Mostrar mensagens com a etiqueta Cromeleque dos Almendres. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Cromeleque dos Almendres. Mostrar todas as mensagens

segunda-feira, 2 de julho de 2018

OS ALMENDRES, de novo no PÚBLICO
1992-2018

Um quarto de século separa os dois "recortes" de página inteira do Público que aqui apresentamos. O mais antigo, de 15 de Setembro de 1992, é assinado pelo meu velho amigo, o professor liceal Marcial Rodrigues, então "correspondente" em Évora daquele ainda jovem diário; o segundo é da responsabilidade do jornalista profissional Carlos Dias. Curiosamente, enquanto o primeiro regista os primeiros esforços organizados ao nível da Câmara Municipal de Évora, no âmbito da divulgação e promoção do megalitismo local como factor de desenvolvimento turístico, o segundo avalia os impactos negativos sobre esse mesmo património, uma vez que o desejado incremento desse potencial, não foi acompanhado pelas medidas de gestão e salvaguarda que já então se assinalavam como indispensáveis. Em ambas as notícias quer nas imagens quer no conteúdo, todo o destaque vai naturalmente para o CROMELEQUE DOS ALMENDRES, verdadeiro ex-libris do Megalitismo Alentejano. Mas não deixa de ser sintomático que a medida já preconizada em 1992 pelo escultor João Cutileiro e referida no artigo de Marcial Rodrigues (criação de um parque de estacionamento afastado do monumento) só tenha sido concretizada 20 anos depois (2012).

Três pequenas notas apenas ao texto do Carlos Dias, uma peça que de forma impecável e irrepreensível, sintetiza toda a problemática para a qual temos tenho vindo a chamar a atenção, não apenas neste "blog" mas em todos os fóruns possíveis e imaginários (incluindo a  Assembleia da República, sem qualquer efeito, diga-se de passagem... ver aqui por exemplo).

Em primeiro lugar assinalamos com agrado que a informação que temos vindo a acumular quer neste blog quer no grupo do Facebook "Guadalupe em defesa do Cromeleque dos Almendres" , tem utilidade pública, como se comprova no trabalho do Carlos Dias.

Em segundo lugar, comentando as declarações transcritas de Carla Rufino (filha do proprietário dos Almendres, sr. José Rufino), recordar que o estradão de acesso já existia, talvez há séculos, e pela tradição regional de uso dos caminhos rurais, sempre fora uma serventia pública. O que a Câmara Municipal fez na década de oitenta (numa altura em que a Herdade dos Almendres se encontrava ainda intervencionada no âmbito da Reforma Agrária) foi proceder às custas do orçamento camarário, a extensas obras de melhoria do mesmo, entre Guadalupe e o monumento classificado (então Imóvel de Interesse Público, hoje Monumento Nacional). Essa estradão (apesar dos problemas de conservação que a autarquia vai resolvendo como pode) hoje serve não apenas os visitantes do Cromeleque mas os vários proprietários da zona, incluindo um empreendimento turístico hoteleiro, promovido por um conhecido apresentador de televisão.

Finalmente uma terceira e última ressalva, para a minha afirmação transcrita de que os "operadores turísticos utilizam o Cromeleque de borla"... Embora reconhecendo atitudes diversas da parte destes, desde os que se limitam a "despejar" os turistas no local, até aos que acompanham e ajudam de facto à descoberta do sítio, não posso deixar de aceitar o reparo de amigos que há muito se dedicam a essa legítima e útil actividade, recordando que eles próprios, com a sua presença regular, vão contribuindo para uma vigilância e atenção ao monumento que deveria estar assegurada pelas entidades competentes...





quarta-feira, 4 de abril de 2018

"APARIÇÃO" NAS PEDRAS TALHAS


Está em exibição numa das novas salas de cinema de Évora, o filme APARIÇÃO, baseado na conhecida obra homónima de Virgílio Ferreira. As rodagens tiveram lugar na própria cidade de Évora e arredores em Novembro de 2016, procurando ir ao encontro do peculiar ambiente social, urbano e rural, dos anos 50 do século XX em que o romancista coloca a acção. A referencia neste blog resulta do facto de, mais uma vez, as pedras talhas dos ALMENDRES, terem servido de cenário cinematográfico, situação que não é nova ( ver aqui ).

