segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

O colega americano que não conheci
David A. Breternitz (1929-2012)



Quando em Maio de 1996, após uma passagem de alguns meses pela Comissão Instaladora do IPA (Instituto Português de Arqueologia), assumi a convite da EDIA, o desafio de pôr em marcha um “Plano de Minimização dos Impactos Arqueológicos do Alqueva”, não partia do zero. De facto desde as minhas antigas funções no IPPC no Departamento de Arqueologia (1980-88) passando depois pelo Serviço Regional de Arqueologia do Sul (1988-1990) e Direcção Regional do IPPAR (1990-1996), que me tinha ocupado do dossier Alqueva, um mega-empreendimento que muito preocupava os arqueólogos desde que começara a ser concebido nos anos 60 do século passado. Instalado com uma pequena equipa em Mourão, numa antiga escola preparatória, os primeiros tempos seriam essencialmente dedicados à recuperação e tratamento da documentação e materiais entretanto acumulados desde que Carlos Tavares da Silva e Joaquina Soares haviam participado no início dos anos 80 no primeiro Estudo de Impacto Ambiental. Paralelamente começamos a preparar um Plano de trabalhos de salvamento arqueológico em larga escala que viria ainda nesse ano a ser submetido à Administração da EDIA e à tutela da Arqueologia. Naturalmente, para um projecto com a dimensão do Alqueva, pouca ou nenhuma experiência havia em Portugal, até porque a legislação sobre Avaliação de Impactes, relativamente recente e remontando apenas à entrada de Portugal na CE, estava longe de ser uma prática corrente e minimamente consequente. Por outro lado o exemplo mais próximo, acontecido com a construção da Barragem do Côa, revelara-se desastroso pelas razões conhecidas. Daí que, uma das minhas primeiras preocupações, esquecendo o exemplo da Barragem de Assuão (muito distante do Alqueva em todos os aspectos) foi procurar exemplos que nos ajudassem a tomar opções minimamente informadas. Não foi certamente pela INTERNET, ainda muito pouco difundida à época, que tomei então conhecimento de um grande projecto desenvolvido entre 1978 e 1986 nos Estados Unidos, o DOLORES ARCHAELOGICAL PROGRAM (DAP) e do qual obtivera referencias elogiosas. Suponho que tal informação me fora transmitida pessoalmente por Nicholas Stanley-Price, um arqueólogo muito ligado á gestão de sítios arqueológicos que conhecera anos antes num colóquio organizado pelo ICCROM em Chipre e que esteve algumas vezes em Portugal em apoio técnico á candidatura do Parque Arqueológico  do Côa, a Património da Humanidade. Resolvi por isso escrever ao responsável do DAP, o arqueólogo David A. Breternitz, que me respondeu quase na volta do correio, com uma amável carta que pela primeira vez, tenho a oportunidade de divulgar. No mesmo correio, enviava-me uma cópia do seu último trabalho sobre o projecto “The Dolores Archaeological Program: In memoriam”, publicado na American Antiquity em 1993 e que nessa fase de intenso planeamento seria para mim um inseparável guia de cabeceira. Este é um assunto ao qual não deixarei de voltar. Até porque se nalguns aspectos, nomeadamente no que respeita à divulgação científica, o Projecto Alqueva (na sua componente “Barragem”) ainda que com atraso, atingiu os objectivos programados, já noutros domínios, nomeadamente na repercussão dos resultados em relação ao grande público (um dos grandes sucessos do DAP, graças ao Ananazi Heritage Center então instalado) se ficou no Alqueva muito aquém do que o investimento realizado exigiria. A razão da presente nota, é sobretudo sentimental. Usando há dias a Internet, o tal instrumento que não dispúnhamos em 1996, resolvi fazer uma pesquisa para saber o que era feito do meu “colega americano”, David A. Breternitz. Descobri então, por uma notícia de um jornal local, que falecera em 2012, em Dove Creek, a localidade para onde se mudara em 1978 quando fora nomeado pela Universidade do Colorado para dirigir o o projecto Dolores e na qual ficaria após a sua aposentação em 1986, no final dos trabalhos arqueológicos. Aqui fica, pois, a minha pequena homenagem póstuma.


O Anasazi Heritage Center, fundado no âmbito do "Dolores Archaeological Program" para albergar os registos e espólios recolhidos e para servir de centro de interpretação do património arqueológico da região.

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