sábado, 26 de setembro de 2015


JORNADAS EUROPEIAS DO PATRIMÓNIO EM VALVERDE/GUADALUPE


























Ainda que um pouco ao lado da temática proposta para este ano ("património industrial e tecnológico") a Junta de Freguesia da Tourega (Valverde) e Guadalupe resolveu participar nas jornadas europeias do património convidando a população para um passeio cultural entre a Mitra e a Tourega. Responderam ao convite mais de meia centena de pessoas, na sua maioria fregueses, alguns dos quais aproveitaram para recordar memórias de outros tempos. Na Mitra fez as honras da casa, a Profª Aurora Carapinha que orientou a visita à Quinta do Paço e à Cerca do Conventinho, hoje integradas na Herdade da Mitra, polo da Universidade de Évora. Uma visita demasiado rápida (por má previsão do programa) a pedir repetição exclusiva, talvez na próxima Primavera, dada a importância deste património, afinal tão pouco conhecido e valorizado. Depois da visita à capela e claustro do Conventinho, duas pequenas preciosidades renascentistas, iniciou-se a caminhada propriamente dita em direcção ao Monte do Álamo. Ainda em terras da Mitra, passagem junto à Anta Mitra II, escavada há alguns anos pelo Jorge Oliveira e alunos. Do Monte do Álamo descemos à Tourega (um percurso de 3,5 Km), começando por visitar as ruínas da Villa Romana, orientados pelo Takis (Sarantopolos Panagiotis), arqueólogo da C.M.de Évora de origem grega, e que foi responsável no final dos anos 90, pelo programa de musealização destas ruínas, na sequencia das escavações de Luisa Ferrer Dias, Catarina Viegas e Inês Vaz Pinto, realizadas ao longo de mais de uma década /anos 80 e 90). Terminámos o passeio na Igreja de Nª Sª da Assunção da Tourega, um templo quatrocentista objecto de grande intervenção no Século XVI, promovida pElo Bispo D.Teotónio. Esta igreja, onde se destaca um importante retábulo, foi recentemente objecto de apreciação histórica por Vitor Serrão no âmbito da sua obra "Arte, Religião e Imagens em Évora no tempo do Arcebispo D.Teotónio de Bragança, 1578-1602." Coube-me a mim orientar este final de visita o que me levou a aprofundar um pouco o tema ao qual não deixarei de regressar, oportunamente, neste blog. Ficam as fotos do evento para memória futura.
Início da visita no Pátio Matos Rosa, sob a orientação da Profª Aurora Carapinha

O acesso à zona da antiga Quinta do Paço Real de Valverde, a típica "quinta de recreio" poruguesa 
A fonte no centro do antigo "labirinto de laranjeiras", hoje jardim de buchos.


Passando no lago de Jericó, uma jóia barroca.

A caminho da Tourega, pela estrada do Monte do Álamo

 O arqueólogo Takis, iniciando a visita às ruínas da Villa romana da Tourega

A visita às ruínas com a Barragem do Barrocal em segundo plano


terça-feira, 22 de setembro de 2015

Toponímia Arqueológica_ Dom Frei Manuel do Cenáculo

Não sou propriamente fã de toponímias urbanas, ao contrário da toponímia rural, tão rica de informação na sua singeleza e ingenuidade original, mas não deixei de aplaudir a iniciativa do Município de Santiago do Cacém de atribuir o nome Dom Frei Manuel do Cenáculo à rua de acesso às Ruínas Romanas de Miróbriga. (Só espero sinceramente que após requalificação ou melhoramento desta, pois da última vez que por lá passei, não se recomendava muito...). Com efeito na sequência da inauguração de uma exposição sobre o eminente e ilustrado Bispo alentejano no Museu Municipal de Santiago do Cacém (Dom Frei Manuel do Cenáculo, Itinerários por Santiago do Cacém) será realizada a justa cerimónia, assinalando desta forma a especial relação de Cenáculo com o litoral alentejano (recordemos que ele se interessou também por Sines e Tróia...). Os parabéns a todos os intervenientes com especial destaque, pela minha parte, à colega Manuela de Deus, actual responsável pelas Ruínas de Miróbriga (uma herança dos meus tempos de Director de que me não arrependo).

