Mostrar mensagens com a etiqueta pontes históricas. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta pontes históricas. Mostrar todas as mensagens

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015



Ponte Velha da Fragusta sobre a Ribeira de Tera 
(Vimieiro-Arraiolos)



Há década e meia, numa época em que estava envolvido no Projecto do Alqueva, tive oportunidade de elaborar para a Junta de Freguesia do Vimieiro (Arraiolos), a título gracioso, um pequeno relatório sobre uma ponte antiga que desconhecia e que tinha sido precisamente alguém do próprio executivo da Junta que me dera a conhecer. Julgo que desse relatório não resultaram, infelizmente, consequências. Eu próprio não tive ocasião de visitar de novo este local, se bem que tenha alguma curiosidade em avaliar e comparar, passado todo este tempo, o actual estado do mesmo. De referir que em minha opinião, e conheço bastantes pontes antigas, é um dos monumentos mais impressionantes no seu género no Alentejo, atendendo em particular ao facto de não ter sido objecto de grandes alterações enquanto esteve a uso. Para memória futura e eventual comparação, caso alguém um dia destes tenha oportunidade de passar na Fragusta, aqui deixo algumas notas e elementos gráficos recuperados do referido Relatório que, naturalmente, está inédito.


Assim conhecida por se encontrar junto à Herdade do mesmo nome, passou a ser designada pelo adjectivo de “velha”, provavelmente a partir de 1976, data da inauguração da nova ponte rodoviária construía pela JAE, algumas centenas de metros a jusante, na estrada do Vimieiro para a Casa Branca e Sousel.

A Ponte Velha da Fragusta bem visível no Google Earth  (38º52´45.77 N - 7º49'03.84 O)

A Ponte da Fragusta, situa-se na freguesia do Vimieiro, cerca de 5km a Norte da sede da Freguesia, sobre a Ribeira de Tera. Fazia parte de uma importante estrada, bem destacada na carta 1:100 000 de 1871, que vinda de Évora em direcção a Évoramonte passava ligeiramente a Leste do Vimieiro, dirigindo-se a Norte: Casa Branca, Sousel, Fronteira e Alter do Chão. A ligação do Vimieiro, antiga sede de município, a esta importante via fazia-se através de um antigo caminho que saindo da povoação em direcção a Leste, passava junto à arruinada capela de São João, entroncando na estrada Norte/Sul, no sítio da “canada”. A persistência deste topónimo, nomeadamente na actual  CMP 1:25 000 reflecte a importância desta antiga estrada e respectiva passagem da Ribeira, nomeadamente no contexto das antigas movimentações sazonais dos gados entre as planícies do Baixo Alentejo e as zonas montanhosas beirãs. A ponte propriamente dita, situa-se numa zona de encaixe rochoso da Ribeira, particularmente declivoso a Sul, o que apesar da considerável largura do vale, evitava a submersão dos acessos mesmo em épocas de maior invernia. Não muito longe, a montante da velha ponte, conservam-se as ruínas de um velho moinho ou azenha, numa associação muito comum, demonstrando a importância de estradas e pontes na estruturação das actividades económicas locais.
A Ponte vista de jusante (cima) e montante (baixo), com os talha-mares com sinais de "descolamento"

A Ponte Velha da Fragusta é uma sólida construção em alvenaria de xisto, não rebocada, estruturada por seis arcos quebrados, constituídos por lajes de xisto justapostas em cutelo e cobrindo umvão de aproximadamente 60 metros. Cinco dos arcos apresentam dimensões equivalentes, com cerca de 4m de flecha por 4 de largura na base, sendo o sexto arco no encosto à margem Norte de menores dimensões, por adaptação à topografia. O interior dos arcos apresenta ainda vestígios de argamassa de cal, pontualmente mostrando reparações relativamente recentes. O corpo da ponte encontra-se reforçada a montante por quatro robustos talha-mares em forma de prismas rectangulares de base triangular, provavelmente acrescentos à estrutura original, dados os sinais de “destaque” provocados pela vegetação infestante. O tabuleiro mostra ainda vestígios da calçada e apresenta uma largura de útil de 2,5 metros, e é ladeado por guardas ainda relativamente bem conservadas.

Vistas de jusante.


Ao contrário do que infelizmente é habitual em estruturas deste tipo, já não usadas, o estado geral de conservação é ainda razoável embora evidenciando sintomas preocupantes de início do processo de degradação. A inexistência de vestígios de fendilhação no intradorso dos arcos e a conservação das guardas, são os aspectos que contribuem para o diagnóstico de aparente solidez. A sua maior ameaça, resulta da falta de uso e consequente falta de manutenção. Aliás , a insensibilidade local para com o monumento, traduziu-se há alguns anos na destruição intencional da zona de encosto Sul do tabuleiro, única e exclusivamente para fazer passar uma vedação da propriedade vizinha. 