Quando no Outono de 2016, fui contactado pela respectiva produção (através da Direcção Regional de Cultura do Alentejo) para conhecimento prévio das condições para filmar nos Almendres (uma atenção e um cuidado que nem todos têm, pois por vezes só damos pelas filmagens ou outras actividades "a posteriori", como aconteceu com a novela "O Sábio" que passa actualmente na RTP1), tive então oportunidade de transmitir a habitual informação: o Cromeleque dos Almendres é um "monumento nacional" e como tal, a entidade da tutela do Ministério da Cultura (DRCA) deve ser ouvida sobre as condicionantes técnicas a ter em consideração nas acções a desenvolver no local e na sua envolvente mas compete a última palavra no que respeita a autorizações, aos "proprietários" (que no caso em questão não costumam levantar objecções...pois, infelizmente o seu interesse relativamente ao monumento localizado na sua Herdade é o que se conhece e a que já nos temos aqui referido). 

Acrescente-se ainda que, conhecendo a obra literária em questão (e que aproveitei para reler), não deixei de enviar um "recado" ao realizador Fernando Vendrell através da produção: os Almendres só foram "identificados arqueologicamente" nos anos 60 como aqui referimos ) e apesar das "pedras talhas" já serem conhecidas dos habitantes locais, o seu aspecto seria completamente diferente nos anos 50, conforme mostram as suas primeiras fotografias. A produtora executiva com quem então falei e cujo nome não recordo (com a aposentação, perdi o acesso ao historial dos meus mails, um arquivo cuja falta já tenho sentido...), disse-me então que o Fernando Vendrell estava consciente dessa pequena "incongruência histórico-factual" mas que tinha "adorado" as qualidades cinéfilas do local e não resistia a utilizá-lo como cenário para um dos diálogos filosóficos em que o romance é fértil.

A cena em causa, cuja filmagem acompanhei depois em representação da DRCA e que já tive oportunidade de ver numa das salas do Cine Plaza de Évora, mostra um velho "carocha" da época, aproximando-se dum Cromeleque mergulhado na névoa matinal, criando um ambiente propício ao diálogo filosófico sobre o sentido da vida e da existência que acontece entre professor e aluno passeando entre os menires.

Nota final: Acresce a estas imagens dos Almendres várias cenas filmadas na Herdade da Mitra (Valverde), nomeadamente no Convento do Bom Jesus e no Pátio Matos Rosa, com a colaboração de figurantes locais e da União de Freguesias da Tourega e Guadalupe. Nos agradecimentos finais da ficha técnica, simpaticamente, é mencionada essa colaboração por parte da Junta de Freguesia.

Cena de a "APARIÇÃO"_ o carocha chegando aos Almendres. Hoje, felizmente, em condições normais tal já não é autorizado.

"APARIÇÃO"- professor e aluno falam sobre o sentido da vida e da existência tendo os menires como testemunhas silenciosas.

Outros "menires" (estes certamente réplicas de menires escoceses), inspirando outro tipo de histórias...

A novela "O Sábio", também com cenas filmadas nos Almendres mas neste caso sem qualquer conhecimento prévio da DRCA

quinta-feira, 24 de agosto de 2017

ROMARIA DE AGOSTO 
nos ALMENDRES


Em passagem de rotina (avaliar resultados de recente ação de limpeza realizada pelos trabalhadores da Junta de Freguesia) estive ao fim da manhã de hoje (24 de Agosto de 2017) no Cromeleque dos Almendres. Já me tinha apercebido do significativo aumento de circulação automóvel a caminho das Pedras Talhas, mas não podia imaginar a quantidade de gente que ali iria encontrar. É certo que o país está transformado numa verdadeira colónia de férias, certamente com muitas e evidentes vantagens mas, em inevitável contrapartida, também com alguns problemas. O caso dos Almendres (e do respectivo sucesso junto de um público cada vez mais alargado) justificaria já um estudo de caso. Como é que um sítio, praticamente abandonado à sua sorte, consegue atrair tanta curiosidade turística e não consegue gerar qualquer resposta pública ou privada de enquadramento e de salvaguarda que potencie esse interesse e o canalize para a sua própria valorização? Como é que, apesar do óbvio desgaste quer nos acessos quer no próprio solo do monumento, este mantem a respectiva atractividade, pese embora a presença diária (atrevo-me a dizê-lo, sem exagero, após a amostragem de 30 minutos desta manhã) de centenas e centenas de visitantes diários sem qualquer controle ou vigilância?

