Almendres_ o Sol “falhou” o Equinócio
Hoje em dia, a associação à astronomia dos monumentos
megalíticos, em particular dos menires nas suas várias formas de apresentação
(isolados, em recinto ou alinhados…), tornou-se um dado de conhecimento quase
do âmbito da cultura geral de qualquer turista minimamente informado, ainda que
em muitos casos, esse conhecimento esteja ainda fortemente imbuído da visão
romântica que informou no passado, especialmente em Inglaterra, a interpretação
destes monumentos como templos druidas ou celtas relacionados com cultos
astrais, hoje recuperados por grupos “new age” das mais variadas inspirações.
No entanto, o reconhecimento de que existiam alinhamentos construídos pelo
homem pré-histórico relacionáveis com o nascimento e o ocaso de determinados
astros, em certas épocas do ano, feito sobretudo por astrónomos ingleses desde
o final do século XIX, acabou por gerar uma nova perspectiva na observação e
análise destas estruturas arqueológicas, muitas vezes recorrendo já a novas
tecnologias e equipamentos. A acumulação de dados e observações pertinentes de
interação astronómica ao longo do Século XX, nem sempre correspondeu porém, a
explicações histórico-arqueológicas fundamentadas, contribuindo por vezes até
para a profusão de teorias ficcionistas sobre a aquisição desses conhecimentos,
supostamente científicos, pelas comunidades pré-históricas, desde a sua origem egípcia
(teorias difusionistas) até aos contactos com “extra-terrestres”… De facto,
apenas a partir da segunda metade do Século XX, fruto de uma colaboração cada
vez mais estreita entre astrónomos e arqueólogos, se pode falar em “Arqueoastronomia”,
inserindo-se a interpretação de hipotéticas relações astronómicas dos
monumentos construídos pelas comunidades pré-históricas com o contexto mais
geral de relação com a paisagem natural, em articulação com os seus elementos estruturantes,
entre os quais se incluem os omnipresentes “astros”.
Apesar da riqueza megalítica no território português, as
primeiras observações de orientações astronómicas aconteceram apenas em meados
do Século XX e foram realizados pelo casal de arqueólogos alemães, Georg e Vera
Leisner que confirmaram que a orientação dos corredores das antas alentejanas,
indicava de uma maneira geral e com algumas pequenas variações, o “nascente”.
Mas seria apenas a pós a descoberta e divulgação dos primeiros recintos
megalíticos, nomeadamente o Cromeleque dos Almendres, identificado em 1964 por
Henrique Leonor de Pina, que se realizariam em Portugal observações
astronómicas mais consistentes. No início dos anos 70, o físico Cândido
Marciano da Silva procedeu a um conjunto de observações nos Almendres e em
menires da região de Monsaraz cujas conclusões apresentou ao IV Congresso
Nacional de Arqueologia realizado em Faro em 1980 mas que, por falta da
publicação das respectivas actas, só acabariam publicadas no ano 2000.
Posteriormente, os arqueólogos Mário Varela Gomes, Manuel Calado e Pedro Alvim, realizaram novas
observações nestes e noutros monumentos da região, sendo esta temática uma
vertente muito significativa nos estudos que Pedro Alvim vem desenvolvendo
sobre os menires do Alentejo Central no contexto da tese de doutoramento que
irá defender em Durhan, Inglaterra, sob a direcção científica de Chris Scarr,
um dos mais reputados especialistas em megalitismo da actualidade.
O grupo "new age" habitual dos Almendres, aguarda o Sol para proceder ao respectivo "ritual"
Tudo isto, vem a propósito da tentativa frustrada de
observar nos Almendres o nascimento do Sol no equinócio de Primavera que ocorreu
hoje mesmo. Por várias razões, tem sido destacado no caso deste recinto, o
possível alinhamento solsticial definido pela sua relação com o Menir isolado
localizado nas proximidades do Monte vizinho, evento que há alguns anos a esta
parte tem servido de fundo para a divulgação cultural do monumento pela população
de Guadalupe (Festa do Solstício). Mas de facto, e essa foi a principal
conclusão dos trabalhos de Marciano da Silva, a principal orientação do
Cromeleque dos Almendres, é de cariz equinocial, definida por um eixo que une o
grande menir com “covinhas” localizado a Poente, com o maior monólito situado a
nascente. Infelizmente, a nebulosidade da manhã impediu hoje essa observação e
o seu registo fotográfico. Fica para a próxima...
Cândido Marciano da Silva, à esquerda, orientando uma visita aos Almendres realizada em Maio de 2009 no âmbito do programa Ciência Viva. |
Diagrama da triangulação usada por C.Marciano da Silva para medir a orientação entre o Cromeleque e o Menir dos Almendres |
Por fim, com meia hora de atraso, o Sol como que se preparando para o encontro com a Lua, lá surgiu já bem alto no horizonte sobre a cidade de Évora que amanhecia. |
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