quinta-feira, 15 de janeiro de 2015


As pontes históricas, as "enteadas" do património
Ponte antiga da estrada de Pavia, sobre a Ribeira do Divor
Algumas estruturas patrimoniais, por razões várias que não dá para aprofundar aqui, parecem ser “mal amadas”, ou pelo menos, acabam olimpicamente ignoradas nos trabalhos de investigação ou mesmo de divulgação patrimonial no campo das artes, da arqueologia ou mesmo da etnografia. É, por exemplo, o caso das “pontes antigas ou históricas”. Raramente parecem interessar aos historiadores de arte em geral ou mesmo aos estudiosos da arquitectura, talvez pelo seu carácter mais especificamente técnico-funcional. Os arqueólogos pouco se debruçam também sobre este tipo de construções, a não ser que, condicionados pelo síndroma do “mais antigo”, julguem que a sua origem possa remontar ao Império Romano… Também não parecem interessar muito à etnografia, talvez porque tal tipo de construção esteja quase sempre num limbo patrimonial, entre o popular e o erudito. Apesar disso, as “pontes antigas”, parecem conseguir suscitar o interesse e curiosidade das comunidades locais que normalmente as conhecem e ainda usam, mesmo que quase sempre mal qualificadas de “pontes romanas”. Talvez por fazerem parte de itinerários que até há poucas décadas eram essenciais à sobrevivência económica e social dessas comunidades, constituindo-se como últimos testemunhos de uma rede viária hoje desaparecida ou engolida pela privatização ou desertificação da própria paisagem. 
Ponte antiga da estrada de Pavia, recuperada no âmbito do projecto do IPPAR "Pontes Históricas do Alentejo"

Em contra mão relativamente a este esquecimento, a antiga Direcção Regional de Évora do IPPAR (hoje Direcção Regional de Cultura do Alentejo) promoveu na década passada, com fundos comunitários, intervenções de conservação em duas dezenas de “Pontes Históricas” do Alentejo. Tão vasta operação, abrangendo estruturas de diversos tipos, desde Nisa , no Norte Alentejano a Santa Clara-a-Velha, já próximo do Algarve,  teve o mérito de chamar a atenção para este património tão esquecido e de, na generalidade dos casos, adiar uma ruína que era então eminente. Infelizmente, em minha opinião, apesar do voluntarismo dos técnicos responsáveis, falhou neste projecto um maior envolvimento com as comunidades locais garantindo, após as intervenções do IPPAR, planos de manutenção que fizessem perdurar no tempo os efeitos positivos do projecto. De facto, e com raras excepções, as pontes intervencionadas, até porque existe muita indefinição quanto ao seu estatuto, independentemente de estarem ou não classificadas, estão de novo ao abandono e a precisar de novas intervenções. Resta como útil testemunho desse importante trabalho, uma brochura sobre as “Pontes Históricas do Alentejo”, da autoria do arqueólogo João Marques, um dos impulsionadores do projecto, e informação específica na partilha dos “itinerários” do actual SITE da DGPC cuja consulta se recomenda.






Vem tudo isto a propósito, porque por amável oferta da Câmara Municipal de Arraiolos, tive acesso ao livro “Património(s) de Arraiolos”, uma edição de 2013 da autoria de Leonor Rocha, Ivo Santos e Gertrudes Branco.  A obra resulta do desenvolvimento de um projecto de “Levantamento Arqueológico e Patrimonial de Arraiolos”,(LAPA-2010-13)  que para além de outros objectivos permitiu aos alunos de Arqueologia da Universidade de Évora, realizarem as suas aulas práticas de campo. Não pretendo aqui fazer qualquer recensão ou análise crítica à obra, não é isso que está em causa, mas tão simplesmente através de um exemplo concreto com que deparei por acaso, demonstrar a tal falta de atenção, no caso por parte dos arqueólogos, às “pontes antigas” a que antes aludi. No capítulo dedicado á freguesia de Arraiolos, é descrita sumariamente a “Ponte sobre a Ribeira do Divor”, terminando a respectiva ficha com a seguinte indicação “Inédita?” (sic). Ora, em 2010, para além da há muito disponível descrição de Túlio Espanca (1975), a ponte tinha tido já sofrido as obras de conservação promovidas pelo IPPAR e constava da brochura das “Pontes Históricas” (2005). Na DRCALEN/IGESPAR decorria entretanto o processo de classificação como Imóvel de Interesse Público, hoje já concluído e no qual consta que a Ponte foi salva in extremis, no final dos anos 80, quando decorriam já obras de construção de uma nova ponte ao lado da antiga, obras que previam o desmantelamento desta. A feliz conjugação de esforços entre a Câmara Municipal e o ainda IPPC, levariam a que a JAE alterasse o projecto, construindo mais tarde uma nova ponte, a jusante, e conservando a antiga.


Ponte Velha da Fragusta, Vimieiro, Arraiolos
Já agora, porque falamos de Pontes Antigas e de Arraiolos, não posso deixar de referir-me a uma outra que, infelizmente também passou despercebida à equipa do LAPA e que, só por si, merecerá oportuna  entrada neste Blog. Trata-se da Ponte Velha da Fragusta, localizada a Norte da vila do Vimieiro sobre a Ribeira de Tera e que é uma das mais interessantes pontes medievais que conheço na região.