Como já repetidas vezes aqui o referi, ( http://pedrastalhas.blogspot.pt/2016/12/almendres-inexplicavel-situacao-do.html ) esta situação não se deve à falta de propostas da própria Junta que, infelizmente, têm caído em saco roto...

A última iniciativa tomada, e cujos resultados ainda desconhecemos, concretizou-se na proposta de abertura de um concurso público pela CME para instalação de um Centro de Informação Turística em Guadalupe, junto da saída para o Cromeleque. Pretende-se desse modo atrair um empresário que esteja interessado em instalar e explorar uma unidade de acolhimento e informação turística (em terreno municipal a ceder para o efeito, na própria aldeia), tirando partido da localização num espaço privilegiado do ponto de vista cultural e natural e em crescimento contínuo nos últimos anos. 

O prazo de entrega de propostas terminou recentemente e aguarda-se agora o respectivo desenvolvimento caso haja candidaturas de qualidade, conforme esperamos.

O painel dos Almendres, cujos textos não assinados são da minha autoria, são sem dúvida os textos mais lidos que alguma vez escrevi em vida...

O parque de estacionamento, praticamente esgotado...

A caminho do Menir, apesar do acesso cada vez mais degradado e perigoso, sobretudo para crianças e idosos. Quem será responsável por qualquer acidente que ali possa acontecer?

Em Agosto, ambiente de romaria nos Almendres

sexta-feira, 2 de junho de 2017


Os Almendres na National Geographic

 ser ou não ser Monumento Nacional





Por mera coincidência, a National Geographic em síntese correctíssima e muito bem informada, lembrou no seu número de Junho, a incrível situação burocrático-legal que mantem o CROMELEQUE DOS ALMENDRES e outros monumentos megalíticos alentejanos numa espécie de "limbo administrativo". São monumentos nacionais mas afinal é como se não fossem...pois ninguém tem nada a ver com a sua lamentável situação. E alguns, como é o caso da ANTA GRANDE DO ZAMBUJEIRO, um dos maiores monumentos do seu tipo em todo o mundo, encontram-se numa situação de risco eminente de ruína total. Outros, como os Almendres, recebem centenas de visitantes todos os dias, sem qualquer limitação, controlo ou vigilância, sujeitos unica e simplesmente à educação e sensibilidade de cada um, para espanto e muitas vezes escandalo dos turistas mais esclarecidos.

Pois, no site do Parlamento é já possível consultar a resposta do Ministro da Cultura, às perguntas que o Bloco de Esquerda, na sequencia de visita recente aos Almendres sobre este problema, apresentou ao Governo, dando andamento a um conjunto de preocupações denunciadas pela Junta de Freguesia local. ver aqui

Vale a pena ler os dois textos e tentar perceber o que é que afinal o Ministério da Cultura pretende fazer para salvaguardar este e outros monumentos nacionais. 

Ou afinal não são monumentos nacionais?



segunda-feira, 15 de maio de 2017



Caminhando em terras de Menires e Antas


Em poucas regiões de Portugal, estarão reunidas condições tão propícias a um desenvolvimento sustentado de um turismo que concilie a Natureza e o Património arqueológico, como se verifica nas terras da Tourega e de Guadalupe. A beleza do montado, transforma-se neste território num cenário deslumbrante para os vestígios megalíticos, testemunhos que subsistem da presença dos primeiros agricultores e pastores que dominaram esta região há mais de 5 000 anos, convidando à sua descoberta através dos velhos caminhos rurais. Algumas dificuldades, porém, dificultam um melhor aproveitamento deste recurso que, naturalmente, precisa de um mínimo de enquadramento e de infra-estruturas, para poder funcionar como um produto atrativo para quem por aqui passa a caminho de Évora. Desde logo, as condições climatéricas que no pino de Verão, com temperaturas a rondar os 40º, não aconselham muito a actividade pedestre. Mas a grande dificuldade reside na estrutura da grande propriedade fundiária e dos seus actuais modelos de exploração. Tradicionalmente espaços abertos, virados sobretudo para a silvicultura, onde se circulava livremente através de caminhos centenários, nas últimas décadas conheceram mudanças radicais. Finda a Reforma Agrária muitas destas propriedades trocaram de mãos, e os novos proprietários, com pouca ou nenhuma relação com os meios e as tradições locais, acabariam por fazer tábua rasa de direitos adquiridos de serventia ou de passagem. Até porque, na verdade, muitos daqueles caminhos, com o despovoamento e o fim da actividade agrícola tradicional, deixaram efectivamente de ter "serventia"... Não é fácil nestas condições, definir, sinalizar ou estabelecer percursos de circulação pedestre que permitam a visita a sítios ou monumentos, muitos deles até classificados como "nacionais" ou de "interesse público", quando estes se localizamk em propriedades actualmente completamente vedadas.

