A delegação de Évora da firma H. Vaultier (anos 60?) |
Maxime Vaultier (1898-1969)
Não é a primeira vez que o Gonçalo Pereira, editor da
National Geographic portuguesa, me presenteia amavelmente com “tesourinhos
arqueológicos” que vai descobrindo nas suas pesquisas pela velha imprensa
portuguesa. Há poucos dias enviou-me um recorte do Diário de Lisboa, de 12 de
Julho de 1942 que aproveito para divulgar.
Trata-se de uma “entrevista” a Maxime Vaultier, uma figura algo “misteriosa” mas quase omnipresente na “bibliografia arqueológica portuguesa” de meados do Século XX, o que me deixou na expectativa de encontrar novos e desconhecidos dados sobre a sua pessoa. Infelizmente, o tom e o conteúdo da entrevista deixa-nos um pouco defraudados, por “culpa” da personalidade do próprio, que apenas por muita insistência do jornalista terá acedido a falar, não sobre si, mas sobre a Arqueologia portuguesa.Considerando-se um simples amador, citará praticamente todos os nomes activos na Arqueologia portuguesa da época. Dá natural destaque à figura de Henri Breuil, o grande pré-historiador francês presente em Portugal durante parte da 2ª Guerra Munidal, que já conhecia de França e cuja estadia, segundo o testemunho de Octávio da Veiga Ferreira publicado na revista ARQUEOLOGIA E HISTÓRIA, AAP, 9ªsérie, V.II, 1970 (que aproveito para divulgar também), terá sido em parte patrocinada pelo próprio Vaultier.
E aqui podemos começar a falar um pouco do que podemos
apurar desta figura que, sem ser arqueólogo de formação, teve um papel tão
importante na Arqueologia portuguesa do seu tempo. Apesar de já nascido em
Portugal, o seu pai o francês Henri Vaultier, fora o fundador da firma industrial
H.Vaultier, empresa muito ligada ao fornecimento de maquinaria diversa à
indústria e à agricultura, com expansão a nível nacional (pessoalmente ainda
recordo a sua publicidade nas paredes de um loja já abandonada na Praça do Giraldo nos anos
80). Tendo estudado em França, Maxime Vaultier aí terá sido jornalista (a crer
no artigo do DL), tendo entrado para a firma do pai a partir de 1922, onde
chegaria rapidamente a sócio gerente. Homem de muitos interesses (é um grande
impulsionador dos desportos de vela em Portugal) a sua ligação à arqueologia terá começado por volta de 1937, segundo o seu próprio testemunho. Graças
à sua fortuna pessoal dispunha de meios que raramente estavam ao alcance dos
arqueólogos portugueses, nomeadamente de “grande viatura particular”
que muitas vezes colocará generosamente ao dispor dos numerosos amigos
arqueólogos que vai conhecendo e apoiando. Estes retribuem como podem,
associando o seu nome às publicações que vão fazendo, o que acaba por tornar o
seu nome quase omnipresente. Eu próprio já havia confirmado essa situação quando tive oportunidade de estudar com mais
detalhe as circunstancias da descoberta e confirmação da arte rupestre
paleolítica da Gruta do Escoural. Com efeito, a primeira publicação de Farinha
dos Santos sobre o assunto nas páginas d’O Arqueólogo Português (1964) havia sido
recebida pela generalidade dos colegas nacionais, com grande cepticismo, até pela
inexperiência do autor neste campo. Terá então sido decisiva a intervenção de
M. Vaultier. Eventualmente recorrendo às suas antigas relações com Henri Breuil, recentemente falecido (1961), Vaultier conseguirá convencer o seu sucessor André Glory, na
altura a estudar a arte de Lascaux, a vir a Portugal no início de
1965. A viagem foi também patrocinada pela Gulbenkian, mas terá em grande parte
sido garantida pelo próprio Vaultier. Glory não esquece esse facto e quando em
Maio desse mesmo ano apresentou os resultados da sua expedição ao Escoural, na Sociedade Pré-histórica Francesa, associará à posterior publicação da conferencia, os nomes de
Farinha dos Santos e de Maxime Vaultier. Estava previsto que Glory regressaria
ao Escoural no Outono seguinte, provavelmente de novo com o apoio de Vaultier
que assim continuaria a ligar o seu nome ao Escoural. Infelizmente Glory,
morreria num acidente de carro nesse mesmo ano de 1966 e Vaultier, em 1969, ao
que depreendo das palavras de Veiga Ferreira, de ataque cardíaco. Um último dado
curioso, a propósito da personalidade de Vaultier. Procurando alguma informação
complementar na NET, descobri o seu nome num Blog francês que divulga os nomes
dos “Combatentes da França Livre”. Julgo que não terá andado na “guerrilha”,
mas foi fundador e presidente do Comité português da França Livre.
Maxime Vaultier, (em primeiro plano à direita)a ser recebido na Câmara Municipal de Lisboa pelo general França Borges. |
Muitos parabéns por esta tão vasta informação e bem elaborada análise sobre Maxime Vaultier.
ResponderEliminarSou seu neto e fiquei naturalmente muito comovido com esta recolha de elementos que aqui divulgou no seu blog. São dados preciosos e muito relevantes.
Muito obrigado.
Bem haja.
Marcelo Vaultier Mathias
Ainda como responsável pela Gruta do Escoural (irei aposentar-me em breve) é com muito gosto que tomo conhecimento de que, de algum modo, dei um pequeno contributo para o perpetuar da memória de uma figura que contribuíu de forma decisiva para o reconhecimento científico da antiguidade paleolítica da arte rupestre do Escoural.
EliminarMuito e muito obrigado. Fiquei assim a saber muito mais sobre o meu padrinho de baptismo, a cujo velório assisti, na igreja de Nossa Senhora de Fátima, em Lisboa.
ResponderEliminarÉ sempre agradável saber que as nossas palavras tiveram feed-back. Um obrigado por isso.
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