Algumas escolas da Arqueologia, sobretudo em ambientes ditos “pós-modernos”, vieram nas últimas décadas a acumular teoria defendendo a relatividade não somente dos saberes, de todos os sabres, mas das próprias materialidades remanescentes do passado, considerando-as sempre “reinventadas” pelos presentes. Ainda hoje certas correntes, inclusive quando se reclamam do materialismo, incorrem nesse vício (assim ouso chamá-lo, sob minha inteira responsabilidade, claro), esquecendo-se que a afirmação de que “toda a história é história do presente”, com a qual eu concordo em absoluto, não constitui demarcação do idealismo histórico (antes pelo contrário, porque foi igual e magistralmente defendida pelos historiadores idealistas ingleses). O que, sim, demarca a visão materialista da ciência é o positivismo que lhe subjaz, considerando que existe uma realidade objectiva, independente e anterior ao observador – o que, no que à Arqueologia respeita, se traduz em objectos verdadeiros, susceptíveis de serem distinguíveis dos falsos – sendo que estes apenas o são quando pretendem “vender gato por lebre”, quer dizer, quando nos querem fazer crer naquilo que não são. Não são falsas as cópias de estátuas gregas feitas ao sabor do gosto romano novo-riquista; ou as renascentistas, feitas pelo gozo intelectual de revivência do Mundo Antigo; ou as que são realizadas para fins educativos e uso em salas de aula, por exemplo; ou as que artistas de todas as épocas executam, recriando as mais das vezes. São falsas, sim, as cópias ou recriações que se fazem hoje pretendendo que foram feitas há séculos ou milénios. E foi bem este o caso no processo em apreço.

Dir-se-á, como efectivamente se disse em processo e fora dele, com maior ou menor elegância e fazendo por vezes até a ponte com as corrente arqueológicas acima citadas (que assim se vêm inadvertidamente ajuntadas ao mercado dos burlões e falsários), que os arqueólogos são “quadrados de espírito”, positivistas em excesso (afinal, como se viu, eu defendo o positivismo, ou melhor, um certo neo-positivismo), e não conseguem antecipar a novidade, quando afinal nada do que se descobre de novo, existia antes. Sim, é verdade e repito que a Ciência é o domínio da dúvida e temos de estar sempre preparados para a novidade (aliás procuramo-la activamente, na nossa investigação); mesmo para aquela que deita por terra muitas das nossas “verdades” anteriores. Mas não nos deixemos todavia aprisionar dentro de dialécticas juvenis. Como pude afirmar em sede de julgamento neste processo, para explicar a juízes e magistrados quais os limites da dúvida neste caso concreto, diríamos que tal como em Astronomia podemos facilmente antecipar que existam astros, até planetas ou estrelas, nunca vistos, inclusivamente próximo de nós, e que teorias bem sedimentadas, como a do Big Bang, poderão ser invalidadas, no todo ou na parte, já consideramos fora de toda a razoabilidade, poder aceitar quem nos diga que afinal é o Sol que gira à volta da Terra e não aquilo que consideramos verdade adquirida desde que se deixou de mandar para fogueira quem se atrevia afirmá-lo. Ora, as peças e colecções que constam deste processo configuram precisamente esta situação de total e irredutível falta de credibilidade. São falsas porque se pretenderam ser não somente antigas, como representativas de civilizações antigas. Repito: são falsas, ponto final.

Existe depois o lado chamemos sociológico de todo este processo. E ainda aqui ele tem muito de paradigmático.

Como disse antes e afirmei em tribunal, pouco me interessava então saber se quem falsificou, quem burlou ou quem cometeu outros crimes – se eles efectivamente existissem. Deixava isso para a investigação policial e para a acção judicial, exercida como poder de Estado, em nome do Povo. Também declarei ter interesse reduzido, embora maior do que o anterior, em saber as motivações de quem quer que assim tenha procedido. Apenas fiz o que me cumpria: declarar, alto e bom som, que com o saber de que dispunha podia sem margem para dúvidas dizer que se tratava de objectos falsos.

Chegados aqui, permito-me porém confessar que, quanto a motivações, cheguei a pensar para mim que fosse por mero gozo intelectual, para demonstração de como são frágeis as “verdades” da Arqueologia e de como são pusilânimes os arqueólogos na sua defesa. Claro que as informações subsequentes quanto às maquias envolvidas, fizeram-me descer à terra e perceber que poderiam ter existido, ou existiram mesmo (falta-me ler o processo em toda a sua extensão, hélas) motivações bem mais venais. Mas subsiste um facto: a dificuldade em fazer com que arqueólogos e outros especialistas em objectos antigos cumpram a sua responsabilidade cívica em toda a extensão, nomeadamente através da peritagem e do testemunho em tribunal. Uma dificuldade que os falsários e burlões usam em seu benefício. Ouvi de tudo neste processo, de colegas meus: que não estavam para chatices; que era tudo tão obviamente falso, que não valia a pena perder tempo; que a nossa função é investigar, mais nada… Que sirva, pois, este processo também de lição para arqueólogos e especialistas em arqueo-ciências, fazendo que despertem e assumam em plenitude a sua função social, a qual passa também por dar testemunho das suas “verdades”, dentro dos limites das mesmas, claro. Quem não se dá ao respeito, não pode pretender ser respeitado. Felizmente e como o Manuel bem sabe, goste ou não, aceite ou não o fundamento dos mesmos, houve neste processo quem deste universo científico e sociológico se mobilizasse para constituir peritagens e emitir pareceres sem papas na língua.

Eis porque, caro Manuel, fico contente com os desfecho que nos diz ser o deste processo. Como disse em tribunal e afirmei acima, desconhecia se existiam e quem fossem os autores de eventuais crimes praticados. Atenta agora a sentença que nos diz ter transitado em julgado, verifico que o Manuel (presumo que também o Joaquim Pessoa) foram assim condenados. Seria cínico se dissesse que tenho pena, porque se o tribunal deu como provado que houve crimes e identificou os autores, eles têm mesmo de ser condenados, sejam quem forem. Mas repito aqui o que então disse à juíza: não tenho nada contra qualquer dos dois, que na altura afirmei presumir serem pessoas de bem e cordialmente cumprimentei antes de sair da sala . Não sei que consequências, materiais ou outras, terá esta condenação na sua vida. Mas creia que não lhe voltarei as costas quando nos cruzarmos e continuarei aceitar os seus reptos, quando entender que se cruzam com os que a mim mesmo faço, continuarei a concordar ou discordar de si, enfim, continuarei a respeitá-lo, como julgo que me respeitará a mim. Presumo que, partilhando eu embora o “mau carácter” dos arqueólogos, possa aceitar que tenha também algum do carácter que a família e vida em toda a sua extensão me incutiram, o qual tenho por bom.

Respeitosamente,

Luís Raposo

Obs. Quanto à questão do destino a dar aos objectos declarados perdidos em favor do Estado, posso dizer-lhe que dei em devido tempo parecer em sentido contrário à destruição, propondo antes a integração no Museu da Polícia Judiciária, onde certamente iriam ampliar, com benefício público, as já vastas colecções de falsificações detectadas através da acção judicial e penal. Para o Museu Nacional de Arqueologia é que não, pois, como o próprio Manuel agora (e muito bem) reconhece, eles não são sequer objectos arqueológicos.

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