Entretanto e a propósito, aproveito para recordar um texto meu de 1993 sobre esta importante figura do Iluminismo português(Diário de Notícias de 28 de Janeiro), numa época em que o papel de Cenáculo na Arqueologia portuguesa estava ainda pouco estudado e divulgado, texto que mais tarde foi reeditado em "A Linguagem das Coisas", Raposo e Silva, Europa-América, 1996, pp263.


segunda-feira, 21 de setembro de 2015

ALCALAR- um quarto de século depois...

Aproveitando umas curtas férias no Algarve, regressei a Alcalar, passando antes pelo premiado Museu de Portimão, que ainda não conhecia, apesar de ter visitado o seu espaço nos anos 80 quando era ainda apenas projecto. Inequivocamente, dois excelentes exemplos de salvaguarda, valorização e divulgação do património. Mas também, dois casos que comprovam que os projectos patrimoniais consistentes, dificilmente se podem encaixar nas actuais baias impostas pelas exclusivas fontes de financiamento disponíveis: os "fundos europeus". Com efeito, em ambas as situações estamos perante projectos que têm as suas origens nos anos oitenta do século passado e que tinham como substracto base, antes de mais, um forte empenhamento cívico, quer este resultasse da própria comunidade local (associações de defesa do património, município) quer de jovens serviços públicos ainda não esmagados pela voragem da ultra-burocracia (no caso, o Serviço Regional de Arqueologia do Sul, então sedeado em Évora e que apesar dos reduzidos meios humanos, técnicos e orçamentais estendia a sua acção também ao Algarve). Foi de facto a partir de 1987, no contexto da actividade do SRAZS que o meu colega Rui Parreira, iniciou os trabalhos de escavação e de conservação no monumento 7, com o apoio técnico do Carlos Beloto do Museu de Conimbriga, trabalhos que criaram as indispensáveis condições científicas para a grande intervenção de valorização realizada já no início deste século e financiada no âmbito do Programa dos Itinerários Arqueológicos do Alentejo e Algarve. De realçar o carácter minimalista do projecto de arquitectura do Centro Interpretativo, quer no programa quer na forma, respeitando a paisagem e o próprio monumento. Pena é que, apesar do minimalismo do programa, nem assim a Direcção Regional de Cultura do Algarve consiga actualmente os meios para garantir o seu funcionamento. Valeu no caso a alternativa do protocolo com o Museu (municipal) de Portimão, entidade que assegura actualmente a visita pública a Alcalar. Um exemplo a seguir perante a total demissão do Estado ao nível da gestão do imenso património que lhe está afecto por todo o país.

Dois apontamentos memorialistas apenas. No que respeita ao Museu de Portimão, referir que a Fábrica La Rose onde se situa o Museu e que recupera parte das suas infra-estruturas, era propriedade da família de uma colega do meu curso de História (1970-1975) na Faculdade de Letras, o António Feu. Apesar de alguma diferença de idade (era um pouco mais velho que a generalidade dos colegas) e de estatuto socio-económico, o António Feu, antigo campeão nacional de Basquetebol pelo Sporting, alinhava por inteiro na vida académica, tendo inclusive integrado a equipa de Basquet de Letras (onde também militei...) nos campeonatos universitários da época. Pese embora alguma dificuldade em congregar os mínimos necessários para formar equipa (normalmente treinávamos em conjunto com a equipa feminina, proporcionalmente muito mais forte), não faziamos má figura nos campeonatos de Lisboa, graças em grande parte à eficácia do Feu no remate ao cesto. O António Feu, viria mais tarde a ser um dos grandes impulsionadores do PRD (o partido promovido por Ramalho Eanes) tendo chegado a ser deputado pelo Algarve. Reencontrámo-nos há meia dúzia de anos num dos raros jantares de curso.

