sexta-feira, 29 de setembro de 2017

O POLO DA MEMÓRIA DA LUZ
Recordando a Arquitecta Maria João George

O "Polo da Memória" da nova Aldeia da Luz (a Igreja reconstruída, o cemitério trasladado, e o Museu da Luz), vencedor de um Prémio EUROPA NOSTRA em 2005
Foto Museu da Luz

Ao longo do nosso percurso profissional, vamo-nos cruzando e interagindo com muita gente, mais ou menos relacionada com a nossa actividade. É essencialmente por aí que nos vamos enriquecendo profissional e humanamente, completando a sempre limitada formação e experiência que trazemos da escolaridade que a vida e a sociedade nos proporcionou. Mas, natural e inevitavelmente, a maior parte dessas pessoas com quem vamos trabalhando, acaba por rapidamente se desvanecer da nossa capacidade de memória, pelo menos ao nível do consciente. Naturalmente que há muitas excepções, uma vezes ditadas pelas especiais circunstancias da interação (tenho ainda companheiros de trabalho a que me ligam laços profissionais desde os tempos da Faculdade), outras pela excepcional personalidade intelectual ou humana do interlocutor, outras ainda porque ligadas a acontecimentos ou projectos de especial significado nas nossas carreiras e que, por arrasto, acabam por ficar associadas aos mesmos. Há ainda aquelas situações que, coartadas abruptamente em resultado de trágicos eventos, acabam por adquirir um peso especial nas nossas lembranças.

Revista Expresso, 16/9/2017

Tudo isto vem a propósito da grande entrevista que o Dr.Francisco George deu ao EXPRESSO há poucas semanas, na antecipação da sua próxima aposentação como Director Geral de Saúde. Não sendo exemplo do que acima referi (nunca nos cruzámos pessoalmente e muito menos profissionalmente), não deixa de qualquer modo de ser alguém, que pela sua assídua presença televisiva, particularmente em momentos difíceis, acabou por se nos tornar familiar, até pela grande serenidade e clareza das suas intervenções que o tornaram uma figura de referencia, valorizando a função pública que tão dedicadamente serviu. Nessa longa e desassombrada entrevista, veio a certa altura à colação, a referencia às trágicas circunstancias do desaparecimento da sua esposa, arquitecta Maria João George e da filha, há pouco mais de uma década. E por aí, sim, se justifica a reflexão inicial deste "post". 

Capa da edição póstuma (2009) das crónicas que durante algum tempo MJG escreveu para o "Diário do Alentejo". O belo prefácio escrito por Francisco George pode ler-se aqui: http://www.franciscogeorge.pt/text/35501.html

Apesar da ligação de MJG ao (Baixo) Alentejo recuar bastante no tempo, apenas nos conhecemos em 1996 no âmbito do Projecto do Alqueva, a que ela já estava associada antes da minha ida para a EDIA. Trabalhávamos em áreas e locais diferentes mas, como se calcula, num empreendimento com as implicações territoriais, sociais, ambientais, culturais, etc..., como o Alqueva, não podia haver áreas estanques. Naturalmente, a componente patrimonial e arqueológica tinha de estar presente em muitas e diversificadas frentes, como na do processo de trasladação da Aldeia da Luz que MJG coordenou de forma exemplar. Para além do complexo projecto da Luz, acabaríamos por colaborar também noutras áreas e projectos -muito por culpa da visão do nosso chefe comum, Joaquim Marques Ferreira, primeiro como Administrador da área do Ambiente, mais tarde como Presidente do Conselho de Administração- sempre na perspectiva de tirar o máximo partido para as populações dos inegáveis sacrifícios decorrentes do empreendimento, construindo algo que fosse mais do que  energia ou água ao serviço de terceiros. Seria esta visão humanista e social do Empreendimento, o grande contributo da MJG para o projecto do Alqueva, e a grande lição que, pessoalmente, retirei do convívio profissional que mantivémos ao longo de uma década. Foi por isso que, já depois da minha saída da EDIA, ela viria a apoiar entusiasticamente o projecto que promovi no Castro dos Ratinhos (2004-2007), numa perspectiva de valorização ambiental e patrimonial na envolvente da Barragem. Foi também por essa razão que tanto se envolveu na recuperação do Monte e da  Herdade da Coitadinha, um projecto de compensação ambiental promovido pela EDIA, que permitiu transferir para a esfera pública um excepcional conjunto histórico (Castelo fronteiriço de Noudar), ambiental (Herdade com mais de 1000 ha) e etnográfico (o "monte" e todas as estruturas afins). Seria aliás, no dia inauguração das obras no Monte da Coitadinha, em que naturalmente esteve presente como recorda Francisco George, que se consumaria a tragédia que vitimou mãe e filha.

Recentemente, reencontrei um texto que então escrevi, ainda sob o choque da notícia que correu célere por todo o Alentejo e que julgo nunca ter antes divulgado. Aqui fica em memória da Maria João George.


Nova Aldeia da Luz_ um novo prémio

Afinal sempre existem coincidências e, por vezes, coincidências verdadeiramente trágicas. Ainda que a atribuição de prémios ao Museu da Luz comece a não ser novidade, a distinção que acaba de ser concedida ao conjunto denominado (não sei se pela própria Arquitecta Maria João George) de “Polo da Memória”, integrando o "Museu, a Igreja e o Cemitério da Nova Aldeia da Luz”, é talvez aquela que mais fica a dever à directa intervenção da malograda Arquitecta, enquanto coordenadora do projecto urbanístico da Nova Aldeia. Julgo que o Arquitecto Pedro Pacheco, autor do triplo projecto que na categoria de “Conservação do Património Arquitectónico" acaba de ser distinguido pela "Europa Nostra”, será o primeiro a reconhecer a importância decisiva do contributo da colega. Com efeito, e apesar da qualidade arquitectónica específica daquelas intervenções, em particular a do Museu já reconhecida internacionalmente, a atribuição de um prémio no domínio específico da “conservação do património” a um conjunto de obras novas, poderia parecer no mínimo incongruente. Obviamente que os peritos responsáveis pela acertada decisão tiveram em conta todo um conjunto de circunstâncias e atributos que a suportam e justificam plenamente. Os realojamentos colectivos de comunidades há muito enraizadas, são normalmente processos extremamente complexos, autênticos laboratórios sociais propiciadores das mais variadas análises e experiências mas de resultados nunca garantidos. O caso da Aldeia da Luz, sem antecedentes em Portugal - todos sabemos como se resolveu, por exemplo o (não) realojamento da população da aldeia comunitária de Vilarinho das Furnas também afundada por uma Barragem- não podia fugir à regra. Pelo contrário, o processo da Luz revelar-se-ia bem mais difícil de gerir graças a um novo factor, tipicamente contemporâneo, o permanente (e muitas vezes “em directo”) escrutínio dos “media", em particular das televisões, com todos os habituais e por vezes perniciosos efeitos de "feed-back”. Apesar disso foi possível, graças em grande parte às excepcionais qualidades da Maria João (invejável capacidade de diálogo, paciência quase infinita, fino sentido social, grande experiência técnica e, sobretudo, uma rara grandeza de alma associada a uma modéstia quase monástica) conseguir-se um resultado final hoje quase unanimemente reconhecido, a começar pelos primeiros interessados, como muito positivo, no âmbito urbanístico, arquitectónico ou social.  E de facto, com todas as correcções de percurso, nem sempre no sentido que social ou tecnicamente parecia mais justo ou adequado, com todas as posteriores alterações decorrentes da inevitável afirmação dos interesses e gostos individuais, aí está uma Nova Aldeia, capaz de retomar - talvez com uma força anímica inesperada - um percurso comunitário apenas perturbado em nome das necessidades de desenvolvimento do país. 