Ainda assim, e face ao interesse crescente que alguns daqueles monumentos despertam junto de um público alargado, a União de Freguesias da Tourega e de Guadalupe, tenta actualmente encontrar um percurso que, apesar daquelas condições pouco favoráveis, possa ser vaibilizado futuramente. Nesse sentido, em colaboração com uma empresa que é pioneira nestas actividades (e que há quase duas décadas organiza com alguma regularidade caminhadas nesta região), realizou-se no passado sábado, 13 de Maio, um passeio cujo percurso unia três locais paradigmáticos da Pré-história alentejana: Anta Grande do Zambujeiro, Castelo do Giraldo e Cromeleque dos Almendres. 


Trata-se de um percurso bastante longo, cerca de 20 quilómetros, com algum grau de dificuldade na subida ao Giraldo, mas com possibilidades de um enquadramento logístico interessante. A partida é feita de Guadalupe, onde é possível deixar as viaturas em segurança e onde há algum apoio comercial. Perto do meio do caminho, atravessa-se Valverde, que oferece uma área de merenda e descanso, antes da subida ao Giraldo. O percurso tem a grande vantagem de ser circular, pois após a visita ao Cromeleque e ao Menir dos Almendres, termina de novo em Guadalupe. Uma experiência a repetir, em fim de semana menos mediático de preferencia e, se possível, a institucionalizar em futuro próximo através da Federação de Campismo e Montanhismo de Portugal,  uma vez conseguida a colaboração de alguns proprietários. É que, apesar de "aberto", parte deste percurso é feito através de serventias e caminhos no interior de propriedades privadas.
O "briefing" antes da partida de Guadalupe

Saindo para o campo

Passando junto ao moinho de vento, estrutura de moagem que serviria de alternativa em caso de falta de água, ao "Moinho da Carreira", uma antiga "azenha", onde hoje se localiza um das "tascas" de Guadalupe
A "Horta do Moinho da Ponte", ainda hoje cultivada por um idoso de Guadalupe, próximo do que resta de mais uma azenha e da casa do moleiro. Entre Guadalupe e Valverde, num percurso de poucos quilómetros, existiam pelo menos 5 moinhos, testemunhos de um regime hidrológico certamente mais intenso. Hoje a Ribeira fica praticamente seca no Verão e os moinhos estão abandonados há quase um século. Já ninguém se lembra de os ver a funcionar.


A "Ponte Antiga", na antiga estrada entre Évora (Perananca) e a Boa Fé. Classificada e recuperada há década e meia, necessita de urgente controle da vegetação que a cobre. Estrutura do Século XVI, dá o nome ao moinho vizinho...
Passagem no Monte das Figueiras, a caminho da Anta Grande do Zambujeiro

A gigantesca "mamôa" da Anta Grande do Zambujeiro, vista de Norte
Um dos mais extraordinários monumentos pré-históricos nacionais (a Anta Grande do Zambujeiro) em eminente colapso estrutural. Sem menosprezar o acta de vandalismo o recentemente verificado no Côa  e que tantas notícias provocou, não se compreende que, a situação deste monumento (apesar de repetidamente denunciada localmente) não provoque uma "comoção" semelhante.

Já a caminho de Valverde através da Herdade da Mitra (Universidade de Évora)

Como é difícil não tropeçar nos "romanos", um marco miliário recordando que, algures por aqui perto passaria a estrada romana que unia Ebora ao porto de Salatia (Alcácer do Sal) e que serviria também a grande "villa romana da Tourega"
Cruzando a Ribeira à entrada de Valverde. Infelizmente a velha "venda" que ali nos recebia já fechou há algum tempo...

Área de descanso antes da subida ao Giraldo

Área de descanso antes da subida ao Giraldo

Na subida para o Giraldo, o novo cemitério de Valverde, projectado pelo Arquitecto José Luis Quitério e construído nos anos 80 do século passado para evitar o alargamento do antigo cemitério da Tourega com inevitáveis impactos sobre as ruínas romanas vizinhas

O impropriamente designado Castelo do Giraldo. De facto existem vestígios de uma muralha medieval, criando um recinto com os grandes blocos graníticos que existem no cume da colina. Escavações de Afondo do Paço e Fernandes Ventura no final dos anos 50, mostraram que este sítio, pela sua localização, teve ocupação desde a Idade do Cobre até à Idade do Ferro. Deverá estar relacionado com o vizinho Povoado da Corôa do Frade, com ocupação importante cerca de 1000 anos antes de Cristo.