Quanto a Alcalar, esta revisita recordou-me um episódio em que não intervi mas que, por interpostas razões acabei por tomar conhecimento bastante mais tarde. Com efeito, intervindo como consultor num processo judicial relativo às indemnizações devidas pela expropriação da propriedade onde se situava o "Castelo da Lousa" (um assunto a que voltarei em próxima oportunidade dado o seu significado), pude apreciar a sentença proferida pouco tempo antes, no âmbito de processo judicial de contestação à expropriação dos terrenos onde se situava parte do monumento 7 de Alcalar. De facto quando nos anos 80 iniciámos trabalhos de arqueologia, reconhecemos que absurdamente uma parte do monumento (o corredor, em concreto) não integrava a propriedade adquirida décadas antes pela Direcção Geral do Património do Estado (Ministério das Finanças) por proposta dos Monumentos Nacionais. Dificuldades orçamentais, desacordo com os proprietários, ou simples deslize, faziam com que parte do monumento se situasse ainda em propriedade particular. Apesar disso o IPPAR avançaria com o projecto de valorização no final da década de 90, talvez convencido de que a aquisição da parcela que faltava, um terreno abandonado, fosse um assunto fácil. Feita a avaliação nos termos habituais, o avaliador teve apenas em consideração o valor comercial do terreno, ignorando a presença dos vestígios arqueológicos. Os proprietários não se conformaram e contestaram judicialmente a avaliação. Em tribunal, pese embora o princípio de que na expropriação deve apenas ser tido em conta o valor de mercado do bem a expropriar, o juiz acabou por considerar que as ruínas em causa, a acreditar pela adjectivação constante dos artigos arqueológicos citados sobre a necrópole de Alcalar, deveriam ser muito "valiosas" e como tal isso deveria ter reflexos no preço do terreno. Aliás jamais esquecerei o argumento usado pelo juiz na sentença favorável ao reclamente: "o Estado ao tentar comprar este terreno apenas pelo valor da terra sem ter em consideração o valor dos bens arqueológicos nele existentes, é como se quisesse comprar um quadro do Picasso avaliando apenas o valor da moldura" (cito de cor). Naturalmente, o juiz esquecia-se que Picasso, aqui ou em qualquer sítio do mundo, encontrará sempre comprador interessado. Duvido que o que restava das pedras do corredor do Monumento 7 de Alcalar, encontrassem compradores interessado que, mais a mais, ganhariam com isso a obrigação de "conservar e manter in situ" as ditas pedras. Apesar do absurdo da decisão, pressionado pelos prazos do projecto e porque afinal estávamos em "vacas gordas", o IPPAR não contestou a decisão e pagou várias vezes o preço real de mercado pela dita parcela...Naturalmente, o exemplo ficou e não tardou em ser utilizado por outros advogados quando a ocasião se proporcionou.

O núcleo dedicado a Alcalar no Museu de Portimão. Apesar da qualidade da apresentação, esta precisaria de maior espaço e sobretudo de maior diferenciação em relação à restante exposição.

Trabalhos arqueológicos em Alcalar (1987) promovidos pelo SRAZ e dirigidos pelo Rui Parreira
Um pequeno mas suficiente centro informativo, muito bem integrado na paisagem envolvente






Sinais da crise: a falta de renovação do " merchandising"... Uma circunstância comum a muitos outros sítios dependentes das Direcções Regionais de Cultura.

Infelizmente, os sinais de alguma falta de manutenção começam a evidenciar-se, logo à entrada...

sexta-feira, 11 de setembro de 2015


A coragem do Paulo Varela Gomes

Há alguns meses, um nome (Paulo Varela Gomes) e uma entrevista no Jornal de Letras (“Goa, idade da inocência”, Março de 2015), fizeram-me recuar no tempo, quase meio século. 