Dadas as circunstâncias, terá sido no conjunto dos equipamentos colectivos considerados da "memória” que, sem descurar a necessária interacção social sempre garantida peia intermediação da Maria João George, a capacidade criativa e inovadora da intervenção arquitectónica, mais se afirmaria. Com efeito, mesmo com algumas condicionantes duramente negociadas com a população- das exigências de construção de uma réplica da velha Igreja Matriz quinhentista, à integral “reposição” do cemitério- foi possível chegar ao magnífico objecto de arquitectura contemporânea que abriga e enquadra as memórias recentes ou remotas do território da velha aldeia, verdadeira ponte entre o passado, o presente e o futuro. O resultado final, hoje parecendo óbvio e linear na sua singeleza, é afinal o produto de um grande projecto colectivo, envolvendo população, autarcas, gestores, arquitectos, arqueólogos, etnólogos, museólogos, etc..., um projecto que tantas vezes parecia ir sucumbir perante dificuldades e incompreensões de toda a ordem, mas a que a Maria João George, na sua infinita paciência e sensibilidade, sabia dar de novo alento e recolocar no caminho certo. Provando afinal, antes das classificações da “Europa Nostra”, que o “património” não é feito apenas de relíquias do passado, mas é, antes de mais, uma permanente construção de um futuro colectivo melhor, com memória.
(23 de Março de 2006)


O obituário do Público




Notícia da atribuição ao Museu da Luz do Prémio EUROPA NOSTRA/2005

Agência LUSA
23 Mar, 2006, 16:06 | Cultura
O museu, cemitério e igreja da aldeia da Luz, Mourão (Évora), foi o único projecto português galardoado na edição dos prémios Europa Nostra/2005, em terceiro lugar numa das categorias, informou hoje a empresa gestora de Alqueva.
As intervenções arquitectónicas, segundo a Empresa de Desenvolvimento e Infra-estruturas de Alqueva (EDIA), foram promovidas no âmbito da construção da nova aldeia da Luz, visto que a antiga povoação ficou submersa pelas águas da albufeira.
O projecto referente ao museu, cemitério e igreja de Nossa Senhora da Luz foi um dos galardoados com o diploma de terceiro lugar, distribuídos pelas cinco categorias a concurso da edição de 2005 dos prémios Europa Nostra da União Europeia.
Estes prémios, criados em 2002 pela associação Europa Nostra (que reúne organizações não governamentais na área do património) e pela União Europeia, visam reconhecer as melhores práticas na conservação do património em território europeu.
O valor arquitectónico dos equipamentos da localidade alentejana foi reconhecido na categoria "Conservação do Património Arquitectónico", cujo primeiro prémio foi entregue aos banhos otomanos do século XVI de Omeriye (Chipre).
Nesta categoria, o concurso Europa Nostra distinguiu ainda seis projectos com segundos prémios e, além do caso da aldeia da Luz, outros dez com diplomas associados ao terceiro lugar.
As outras quatro categorias dizem respeito à "Conservação de Paisagens Culturais", "Conservação de Obras de Arte", "Estudos Científicos" e "Dedicação à Conservação do Património".
No total, nas cinco categorias, realça a EDIA, foram nomeados 214 projectos, analisados por peritos independentes e avaliados por um júri, que elegeu cinco primeiros classificados e atribuiu nove medalhas (segundo lugar) e 17 diplomas (terceiro lugar).
A entrega dos prémios referentes à edição de 2005 vai decorrer durante a cerimónia anual da European Heritage Awards, em Junho, marcada este ano para o Palácio Real de El Pardo, em Madrid (Espanha).
Os cerca de 400 habitantes da antiga aldeia da Luz começaram a ser transferidos para a nova povoação, construída de raiz, a cerca de dois quilómetros de distância, em Novembro de 2002.
A aldeia foi desmantelada em 2003, tendo todo o processo de transferência sido considerado um dos impactos sociais mais importantes decorrentes do avanço do empreendimento de Alqueva.
Na nova aldeia, além do museu, cemitério e duas igrejas (uma delas a de Nossa Senhora da Luz), foram construídos outros equipamentos colectivos como a junta de freguesia, centro de dia, sociedade recreativa, escola primária e jardim infantil.
Um pavilhão polivalente, praça de touros, tanque, unidade de saúde, campo de futebol, área de jogos tradicionais e campo descoberto, instalações de apoio ao mercado e jardim público foram outras das infra-estruturas, juntamente com 210 habitações, 11 comércios, 75 casões, 92 arrecadações, 33 alpendres e 82 cozinhas-de-lume.
O museu, por exemplo, foi inaugurado em 2003 e já foi objectivo de várias nomeações e prémios internacionais, procurando, através do seu espólio, perpetuar o passado histórico-arqueológico das terras submersas pela albufeira de Alqueva na freguesia da Luz







quarta-feira, 27 de setembro de 2017

Do Escoural a Lascaux

A entrada da verdadeira Gruta de Lascaux, na actualidade. (Imagem do documentário citado)


Lascaux, em Abril de 1963, numa raríssima oportunidade de visita que recordei em:
http://pedrastalhas.blogspot.pt/2015/01/viagem-ao-berco-da-pre-historia.html

Passou na semana passada (20 Setembro 2017) na RTP2 um fantástico documentário sobre a concepção e construção da mais recente réplica da Gruta de Lascaux (Lascaux 4- Salvem a arte rupeste) que recomendo vivamente (enquanto estiver disponível no MEO...) aos arqueólogos e outros interessados no património. A escala do projecto e da obra, sob todas as perspectivas é verdadeiramente avassaladora e profundamente perturbadora para quem conhece as condições em que se trabalha e faz arqueologia em Portugal, nomeadamente nesta componente de mediação com o público, afinal a última razão de ser da disciplina. Mas agora imaginem a sensação de quem é (ainda) científica e tecnicamente responsável pela única gruta rupestre paleolítica portuguesa, ao ver o documentário...como é o meu caso. Não fosse o calejamento e a capacidade de relativização que a idade nos traz e a "depressão" era inevitável...

