sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

 O APAGÃO DO “SITE DOS MONUMENTOS”




No passado dia 6 de Janeiro, alertado por post da minha colega da DGPC, arquitecta Maria Fernandes (ex técnica da DGEMN), confirmei que não estava acessível o site www.monumentos.pt, utilíssima ferramenta para quem trabalha ou investiga na área do património. Coloquei então um alerta na INTERNET, via “facebook” em que dizia:

“A ser permanente, trata-se de mais um atentado contra o conhecimento e a cultura em geral mas que é o corolário lógico do criminoso processo de extinção da DGEMN. Não do fim em si (que até poderia ser defensável numa lógica de racionalização de meios) mas do modo absolutamente desastroso como foi concretizado. Recordo ainda a reação de um colega arquitecto da DGEMN, entretanto colocado no IGESPAR, ao regressar aos serviços do Terreiro do Paço poucos dias após a extinção, para recolher alguns objectos pessoais, descrevendo como verdadeiro "cenário de guerra" aquilo que observou: computadores sem discos rígidos, mobília esventrada, papéis por todo o lado... E o mesmo se terá passado com as Direções Regionais, nomeadamente aqui em Évora, donde foi levado todo o arquivo histórico-documental (à má fila e sabe-se lá em que condições) com gravíssimo prejuízo para a gestão e salvaguarda do vasto património arquitectónico da região.”


Ainda com esperança de que se tratasse de um mero problema técnico, já que não vi entretanto qualquer notícia sobre o assunto, salvo outros comentários nas redes sociais constatando o óbvio, fiz hoje novas tentativas de aceder ao referido SITE, infelizmente sem qualquer sucesso, quer directamente, através de www.momumentos.pt, quer através do SITE do próprio IHRU, onde todos os serviços ON LINE estão operacionais, excepto os MONUMENTOS.

Nos meus 41 anos de serviço público, quase sempre na área do Património, nunca estive ao serviço da extinta DGEMN, por isso serei insuspeito de ter uma visão demasiado corporativa desta questão. Por outro lado, não serei a pessoa mais indicada para falar do elevadíssimo investimento em meios financeiros, humanos e técnicos que foi feito ao longo de décadas, para alimentar e pôr ao serviço público esta gigantesca “base de dados”, agora silenciada, que tornava acessível à investigação e à gestão do património cultural português, em qualquer parte do mundo, quase todo o importantíssimo acervo de uma instituição quase secular (sobre a importância destes novos recursos digitais, ainda há dias houve um qualquer colóquio na Assembleia da República, com a presença de especialistas europeus, pasme-se!). Recorde-se que a DGEMN, criada em 1929 mas herdeira de anteriores instituições congéneres que remontavam à transição da monarquia para a república, foi durante décadas um dos pilares fundamentais da actuação do todo poderoso Ministério das Obras Públicas no que respeitava ao restauro e conservação do património histórico português. Podemos e devemos hoje ter uma visão crítica sobre os princípios e as metodologias que nortearam durante muito tempo as suas intervenções mas não podemos deixar de reconhecer o seu papel fundamental na preservação do essencial do património arquitectónico português ao longo do Século XX.

Este desfecho trágico, a confirmar-se, será mais um gravíssimo atentado contra a cultura, mas infelizmente, haverá que reconhecer, será também o corolário inevitável da política desastrosa da reforma da administração pública, nomeadamente na área da Cultura. Era previsível e necessário (desde a criação do IPPC nos anos 80 que se falava nisso) que se procedesse mais tarde ou mais cedo à fusão entre os serviços patrimoniais da Cultura e os das Obras Públicas. Por razões irrelevantes (essas sim corporativas e por vezes até pessoais, relevando por vezes dos interesses ou das vaidades das respectivas chefias) essa via nunca foi encarada de forma séria e estruturada, preparando uma integração natural de serviços que em muitos casos se complementavam, apesar de algumas inevitáveis sobreposições. Não admira pois que, quando a crise tocou a rebate, ainda no âmbito do PRACE de José Socrates, as coisas se tenham precipitado de forma desastrosa, como se viu. Num primeiro momento esvaziamento forçado da DGEMN no que respeita a quadros técnicos e meios, logo seguido da brutal extinção (2007) sem cuidar ao menos da salvaguarda do enorme histórico acumulado. De então até hoje, ainda que essa fosse uma solução algo obtusa, tendo em conta as atribuições e competências respectivas, o IHRU foi assegurando, de forma cada vez mais débil, o funcionamento do SITE e a manutenção das instalações do Forte de Sacavém, adaptado com enormes custos financeiros a Arquivo Histórico no tempo da DGEMN e para onde foram transferidos todos os arquivos regionais, incluindo o de Évora. Sabíamos, todos os que trabalham nesta área, que da parte do IHRU, face às restrições financeiras e humanas transversais a toda a Administração, havia cada vez maior relutância ou dificuldade em manter estas estruturas a funcionar. Nos últimos tempos era até difícil aceder à documentação arquivística essencial ao desenvolvimento de projectos de intervenção patrimonial em curso, sobretudo a nível regional, ou porque a documentação “confiscada” às regiões não estava acessível por falta de meios, ou porque para a sua cedência, mesmo para uso de outros serviços públicos, começavam a ser exigidos preços incomportáveis. O último boato (?) que correu, falava de negociações entre a nova Direcção Geral do Património Cultural (resultante do PRACE de Passos Coelho) e o IHRU, para transferência da gestão do SITE e do Arquivo para a dependência da DGPC, mas que para isso a Direcção Geral precisaria de um reforço orçamental de 1 milhão de Euros o que, nos tempos que correm, é uma miragem.

Mas sobre tudo isto e apesar da importância crucial do tema, reina afinal um silêncio ensurdecedor.






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