É que o Paulo em causa entrou no distante Outono de 1970 na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa para o curso de História, tal como eu mais uma centena (?) de colegas, a grande maioria raparigas, como era habitual em Letras, quase todos com 17 ou 18 anos (uns adolescentes, pelos padrões actuais). Do ponto de vista das dinâmicas de grupo, este foi certamente um curso especialmente atípico, dadas as circunstâncias do tempo. A agitação política na Faculdade era então uma realidade omnipresente, "obrigando" a frequentes visitas dos “gorilas” inicialmente destacados para pôr na ordem os colegas vizinhos de Direito ou da própria polícia de choque. Mas seria o 25 de Abril, acontecido em pleno 4º ano, com a inevitável interrupção das aulas e as alterações curriculares e administrativas que se lhe seguiram, que acabou por esfrangalhar o que restava do grupo original, encaminhando-nos nas mais variadas direcções profissionais ou políticas. O relativo insucesso das raras reuniões ou jantares do Curso 70-75, ensaiadas ao longo de quatro décadas, são certamente resultado da fragmentação precoce e inevitável dessa geração. Apesar de tudo, uma geração relativamente bem sucedida do ponto de vista profissional. De facto e ainda que as saídas de trabalho estivessem então quase exclusivamente limitadas ao ensino secundário, onde quase todos começámos, muitos acabariam por destacar-se nas mais variadas áreas relacionáveis com a História (Universidades, Museus, Arqueologia, Bibliotecas, Autarquias, etc…) tirando partido das novas necessidades sociais e culturais trazidas pela “revolução”. Pessoalmente, como vários outros colegas do curso de 70, desde cedo estava claramente embrenhado na Arqueologia, graças às descobertas do Ródão e ao envolvimento no estudo a arte rupestre do Fratel, de vários colegas deste curso, nomeadamente o Francisco Sande Lemos, do Jorge Pinho Monteiro e do António Martinho Baptista, entre outros. Demoraria ainda algum tempo, mas esse grupo a que nos habituámos a chamar “geração do Tejo”, acabaria de uma maneira ou de outra por criar e ocupar um espaço disciplinar e profissional até então inexistente, influenciando decisivamente o progresso que a Arqueologia conheceu em Portugal nas duas últimas décadas do século XX.

Uma das primeiras “vítimas” daquela fragmentação pré-25 de Abril, terá sido o próprio Paulo Varela Gomes. Apesar da grande politização estudantil, não sei se na altura todos teríamos consciência da pesada herança política daquele colega (filho de um dos conspiradores da Revolta de Beja de 1961) que já então, apesar da idade, demonstrava  um especial espirito combativo e de liderança, associada a inegáveis qualidades oratórias que o punham sempre na linha da frente da contestação. Recordo em especial, as suas intervenções muito críticas nas aulas de Expansão Portuguesa, então da responsabilidade do professor  Borges Nunes, que fazia por ignorar por completo os contributos de historiadores marginalizados pelo regime, como Vitorino Magalhães Godinho ou Borges Coelho, acabando as aulas na maior das confusões, com a saída do professor ou dos alunos e a entrada dos contínuos, alguns justa ou injustamente conhecidos como informadores da PIDE. Inevitavelmente, com o apertar da repressão que culminou com a invasão da Faculdade pela polícia de choque (evento de que recordo a enorme figura do Prof. Lindley Cintra, levando nos braços o João Ludgero, um dos nossos colegas da arqueologia, brutalmente agredido pela polícia), o Paulo Varela Gomes desapareceu da Faculdade, julgo que algures pelo 2º ano. Pessoalmente, nunca mais nos cruzámos, mas recordo que segui anos mais tarde com toda a atenção e interesse (o autor era meu colega!) os programas que fez para a RTP, numa altura em que já consolidara uma carreira de investigação no domínio da História de Arte. Há apenas um episódio anedótico neste entretanto de algumas décadas em que o seu nome, por interposta pessoa, acabou por estar presente. Fui inesperadamente chamado para a tropa no final de 1977 e, já em Mafra, no dia da incorporação, encontrei um antigo colega dos trabalhos de arqueologia do Tejo, o Mário Varela Gomes que entretanto concluíra Arquitectura. Pouca memória me ficou desse dia, para além do choque da situação em si e do extraordinário contexto espacial da mesma (a caserna que me foi adstrita era a antiga e ainda magnífica capela do hospital conventual!), mas há uma frase que recordo. Em cada sítio em que era necessário dar o nome ao cabo ou sargento de plantão, o meu inesperado companheiro de milícia, declarava alto e bom som, para que constasse, que nenhuma relação familiar o ligava ao “Coronel Varela Gomes”! De facto, vivíamos então ainda na ressaca do 25 de Novembro que pusera em causa o papel do conhecido militar no Movimento das Forças Armadas e o meu colega Mário, não queria confusões...Mas eu lembrava-me do colega Paulo e da franja loira que afastava com gestos bruscos sempre que arengava às massas estudantis...