Lascaux 4 e o Centro Internacional de Arte Parietal, em vista aérea (fotomontagem obtida na INTERNET)
Acesso a Lascaux 4, inaugurado no final de 2016 (imagem da INTERNET)
Não é obviamente que o ESCOURAL seja comparável com LASCAUX, apesar de algumas relações curiosas. O primeiro grande estudioso de Lascaux, o Padre André Glory, foi o "atestador" da antiguidade paleolítica do Escoural, onde ainda esteve em missão durante alguns dias em 1965, pouco antes de falecer. O ano da descoberta do Escoural (1963) coincide com a tomada de consciência dos impactos turísticos na preservação da arte rupestre, implicando a decisão de André Malraux de fechar e condicionar fortemente o acesso à Gruta de Lascaux que estava a ser explorada comercialmente por privados. Por fim, e como o próprio Glory destacou, a Arte Rupestre do Escoural, podendo ser mais antiga que a de Lascaux, representava e representa ainda o local mais ocidental da Europa que, de algum modo se aparenta e relaciona com as fantásticas manifestações artísticas de Lascaux.

Por tudo isso mas não só, o ESCOURAL mereceria um pouco mais de atenção dos portugueses... Felizmente, ao contrário de outros monumentos fantásticos da Pré-história na sua vizinhança. como os Almendres ou a Anta Grande do Zambujeiro, está pelo menos na posse do Estado.  E nos últimos anos (2009-2011) foi mesmo possível investir na sua requalificação (acessos e estacionamento, circulação interior e iluminação). Mas os problemas habituais subsistem. Esgotadas as verbas para as obras provenientes do financiamento europeu, não existem recursos para a manutenção corrente, sendo já notórios os sinais de degradação. E a interação com o público? Uma única guia, subcontratada (?) através de verdadeira "engenharia administrativa", assegura o funcionamento do Centro de Interpretação (na povoação do Escoural, a 3 Km da Gruta), a marcação obrigatória das visitas, e as próprias visitas... Nestas condições alguma coisa terá de funcionar menos bem.


A Gruta do Escoural, após as obras de requalificação em 2011.

A título de registo e memória futura (e apesar de ter divulgado já este documento na Revista ALMANSOR, nº 1, 3ª série, 2015) aqui deixo o texto que produzi em 2008 e que na altura fiz seguir hierarquicamente "para os devidos efeitos", com uma proposta de "arqueologia pública" para a Gruta do Escoural. Das componentes dessa proposta viriam apenas a concretizar-se entre 2009 e 2011, graças às verbas europeias, as componentes de requalificação física da Gruta. Tudo o mais não passou de piedosa reflexão. De qualquer modo aqui fica, para eventuais curiosos, este modesto contributo. 

Mas por favor, se poderem, não deixam de ver o documentário sobre Lascaux 4.


“ArqueoCENTRO Rupestre” do Escoural


 Gruta do Escoural- importância e estatuto

A Gruta do Escoural, pequena cavidade natural localizada próximo de Santiago do Escoural, a meio caminho entre Montemor-o-Novo e Évora, conserva, para além de outros vestígios, testemunhos raros de “arte rupestre paleolítica” (em Portugal, caso único em gruta), e integra-se numa região que pelo seu elevado interesse ambiental e patrimonial, a Serra de Monfurado, apresenta um forte potencial no domínio do turismo cultural. Classificada como Monumento Nacional desde a descoberta em 1963, a Gruta é actualmente propriedade pública, afecta ao Ministério da Cultura através da Direcção Regional de Cultura do Alentejo (DRCALEN). Esta Direcção é também responsável pela gestão de um pequeno Centro Interpretativo, instalado desde 2001 na localidade do Escoural, em edifício da Junta de Freguesia.


Situação actual e potencialidades

No início da presente década, o número de visitantes do conjunto arqueológico do Escoural (Centro e Gruta) chegou a superar, em média, os mil por mês mas nos últimos dois anos, problemas vários têm afectado o funcionamento regular destas estruturas, com efeitos nefastos sobre a procura turística. Ainda que DRCALEN e a própria Câmara Municipal de Montemor-o-Novo (CMMN) estejam, entretanto, a procurar soluções que permitam retomar, no curto prazo, um nível de funcionamento mais adequado à importância do conjunto, existe a noção de que, face à natureza e raridade dos valores em causa, é possível e necessário, oferecer muito mais aos visitantes. Só avançando nessa direcção, tirando partido não apenas do renome do sítio “Gruta do Escoural”, mas também do ambiente natural e cultural em que o mesmo se integra, será possível transformar todos estes valores num recurso estratégico ao serviço do desenvolvimento local e regional.


Um recurso identificado na Carta Estratégica do Concelho de Montemor-o-Novo (2007-2017)

Com efeito, a Carta Estratégica do Concelho de Montemor-o-Novo, não só reconhece o turismo como um factor de impulso ao desenvolvimento regional e local, como identifica a Gruta do Escoural e o Sítio da Rede Natura 2000 do Monfurado, como recursos culturais e ambientais de interesse estratégico. Desse reconhecimento decorre, aliás, no âmbito do respectivo “Programa de Actuação”, a formulação de um projecto intitulado “PARQUE CULTURAL DO PALEOLÍTICO E NEOLÍTICO E RESPECTIVO NÚCLEO MUSEOLÓGICO”. Ainda que difuso quanto ao modelo subjacente e recorrendo a conceitos hoje algo banalizados (“Parque Cultural”/ “Núcleo museológico”), a proposta revela consciência da mais-valia arqueológica em causa (Gruta e Património Megalítico em especial) e da necessidade de a colocar ao serviço do desenvolvimento.


