O Castelo de Mourão, entre a NASA e a rotunda...
A recente notícia muito divulgada nas redes sociais, a propósito de uma fotografia de astronomia obtida por Miguel Claro no Castelo de Mourão e selecionada para imagem do dia no SITE da NASA, trouxe-me à memória os anos em que trabalhei em Mourão (1996-2002) no âmbito do projeto do Alqueva.
Fotografia © Miguel Claro/Reserva Dark Side Alqueva |
Já conhecia bem o Castelo de Mourão, as suas potencialidades e problemas. Aliás, vinham ainda do tempo do meu antecessor na direcção do Serviço Regional de Arqueologia do Sul, Dr Caetano Melo Beirão, alguns ecos das destruições arqueológicas provocadas no interior do monumento, por uma precipitada obra de construção de um depósito de água municipal. Durante os anos em que colaborei com a EDIA, sempre que se falava em projectos de valorização patrimonial na área de influência directa do futuro lago, até como medida de compensação pelas perdas patrimoniais decorrentes da inundação, chamava sempre a atenção para o caso muito particular do Castelo de Mourão e das suas potencialidades. Um monumento que aliava a sua excepcional monumentalidade a um elevado nível de autenticidade, mas que por isso mesmo e em contrapartida apresentava graves problemas de conservação. Num dos documentos que então preparei, escrevi como introdução:
O conjunto
histórico-monumental conhecido por CASTELO DE MOURÃO, imóvel classificado como
de “interesse público” (I.I.P.- Dec. nº 41 191, DG 162 de 18 Julho 1957) e
propriedade da respectiva Câmara Municipal,
integra:
- uma cerca medieval extensa e respectiva
“alcáçova” com dominante “torre de
menagem”;
- ruínas diversas da antiga vila “intra-muros”,
incluindo a chamada “Casa do Governador”;
- um envolvente sistema de baluartes setecentistas
em “estrela”, memória das guerras da Restauração;
- uma igreja oitocentista (Nª Sª das Candeias)
integrada na própria muralha;
Por múltiplas razões, este conjunto
monumental reúne valores próprios ou circunstanciais que, se devidamente
aproveitados, lhe podem conferir uma importância excepcional enquanto importante vector de desenvolvimento do
turismo cultural na região de Alqueva e de melhoria da qualidade de vida em
Mourão:
-
alia um razoável estado de conservação das estruturas defensivas (medievais e
setecentistas) a uma já rara vernaculidade historico-patrimonial, dadas as
reduzidas intervenções verificadas no
Século XX, o que lhe confere elevado valor cultural no contexto dos castelos e
fortificações da fronteira alentejana;
- mantém uma estreita
relação com a malha urbana da Vila de Mourão, criando condições favoráveis à
integração do espaço monumental na valorização da respectiva imagem urbana e
permitindo, através da requalificação arquitectónica e paisagística
e da introdução equilibrada de novos usos, melhorar objectivamente as condições
de vida da população;
- encontra-se
estrategicamente situado relativamente ao Regolfo de Alqueva, quer numa
aproximação transversal (dada a sua posição central e de contraponto a
Monsaraz, no eixo “Vila Nueva del Fresno/ Reguengos/ Évora) quer numa
exploração longitudinal (eixo Elvas/ Mourão/ Alqueva) o que dá à situação e
monumentalidade da “torre de menagem” um dominante ponto de observação sobre o
“regolfo” de exploração quase
obrigatória;
- finalmente, este
conjunto monumental, oferece condições objectivas excepcionais para instalação
de infra-estruturas de cariz cultural com relevante impacto social,
nomeadamente no âmbito histórico e artístico;
Infelizmente, por problemas vários que naturalmente mereceriam uma profunda e circunstanciada análise, nunca a Câmara de Mourão (a entidade proprietária, que o recebeu como "doação" de um antigo Presidente de Câmara cujos antepassados o haviam adquirido ao Estado no Século XIX) conseguiu concretizar quaisquer intervenções de requalificação ou valorização, mesmo nos tempos das aparentes vacas gordas em que os ministros faziam peregrinações frequentes à vizinha e então mediática Aldeia da Luz. Em contrapartida, a última vereação, talvez consciente da importância do monumento mas impotente em concretizar algo pela sua recuperação, acabou por "investir" em época de crise num inútil e ridículo "Castelinho de Mourão", uma reprodução ao gosto do "Portugal dos Pequeninos", como decoração de uma das Rotundas na saída para Espanha.
O Castelo de Mourão no Livro das Fortalezas de Duarte d'Armas |
Vistas aéreas do Castelo de Mourão e do seu complexo sistema abaluartado |
O Castelo e a relação com a vila de Mourão |
O "Castelinho" numa das rotundas de Mourão, na altura da foto ainda em fase de construção! |
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