As circunstâncias pessoais, especialmente dramáticas, que ressaltam da entrevista que comecei por referir e a posterior descoberta do texto “Morrer é mais difícil do que parece”, publicado na revista  GRANTA e que a certa altura teve grande difusão na NET, completada pela recente leitura do romance “Verão de 2012”, redigido pelo Paulo Varela Gomes em plena ressaca do diagnóstico de cancro, estão naturalmente na motivação deste testemunho em que recordo a sua coragem então demonstrada e nas actuais circunstâncias plenamente confirmada.

quarta-feira, 9 de setembro de 2015

Perdigões- as origens de um projecto de arqueologia exemplar

O Povoado pré-histórico dos Perdigões: sobreposição à fotografia aérea dos resultados dos levantamentos geofísicos 


Por razões profissionais (dar continuidade a um processo de classificação que se arrasta inexplicavelmente há mais de uma década), tive necessidade revisitar em Agosto passado o povoado dos Perdigões, Reguengos de Monsaraz (em plena 18ª campanha de escavações) e de reler a primeira notícia publicada sobre aquele povoado, precisamente o relatório da 1ª campanha: Lago, et alii “Povoado dos Perdigões (Reguengos de Monsaraz) Dados preliminares dos trabalhos arqueológicos realizados em 1997”, RPA, v.1, nº1, pp 45-152. Por motivos compreensíveis no contexto da época, aquele importante e extenso texto, não se alarga muito em considerações sobre as circunstâncias que rodearam a associação dos autores a este importante sítio arqueológico, alguns dos quais, como o António Valera, continuam desde então, ininterruptamente, a estudá-lo. É referido que o povoado fora identificado em 1983 por Francisco Serpa, na altura colaborador de Mário Varela Gomes em diversos trabalhos deste em Reguengos mas que fora uma intensa ripagem e surriba para plantação de vinha promovida em 1996 pela entidade proprietária (FINAGRA,SA) que revelara a sua excepcional dimensão e importância. Mais adiante percebe-se que, por imposição da Direção Regional de Évora do IPPAR, interrompida a surriba, a FINAGRA terá procedido através de concurso ou consulta, à seleção de um responsável científico para dirigir trabalhos de caracterização do sítio, tendo sido selecionado como coordenador científico do projecto, o arqueólogo Miguel Lago da Silva que, com João Albergaria, Pedro Braga e Henrique Pestana, fundaria em 1997 a empresa ERA, Arqueologia Lda, entidade empresarial que ainda hoje enquadra a investigação realizada neste sítio. Obviamente o artigo é omisso sobre as movimentações então havidas de outros potenciais candidatos ao projecto, nomeadamente universitários, que por este ou por aquele motivo, incluindo alegada "prioridade científica", se consideravam mais qualificados para assumirem aquele estudo . Os resultados obtidos, e divulgados regularmente ao fim de quase duas décadas e a excelente relação mantida quer com as tutelas oficiais, quer com as entidades proprietárias (actualmente Herdade do Esporão), acabaram por provar que a escolha de 97 foi a mais acertada. Apenas nalgumas entrelinhas do citado artigo aparecem alguns indícios da conflitualidade que acompanhou o nascer doeste projecto, nomeadamente quando são referidas várias “recolhas indiscriminadas de materiais arqueológicos” que distorceram os estudos de distribuição em superfície promovidos após a adjudicação dos trabalhos. Vale a pena, a este propósito, transcrever a totalidade da nota 6 (pg.52, do artigo ditado) e já agora completar o seu conteúdo, a bem da verdade dos factos: “A equipa da EDIA que procedia a prospecções no âmbito dos trabalhos relacionados com o Alqueva, confirmou-nos que as recolhas efectuadas incidiram sobretudo na área central do povoado, o que nos permitiu concluir que a nossa análise estava correcta. Ao Dr. António Carlos Silva e à sua equipa agradecemos a entrega do material recolhido.” De facto, algures nos finais de 1996 a equipa de campo que então comigo colaborava no Alqueva (José Perdigão, Paulo Tátá e Manuel Pisco), realizou trabalhos de prospecção nos traçados previstos para a melhoria das acessibilidades na zona de influencia do Alqueva, nomeadamente entre São Manços, Reguengos e Mourão. Concretamente, foi necessário avaliar os impactos de uma possível variante Norte a Reguengos (felizmente nunca concretizada) e foi nesse contexto que o Zé Perdigão, conhecendo bem os menires dos Perdigões e a referencia a um possível povoado anexo, deparou com a profunda surriba para alargamento da vinha já existente na Herdade. Não lhe foi difícil perceber, face à quantidade de materiais arqueológicos trazidos à superfície pelas máquinas (em especial cerâmicas quase inteiras, machados de pedra polida e demais indústria lítica) estar perante uma situação excepcional. Não deixando de recolher os materiais melhor conservados, numa perspectiva correcta da sua salvaguarda imediata, reportaram-me ainda nesse mesmo dia nos escritórios de Mourão a situação de verdadeira emergência detectada. Ciente da importância do achado e da gravidade da situação, caso os trabalhos agrícolas continuassem. passei a informação aos meus colegas da Direcção Regional de Évora do IPPAR, nomeadamente ao Rui Parreira. Contactada e sensibilizada a Administração da Finagra para a situação, os trabalhos foram interrompidos o que que permitiu o posterior desencadear de um processo de salvaguarda e estudo que, pese embora a gravidade daquele pecado original, tem sido verdadeiramente exemplar. Um último e importante detalhe. Entre os materiais que a equipa do Zé Perdigão me trouxe nessa já distante tarde de 1996 (e que posteriormente entregámos à equipa que se viria a ocupar do estudo do sítio, como é reconhecido na nota transcrita) estava já o célebre coelho em marfim (?) que continua a ser o “ex-libris” do projecto coordenado pelo António Valera.