 1963-2013- O cinquentenário da descoberta_ um pretexto e uma oportunidade


Nesse sentido, a circunstância de no ano de 2013 se comemorar o cinquentenário da descoberta da Gruta, protagonizada por trabalhadores do Escoural, pode e deve ser “agarrada” como uma oportunidade ou um pretexto para, correspondendo aos anseios há décadas manifestados pelas populações e entidades locais e regionais, e aos objectivos estratégicos assumidos pela própria autarquia, identificar, planear e promover um conjunto de acções que permitam, de forma integrada e sustentada, colocar este Património ao serviço de um grande projecto de desenvolvimento regional. Naturalmente, o presente documento, assume-se como uma proposta preliminar de “programa-base”, de apoio à decisão da DRCALEN e da Autarquia, entidades que, independentemente das soluções, fórmulas de desenvolvimento, e eventuais parcerias, públicas ou privadas, estarão necessaria e inevitavelmente na base de um projecto com essa ambição. 



1. conceito e pressupostos subjacentes à proposta de um “ArqueoCENTRO Rupestre” no Escoural




2. desenvolvimento, concepção e execução da componente física do “ArqueoCENTRO Rupestre do Escoural”




3. viabilidade e sustentabilidade do “ArqueoCENTRO Rupestre do Escoural”




1. A criação de um ArqueoCENTRO RUPESTRE  DO ESCOURAL_ conceito base e pressupostos que lhe dão consistência



1.1. Conceito base e localização


            Propõe-se a criação na área urbana do Escoural, ou na sua envolvente imediata, (eventualmente tirando partido da recuperação e reutilização de construções já existentes) de um ArqueoCENTRO RUPESTRE, uma ampla estrutura física que integraria para além de uma área expositiva e interactiva no domínio da divulgação científica sobre as Arqueociências em geral e a Pré-História em particular, uma estrutura técnica responsável pela valorização e animação turístico-cultural da Gruta do Escoural e outros recursos patrimoniais e naturais da Serra do Monfurado.

Sendo a ligação à GRUTA, o eixo vital do projecto, a localização do ArqueoCENTRO deverá ser devidamente ponderada. A opção urbana, apresenta mais vantagens do que desvantagens, nomeadamente de ordem prática e económica, quer para a fase de construção/ instalação quer para o funcionamento futuro, permitindo tirar proveito de uma estreita articulação com a vida da própria localidade. Ainda assim, a grande vantagem dessa separação (cerca de 3km) residirá na possibilidade de, mesmo com algumas melhorias necessárias a promover na Gruta e na sua envolvente, conservar e tirar o máximo partido possível do seu ambiente natural, conferindo à visita (sempre de forma organizada e em complemento das actividades do ArqueoCENTRO) um ar de aventura e de descoberta…Por outro lado, esse afastamento permitirá aliviar a previsível pressão turística sobre a cavidade natural que um projecto desta natureza induzirá, sem frustrar totalmente as expectativas dos utentes do ArqueoCENTRO, que por qualquer motivo ou circunstância, não possam aceder à Gruta.




­­­­­­­­­­­­­­1.2. Componentes do ArqueoCENTRO RUPESTRE


            A-  um núcleo ou Centro de Ciência Viva* (CCV) dedicado à exploração experimental/interactiva (conjugando áreas expositivas com ateliers experimentais, em área coberta ou ao “ar-livre”) de temáticas científicas relacionadas com a Pré-história, como por exemplo: a Evolução Humana e a Teoria Darwinista, as Arqueo e Geociências (da Geologia, aos métodos geofísicos de datação absoluta, passando pela Palinologia, Paleobotânica, Arqueozoologia…), o Megalitismo e, naturalmente, a Arte Rupestre. Este núcleo, estará essencialmente virado para o apoio didáctico a grupos de alunos dos vários graus de ensino, mas deverá poder responder também ao interesse e curiosidade dos turistas ocasionais ou dos grupos “seniores”, neste caso através de actividades de terapia ocupacional; deverá funcionar em directa articulação com as visitas organizadas à Gruta do Escoural, ou em alternativa ou complemento, a outros monumentos e sítios pré-históricos da região (Montemor e Évora), como o Cromeleque dos Almendres ou a Anta Grande do Zambujeiro.
           
*Os Centros Ciência Viva são espaços interactivos de divulgação científica e tecnológica distribuídos pelo território nacional, funcionando como plataformas de desenvolvimento regional - científico, cultural e económico - através da dinamização dos actores regionais mais activos nestas áreas- in www.cienciaviva.pt


B - um núcleo interpretativo da Gruta do Escoural e património associado, especialmente vocacionado para a valorização, conservação e gestão turística da Gruta (organização e acompanhamento das visitas; monitorização ambiental; manutenção). Ainda que a componente interpretativa ou museológica, deva integrar-se, de forma mais ou menos destacada, no discurso expositivo do CCV (geologia, antropologia, cronologia, arte rupestre, pré-história…), a este núcleo seriam assacadas as funções de gestão corrente do Monumento Nacional_ Gruta do Escoural, (por concessão da DRCALEN e sob a supervisão desta) incluindo além da organização das visitas, a monitorização regular das respectivas condições ambientais e a realização das acções de conservação, manutenção e eventualmente, de investigação.


            C - um núcleo para a divulgação e valorização turístico cultural dos recursos patrimoniais e ambientais da Serra do Monfurado. Este núcleo, algo supletivo em relação aos anteriores, resultaria antes de mais do interesse e vantagens óbvias em tirar partido das infra-estruturas e meios técnicose humanos instalados para promover, informar e divulgar a utilização turística sustentada dos recursos ambientais e patrimoniais do Sítio do Monfurado, nomeadamente através do apoio ao desenvolvimento de percursos pedonais, cicláveis, todo-o-terreno, etc… Naturalmente, essa promoção poderá e deverá articular-se com as restantes valências científicas e culturais, numa lógica de complementaridade que alargará o leque de potenciais interessados e diminuirá os riscos de uma especialização excessiva, demasiado direccionada ou sujeita a grandes oscilações sazonais.


Em síntese, o ArqueoCENTRO RUPESTRE do Escoural, concentraria num mesmo espaço, partilhando os mesmos recursos humanos e técnicos, valências funcionais diversas mas complementares (com um leque de destinatários, tão abrangente quanto possível) nomeadamente: um espaço expositivo interactivo sobre as ciências relacionadas com a Pré-história; ateliers didácticos de exploração “ao vivo” de tecnologias e práticas pré-históricas (talhe do sílex, produção do fogo, fabrico de tintas a partir dos pigmentos naturais, fabrico de vestuário a partir de peles de animais, produção de cerâmica manual e à roda, etc…); um “balcão” de informações, de organização de visitas acompanhadas à Gruta do Escoural e de exploração do vasto património cultural e natural da Serra de Monfurado ou mesmo da região de entre Montemor e Évora;


1.3. Factores favoráveis a um projecto com estas características:


i. Relação de proximidade e de onomástica entre a Vila de Santiago do Escoural e a Gruta do Escoural, a única cavidade portuguesa com vestígios de Arte Rupestre Paleolítica, e uma das raras, ainda visitáveis, a nível internacional;

ii. Associação, quase do senso comum, entre “ESCOURAL e PRÉ-HISTÓRIA”, consolidada por várias décadas de ensino da disciplina de História nos Ciclos Preparatório e Secundário;

iii. Localização estratégica do Escoural, no que respeita a acessibilidades, atravessada pela velha Estrada Nacional Nº2, a poucos quilómetros de duas saídas da A6 (Montemor-o-Novo Oeste e Évora Oeste), e muito próximo da estação de Casa Branca, (bifurcação da Linha  de caminho ferro do Sul);ou seja a pouco mais de 1,30h da Grande Lisboa ou de Badajoz. 

iv. integração num contexto paisagístico e ambiental de valor reconhecido, (SÍTIO DE MONFURADO, classificado como Sítio de Importância Comunitária, aprovado pela Portaria 829/2007 de 1 de Agosto) e de grande potencial patrimonial, nomeadamente nos domínios da Pré-história e especificamente do MEGALITISMO (antas, menires e recintos megalíticos, alguns reconhecidos internacionalmente, como o Cromeleque dos Almendres ou a Anta Grande do Zambujeiro)

       v. o carácter praticamente inédito, a nível nacional, de uma estrutura deste tipo quer pelas temáticas propostas quer pela relação directa e prática que é possível estabelecer com vestígios patrimoniais associados. (Nota: dos 16 CCV existentes no país_ apenas 1 no Alentejo, em Estremoz dedicado à Astronomia_ nenhum aborda as Arqueociências ou a Pré-história; mesmo os Museus de Arqueologia, com excepção do Museu de Mação, com algumas experiências no domínio de “ateliers”, raramente abordam ou tratam estas temáticas na perspectiva proposta para o ArqueoCENTRO.)


1.4. Públicos potenciais

 As limitações “físicas” da GRUTA

As poucas estatísticas disponíveis, mostram que, nos períodos de funcionamento regular (sem qualquer promoção especial), a Gruta do Escoural foi procurada, em média, por cerca de 1000 visitantes mês, ou seja cerca de 30 pessoas dia. Na prática, sabemos que esse número diário, variava muito, havendo mesmo dias, em que por motivo de “visitas de estudo”, as entradas na Gruta podiam atingir a centena e meia de pessoas.

Ainda que, teoricamente haja interesse, por várias razões, em atrair ao Escoural o maior número possível de visitantes, deverá ter-se sempre presente nos estudos de viabilidade, que existem limitações e condicionantes objectivas não ultrapassáveis no que respeita à visita à Gruta propriamente dita. Antes de mais por razões conservacionistas, considerando a necessidade de controlar e minimizar os efeitos negativos de quaisquer excessos de visitantes. Por outro lado, por razões práticas, atendendo às condições específicas do espaço físico disponível no interior da cavidade e à necessidade de acompanhamento obrigatório das visitas. Ainda que a duração e as características das visitas se devam adaptar aos diferentes tipos de visitantes, tendo em conta a experiência acumulada de acompanhamento dos vários modelos de visita ensaiados ao longo das duas últimas décadas, bem como os resultados dos estudos de conservação promovidos pela exDRÈvora do IPPAR, a seguir se indicam aqueles que nos parecem ser os limites de acessibilidade pública à Gruta (partindo do princípio que são introduzidas algumas benfeitorias propostas pelos referidos estudos e de que se promoverá a monitorização permanente dos vários índices ambientais com interesse para a conservação…)  

Considerando um horário base das 10h às 18h, seria, teoricamente, possível organizar 14 visitas diárias x 10 pessoas, ou seja um total máximo de 140 entradas diárias na Gruta. Nos dias em que haja “visitas de estudo” ou “excursões”, o nº de visitas turísticas terá que ser reduzido para 12 ou para 10 (conforme haja 1 ou 2 excursões…). Nesse caso aquele número de 140 entradas poderia, teoricamente, ser ligeiramente ultrapassado (150 ou 160 pessoas).

Com estes dados calculamos a capacidade máxima da GRUTA DO ESCOURAL entre 30 a 40 000 visitantes ano, desde que reunidas novas condições de acesso (construção da “antecâmara” ) e montado um novo sistema de monitorização das condições ambientais.

Este número pode parecer demasiado optimista quando comparado com os dados estatísticos disponíveis, mas será necessário contar com um incremento significativo de visitantes com a criação do ArqueoCENTRO RUPESTRE e o efeito novidade associado. Não será muito legítimo procurar extrapolar resultados em função dos nºs de visitantes que o “Fluviário de Mora” atingiu no primeiro ano e meio de vida (300 000 visitantes…) mas esse dado mostra claramente que há público para iniciativas com qualidade, desde que feita a respectiva divulgação e que não seja frustrada a expectativa das pessoas. Nesse sentido, a visita à GRUTA deverá sempre ser apresentada como a “cereja em cima do bolo” a que apenas alguns terão direito (desde que se organizem com a devida antecedência…), insistindo o plano de Marketing em tudo o mais que o ArqueoCENTRO tenha para oferecer aos públicos mais diversos. Assim e tendo em conta os dados turísticos referentes a Évora, julgamos que não será exagerado estimar números de potenciais visitantes do ArqueoCENTRO, bem acima dos 50 000/ano.


            Os visitantes potenciais e as respectivas expectativas:

            Da análise dos dados estatísticos, ficamos com a noção de que os visitantes que procuram a Gruta do Escoural se repartem, em percentagens equivalentes, por 3 grupos principais:

- os grupos escolares, dos vários graus de ensino, desde o Primário ao Universitário, incluindo grupos escolares estrangeiros (diversas nacionalidades);

- os turistas estrangeiros, por vezes em grupos canalizados por Agências;

- os turistas portugueses, por vezes em grupos (excursões);



Gruta do Escoural (1989-2006)_ Total de visitantes (azul) e visitantes estrangeiros (vermelho)  -2006_dados incompletos



O aspecto mais significativo destes dados, é a grande representatividade dos visitantes estrangeiros que se pode explicar por três razões: i. a proximidade de Évora, cidade com um turismo de âmbito cultural muito significativo; ii. o interesse que a “arte rupestre” induz em determinados grupos; iii. o facto da maior parte das grutas espanholas e francesas com arte rupestre, ou estarem fechadas ou serem de acesso ou visita difícil.
           