O António Carlos Valera, o coordenador e a alma do projecto desde sempre, na campanha de 2015, (entrevistado pelo meu "vizinho" Paulo Nobre/RTP/RDP)






quarta-feira, 2 de setembro de 2015

Memórias das Pedras Talhas, um ano depois...


Faz hoje um ano que este "blog" começou (ver aqui). Estavam-lhe então subjacentes duas motivações principais. Por um lado o medo de algum "vazio", resultante da drástica mudança de funções ocorrida poucos dias antes (em 31 de Agosto de 2014, terminara as funções de Director de Serviços dos Bens Culturais da Direcção Regional de Cultura do Alentejo). Por outro, a vontade de aproveitar os tempos que me restavam de serviço (estimava então que seriam entre 2 a 3 anos e um já lá vai...) para, com acesso a documentação e o ambiente adequado, passar a escrito algumas memórias e experiencias da minha já longa vida profissional dedicada às questões do património e da memória.

Passado este ano que balanço posso fazer do exercício? No que respeita a regularidade, ela foi variando. Aliás nos últimos dois meses, coincidindo parcialmente com as férias, o nº de entradas decaiu drasticamente. Ainda assim produzi 118 "posts", de dimensão bastante variada ainda que alguns recuperando directamente documentação antiga, o que perfaz uma média de 1 post de 3 em 3 dias... Não o que eventualmente previra mas mesmo assim, algo esforçado. Quanto à respectiva "audiência" (e embora esse aspecto possa parecer menos importante, não deixamos de nos tocar por saber que somos lidos por alguém...) o blog esteve perto de atingir nestes 12 meses, as 12 000 "visitas", ou seja uma média próxima das 80 visitas diárias. Muito longe é verdade das 6 000 que atinge diariamente o "blog" da minha nora, mas nem todos somos profissionais destas coisas...
(http://amaeequesabeblog.blogspot.pt/).

De qualquer modo, existem factores que distorcem aqueles números. É que se a entrada mais procurada atingiu as 1700 visitas, (um texto que gostaria de não ter escrito (Pedro Alvim) algumas não chegaram sequer à dezena de visualizações. Quanto aos países de origem das buscas, infelizmente não consigo identificar (burrice minha, certamente) todos os países. As estatísticas dão-me apenas os 10 países com mais procuras, naturalmente liderados por Portugal onde têm origem cerca de 75% das buscas. Mesmo assim fica ainda uma margem significativa, a esta escala, de pesquisas internacionais (cerca de 3 000 ao longo dos 12 meses). Quanto a países, o gráfico anexo diz quase tudo, com os Estados Unidos a liderarem com quase 800 consultas, seguidos da Alemanha com pouco mais de 300. Para além dos 10 países indicados, há ainda uma miríade de proveniências (cerca de 500) de países muito variados.


Quanto ao futuro próximo do blog, confesso que me é difícil perspectivá-lo de momento. Existe alguma vontade em prosseguir, procurando manter pelo menos o nível de regularidade atingida neste 1º ano. Em todo o caso, só o farei enquanto tal me der algum prazer. Apenas por obrigação, não obrigado.