Neste contexto, o ArqueoCENTRO RUPESTRE, deverá encontrar quer nas soluções expositivas quer no modelo de funcionamento, um equilíbrio entre a componente didático-formativa (orientada para os grupos escolares ou mesmo para os grupos “seniores” ou o “turismo de famílias”) e a componente turístico-cultural muito ancorada na Gruta e no património megalítico regional tirando partido dos muitos milhares de turistas que procuram Évora anualmente.



Públicos “alvo” do ArqueoCENTRO RUPESTRE:


- grupos escolares nacionais e estrangeiros (ateliers didáticos, visitas à Gruta e aos Monumentos Megalíticos da região)- Outubro/Novembro; Janeiro a Maio; será o grupo menos “dependente” da Gruta, até porque os “ateliers” poderão explorar e encaminhar os grupos para outras temáticas;

- grupos seniores (ateliers ocupacionais e visitas patrimoniais diversas)_ ao longo do ano;
    
- turistas nacionais de forma individual  (visitas à Gruta e M.Megalíticos)_ao longo do ano, com maior incidência nos meses de Verão e nas férias da Páscoa;_ duma maneira geral pretenderão visitar a Gruta

- turistas estrangeiros (visitas à Gruta)_ ao longo do ano, com maior incidência na Primavera/Verão_ especialmente atraídos pela possibilidade de visitar a Gruta;

- grupos nacionais de turismo “alternativo” organizado (visitas à Gruta e percursos na Serra do Monfurado)_ especialmente no Outono e Primavera; menos dependentes da visita à Gruta.




2. Desenvolvimento, concepção e execução da componente física do “ArqueoCENTRO RUPESTRE”


2.1. Localização

            Conforme já se referiu, propõe-se a localização do ArqueoCENTRO na área urbana do Escoural, de preferência em zona desafogada e directamente relacionada com a EN2 que atravessa actualmente a vila. A localização nas proximidades da Gruta poderia apresentar algumas vantagens, caso aquela estrutura fosse entendida apenas como uma estrutura de apoio à respectiva visita. Foi obedecendo a esse objectivo que em tempos o ex IPPAR através da sua Direcção Regional de Évora, promoveu a elaboração de um projecto de um pequeno Centro Interpretativo, que funcionaria como interface e de “sala de espera”, entre o actual parque de estacionamento e a Gruta. Uma estrutura mais ambiciosa e com objectivos similares aos que se propõem agora, exigiria uma construção nova com alguma dimensão e inevitável impacto na envolvente da Gruta. A não ser que se procurasse um espaço suficientemente afastado… Mas, perante tal alternativa, dadas as evidentes economias, quer para a instalação quer para a gestão corrente, a opção urbana acaba por ser a mais vantajosa.

Em todo o caso, sugere-se a procura de um espaço que, de algum modo possa articular-se facilmente com o acesso à Gruta, ou seja, preferencialmente nas proximidades da rotunda Sul de saída do Escoural, onde entronca a EN 370 que passa junto o monumento, na direcção de Évora.

2.2. Estrutura física


            O ArqueoCENTRO RUPESTRE, para responder aos objectivos em causa, envolverá três áreas de acesso público diferenciadas embora, directamente articuladas, para além do indispensável espaço técnico de apoio:


A- um amplo espaço expositivo, onde serão explorados com recursos multimédia e meios interactivos (réplicas, maquetes, moldes, recriações físicas e virtuais…) os diversos conteúdos informativos. A estrutura do “discurso” pode ser temática ou cronológica, partir do geral para o particular ou vice-versa, mas deverá fugir à lógica museológica tradicional. A Gruta do Escoural, uma vez que apresenta vestígios desde os Neanderthais até ao fim da Pré-história (Calcolítico), pode e deve servir como cenário de fundo e pretexto, para a exploração autónoma de vários temas.

Em todo o caso, poderá haver lugar para a um elemento atractivo, por exemplo através de uma “réplica”, em tamanho real, de um sector da própria gruta, com reprodução das respectivas pinturas (zona do baldaquino, por exemplo?). Tal réplica, responderá a dois objectivos principais: permitir a todos os potenciais visitantes e sem excepções decorrentes de quaisquer tipo de limitações físicas, espaciais ou temporais, ter um contacto experimental com o tipo de património que apenas alguns poderão observar directamente; recriar nalguns casos, com o necessário apoio científico, uma imagem mais aproximada de como seriam as pinturas originais…

B- Uma zona para “ateliers” e/ou “palestras”, articulada directamente com um espaço exterior, parcialmente coberto, onde se poderão realizar a maior parte das actividades lúdico-didácticas. Esta zona exterior, dependendo do espaço disponível, pode ter um tratamento de “parque temático”, incluindo zonas de lazer (parque de merendas?) para diversas idades, de acesso livre à comunidade local.

C- Uma zona multiusos, com “balcão” de acolhimento e recepção, centro de informação de turismo cultural e ambiental, loja de merchandising, cybercafé. Poderá ser uma zona de acesso livre e aberto à população local, sobretudo dos mais jovens.
                                                    


                               Estrutura Física: quadro de funções e estimativa de necessidades de espaço


Espaço construído
Espaço protegido
Ar livre
Exposição
  500 m2


Ateliers/sala palestras
  100 m2
      75 m2
5 000m2
Recepção/Informação
  75 m2
      25 m2 (esplanada)

Serviços apoio
  75 m2


                             
2.3. Articulação com a Gruta do Escoural_ necessidades de intervenção na Gruta


A- Independentemente da eventual criação do ArqueoCENTRO, a DRCALEN tem programadas diversas intervenções na própria Gruta, que decorrem directamente da necessidade de melhorar as actuais condições das visitas. Estas, apesar dos problemas circunstanciais já referidos são sempre obrigatoriamente acompanhadas por um guia, tendo habitualmente o seu início no “Centro Interpretativo” localizado na vila do Escoural. Essas intervenções, parcialmente já em “projecto de execução”, tem as seguintes componentes:
           
- Requalificação do Parque de Estacionamento da Gruta (desenho e pavimento) e melhoria do entroncamento com a EN 370;

- Construção de uma nova “antecâmara” junto à entrada da Gruta (por razões de conservação) e renovação integral das estruturas de passadiços;

- Renovação do sistema de iluminação e dos equipamentos de monitorização ambiental (temperatura, humidade, gaz carbónico, etc…);

- Requalificação de uma pequena casa abrigo, já existente, com instalação de um WC de serviço e uma pequena área de arrecadação.


B- Numa segunda fase e no sentido de valorizar e complementar a visita à Gruta, aproveitando os tempos de espera impostos pelo nº limitado de visitantes que devem estar dentro da cavidade em simultâneo, poderá ser criado um percurso arqueológico no exterior, passando pela entrada considerada “primitiva” (a Nascente da actual) e subindo mesmo ao “Santuário Neolítico Exterior” (observação de gravuras rupestres esquemáticas) e passando pelas restos de muralhas do Castro da Idade do Cobre.

            Esta intervenção, deve ser cuidadosamente planeada, pois apresenta condicionantes rigorosas que têm que ver com a preservação da integridade cultural, ambiental e paisagística do sítio e da própria Gruta, um lugar muito especial no passado, que não pode ser adulterado por qualquer intervenção desintegrada ou precipitada. 

2.4. Enquadramento do Projecto do ArqueoCENTRO RUPESTRE no contexto de um plano de “comemorações do Cinquentenário da Descoberta”


            A passagem em 2013 do cinquentenário da descoberta da Gruta do Escoural (ocorrida em 18 de Abri de 1963), proporciona uma ocasião única para a concretização de um conjunto de actividades de valorização e divulgação deste recurso patrimonial, a exemplo do que aliás aconteceu já na passagem do 25º aniversário (1988) com a organização municipal de um Colóquio Internacional sobre Arte Rupestre e a publicação das respectivas actas na revista Almansor, nº 7, 1989.

            A comemoração condigna e socialmente útil daquela data poderá materializar-se em três domínios de intervenção, nomeadamente:



A- Promoção pela DRCALEN, enquanto entidade responsável pela conservação e gestão da Gruta, das intervenções identificadas e projectadas pelos seus próprios serviços, visando a melhoria geral das condições de conservação e visita da Gruta do Escoural e da sua envolvente imediata (Monumento Nacional)



B- Organização pela Câmara Municipal de Montemor-o-Novo e pela DRCALEN, eventualmente em colaboração com o Museu Nacional de Arqueologia e a Universidade de Évora, de um II Colóquio Internacional sobre Arte Rupestre a ter lugar na Primavera de 2013, colóquio que para além de novos dados sobre a Gruta do Escoural (decorrentes de projectos de investigação que entretanto se tentará promover…) será uma oportunidade para fazer um balanço das extraordinárias descobertas realizadas no último quarto de Século em Portugal e que incluem, entre outras, a Arte do Côa e a Arte do Guadiana.


C- Concretização e inauguração do projecto do ArqueoCENTRO RUPESTRE do Escoural, até final de 2013 como marco fundamental da comemoração do cinquentenário da descoberta da Gruta.


3. Da viabilidade e sustentabilidade do ArqueoCENTRO RUPESTRE



            A concretização das acções A e B acima identificadas (Intervenções na Gruta e Organização do Colóquio Internacional), não levantam questões complexas. As primeiras decorrem directamente das atribuições e responsabilidades da DRCALEN e as segundas poderão resultar da conjugação de interesses comuns e da articulação de esforços, entre a autarquia e a DRCALEN apenas dependentes de uma decisão conjunta com esse propósito. Fica de qualquer modo em aberto a questão do financiamento. No caso das melhorias a introduzir na Gruta e respectiva envolvente, os custos estão estimados em cerca de 100 000€, a co financiar pelo QRE. No caso dos estudos, preparativos e concretização do congresso esse valor ronda igualmente, por estimativa grosseira, os 100 000€ (aquisições de serviços).

            Será, pois, no âmbito do projecto do ArqueoCENTRO, quer pelos elevados custos de concretização quer, ainda, pela necessidade de garantir a sustentabilidade do funcionamento futuro, que se colocarão naturais interrogações, a que só um estudo de viabilidade económica poderá responder.

Nota: a não concretização do projecto do ArqueoCENTRO não pode nem deve prejudicar as intervenções de requalificação da Gruta e sua envolvente; do mesmo modo, considerando o prazo alargado para a eventual abertura do ArqueoCENTRO, até lá deverá continuar a assegurar-se, nas melhores condições possíveis, o funcionamento do actual Centro Interpretativo.
           


3.1 ArqueoCENTRO_ estimativas de custos de construção, instalação e funcionamento;


CONSTRUÇÃO/INSTALAÇÃO

Na ausência de um programa mais preciso e tendo como partida o cômputo de espaços necessários (mínimos) acima apresentado e que aponta para uma área de construção (recuperação) da ordem dos 750 m2, calcula-se o valor da obra, incluindo os projectos de Arquitectura e especialidades, e os arranjos exteriores, na ordem dos 600 000 €. A este valor, no entanto, haverá que acrescer um valor semelhante para a concepção, produção e montagem dos conteúdos (um valor, que no caso dos “Centros de Ciência Viva”, normalmente equivale ou supera o valor da obra, dada a tecnologia envolvida). Acresce ainda a instalação dos equipamentos da recepção, cibercafé, ateliers…).


Projectos de Arquitectura (e especialidades):……………….………………50 000 €
Obras (incluindo arranjos exteriores)..........…………………….…………. 550 000 €
Concepção, produção e montagem de conteúdos expositivos…………. 550 000 €
Equipamentos (recepção, cibercafé, ateliers interiores/ exteriores)……. 100 000 €
                                                                                        TOTAL……….1 250 000 €

Os valores apresentados, no que respeita à arquitectura são calculados com base no custo de 750 €/m2 e os projectos de arquitectura, correspondem a cerca de 10% do custo estimado da obra. O desenvolvimento do “programa” do edifício a construir ou adaptar deverá apontar no sentido de uma possível redução de custo destas parcelas partindo do princípio de que a sua principal componente (área expositiva_ da ordem dos 500 m2) constituirá essencialmente num “grande contentor”, que poderá jogar mesmo com a ausência de luz natural, simulando um ambiente de caverna. A redução de custos construtivos permitirá maior folga para a componente dos conteúdos de estimativa compreensivelmente mais fluida nesta fase.


FUNCIONAMENTO


Necessidades de Pessoal

O ArqueoCENTRO Rupestre, para funcionar, numa base semelhante aos Museus (encerrando um dia por semana, mas abrindo aos fins de semana e na generalidade dos feriados), precisará de um mínimo de 6 funcionários a tempo inteiro, com capacidades e funcionalidades polivalentes, nomeadamente no âmbito da “animação cultural” mas com formação específica nos domínios científicos abordados quer na exposição quer nos “ateliers”. Num sistema rotativo 3 funcionários (o nº mínimo para o ArqueoCENTRO funcionar e assegurar visitas acompanhadas à Gruta) deverão assegurar funções de recepção e acompanhamento de visitas (Centro e Gruta). Durante a semana a equipa deverá ser reforçada, para funcionamento dos Ateliers (mais 1 ou 2 elementos). O nº total de seis recepcionsistas/animadores tem já a folga necessária para assegurar as férias ou as faltas por doença. O ArqueoCENTRO deverá contar ainda com um responsável/director executivo, a tempo inteiro ou parcial, técnico superior com formação na área, que assegure o funcionamento normal e o cumprimento de objectivos e planos quer ao nível da gestão corrente (incluindo a Gruta) quer no desenvolvimento de novos programas de divulgação e animação que mantenham vivos os fluxos de visitantes. Outras necessidades de pessoal (manutenção e limpeza) poderão ser resolvidas preferencialmente por “outsorcing”. A segurança, dada a localização em área urbana, pode também ser resolvida através de equipamentos de teledetecção (extensíveis à Gruta)


Outros encargos permanentes e extraordinários:

Serão os ligados ao funcionamento (energia e água), à manutenção, quer do ArqueoCENTRO (incluindo os consumíveis necessários ao funcionamento dos Ateliers) quer da Gruta (limpeza e manutenção dos espaços exteriores). Não se estima que estes encargos sejam especialmente elevados, devendo o projecto de arquitectura, para além de apontar para soluções com especial performance ambiental, enquadrar eventuais soluções de energias alternativas (como já acontece hoje com a iluminação da Gruta). Um encargo permanente algo significativo dirá respeito à necessidade de deslocações frequentes entre o Centro e a Gruta por parte dos “animadores”, uma vez que os visitantes se deverão deslocar pelos próprios meios. Tendo em conta que se trata de uma deslocação de ida e volta de cerca de 5km, talvez fosse possível inovar também neste campo, explorando uma solução economicamente interessante e sobretudo ambientalmente mais amigável (uma viatura eléctrica, por exemplo…).

Finalmente (e neste capítulo haverá que não esquecer a necessidade de uma atenção permanente à divulgação e ao “marketing”) haverá que prever a necessidade de, com alguma regularidade, proceder à renovação quer dos meios expositivos quer das actividades dos “ateliers” o que implicará alguns encargos extraordinários.





3.2.ArqueoCENTRO_ modelos de gestão e perspectivas de financiamento

- o “modelo organizativo”:

            Considerando que o ArqueoCENTRO Rupestre, uma vez instalado, constituirá no essencial uma entidade prestadora de serviços públicos (ateliers didáticos e ocupacionais, organização e acompanhamento de visitas à Gruta e, eventualmente, a outros sítios de interesse patrimonial e ambiental), o respectivo modelo organizacional deverá revestir um cariz de tipo empresarial, visando garantir a respectiva sustentabilidade e, dentro do possível, a amortização do capital investido. A participação maioritária da Câmara Municipal, deverá aparecer, como garantia da prossecução dos objectivos sociais (apoio ao desenvolvimento local e regional) e culturais do projecto (salvaguarda da Gruta do Escoural enquanto Monumento Nacional).

            Obviamente, representando a articulação ArqueoCENTRO Rupestre-Gruta do Escoural, o eixo fundamental do projecto e uma das garantias da sua sustentabilidade, a Autarquia, previamente à constituição da Entidade Empresarial proposta, terá de assumir ou garantir a responsabilidade da gestão da Gruta, através de Contrato de Cessação a negociar coma DRCALEN, ou outra figura jurídica, que fixe as respectivas regras.


            - “parceiros potenciais” de uma entidade público-privada (Empresa) :

- o Município (sócio maioritário)e Junta de Freguesia (?);
- uma entidade privada (Empresa, Fundação,…) que garantisse o essencial das contrapartidas financeiras indispensáveis à obtenção das necessárias comparticipações (QREN?)
- uma entidade privada (empresa de arqueologia e património), que deverá associar-se como “parceiro”, ainda que minoritário, que acompanharia as componentes de desenvolvimento dos estudos e projectos, execução da obra e instalação e, por fim, asseguraria o funcionamento e a gestão.


            - “outros parceiros” intervenientes no processo:

- a Direcção Regional de Cultura do Alentejo, enquanto entidade que concessionará e fiscalizará a gestão da Gruta do Escoural;
- a Universidade de Évora e outras instituições universitárias (apoio científico)
- o Museu Arqueológico de Montemor-o-Novo (Associação Amigos de Montemor-o-Novo)


- “receitas”:
                       
- o pagamento das entradas no ArqueoCENTRO e na Gruta (todas as fórmulas serão possíveis, desde que se parta do princípio que as entradas serão sempre pagas, mesmo nos casos em que possam quase ser simbólicas…)
- as prestações de serviços de “atelier” ou “actividades” e que nestes casos poderão incluir (ou não) já o valor das entradas na Gruta
- o fornecimento de serviços de “guia” para visitas a outros sítios ou monumentos;
- a venda de produtos de “merchandising” próprio ou de terceiros à consignação (tudo o que se possa imaginar sob o tema genérico da Pré-história, desde livros, filmes, jogos, brinquedos, etc…)


3.3.Potenciais fontes de Financiamento para o projecto e obra
(algumas sugestões…)

QREN

PORA (Programa Operacional Regional do Alentejo) 2007-2013

Eixo Prioritário III- Conectividade e Articulação Territorial
(Área de Intervenção- Rede de equipamentos e infra-estruturas para a coesão social e territorial)

Eixo Prioritário IV- Qualificação Ambiental e valorização do espaço rural
        (Área de Intervenção- valorização económica do espaço rural)


POCI (Programa Operacional Ciência e Inovação 2010)

Medida V.6- Promoção e divulgação científica e tecnológica
Accão V.6.1.- Disseminação da inovação e do conhecimento científico e tecnológico
Acção V.6.2. – Produção de conteúdos para a promoção da cultura científica


PROVERE (Programas de Valorização Económica de Produtos Endógenos)