Mais do que se pode ver no local, a subida ao Giraldo vale pelo magnífico panorama que se desfruta a Nascente. Na imagem, a Barragem da Tourega e o antigo cemitério da Tourega marcado por dois enormes ciprestes, e em último plano a colina de São Vicente sobre Viana do Alentejo

No cruzamento das Herdades, já na linha de cumeeira onde se localizam os Almendres. Mas ainda faltavam uns quilómetros para chegar ao Cromeleque
Adicionar legenda

A "Cruz do Preto", já muito próximo do Cromeleque. Um marco geodésico antigo (Século XIX, campanhas de levantamento cartográfico do General Filipe Folque?). Deve o nome a uma curiosa lenda que refere a fuga de um escravo negro da Mitra do qual só terão aqui aparecido as "botas". Há duas versões do final da lenda. Segundo uma teria sido devorado pelos loboas, segundo outra, teria deixado as botas para despistar eventuais perseguidores...


Já nos Almendres
E no Menir

Adicionar legenda

De regresso a Guadalupe, cerca de 20 quilómetros depois...

Uma ajuda para quem estiver interessado

terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

O CROMELEQUE DOS ALMENDRES 
de novo na Assembleia da República

Na sequencia de uma moção aprovada na Assembleia de Freguesia da Tourega e de Guadalupe de 11 de Dezembro último sobre a situação "inexplicável" do CROMELEQUE DOS ALMENDRES de ausência de toda e qualquer forma de gestão e salvaguarda e cujo texto abaixo transcrevemos, o Bloco de Esquerda manifestou interesse pela situação, tendo sido solicitada à Junta uma reunião e uma visita ao Cromeleque dos Almendres, que ontem mesmo se concretizou com a presença do Deputado Jorge Campos. A União de Freguesias, através dos seus representantes (Presidente do Excecutivo e da Assembleia) teve assim oportunidade de manifestar de viva voz ao Deputado Jorge Campos, as suas preocupações relativamente à situação de indefinição presente e futura sobre deste monumento nacional, (ainda ameaçado por um "PIN turístico e um PIN mineiro...) dada a sua localização em propriedade privada e o desinteresse dos proprietários em assegurarem uma gestão que, em nossa opinião, deveria ser preferencialmente garantida pela administração pública competente, dado o seu cariz Nacional.

O Deputado (BE) Jorge Campos nos Almendres, ontem, 20 de Fevereiro de 2017


Texto da Moção aprovada em 11 de Dezembro de 2016:

Moção

A Assembleia da União de Freguesias de Nª ª da Tourega e Nª Sª de Guadalupe, reunida em sessão ordinária no dia 11 de Dezembro, tendo tomado conhecimento dos resultados inconclusivos das diligências efetuadas pelo executivo da freguesia junto dos proprietários da Herdade dos Almendres, relativamente à precaridade da presente situação do monumento nacional “Cromeleque dos Almendres”, deliberou:

1.       Manifestar publicamente a preocupação dos membros eleitos, relativamente à situação de total indefinição no que respeita à gestão e à salvaguarda de um dos principais monumentos pré-históricos do território português, o Cromeleque dos Almendres, visitado diariamente por centenas de turistas, sem qualquer regra ou controle por parte de qualquer entidade pública ou privada.

2.       Lamentar a ausência de acordo da parte dos proprietários da Herdade dos Almendres à proposta de modelo de gestão do monumento sugerida pela União de Freguesias, situação agravada pela ausência, tanto quanto é do conhecimento público, de qualquer solução alternativa por parte dos próprios proprietários.

3.       Mandatar o executivo da União de Freguesias, no sentido de este alertar as entidades com responsabilidades legais na salvaguarda do património cultural, nomeadamente no património classificado como “nacional”, sobre as graves ameaças que nas presentes circunstâncias, se colocam à salvaguarda deste monumento e à segurança dos milhares de visitantes que o procuram.

4.       Lembrar que, nos termos da Lei de Bases do Património Cultural, compete às entidades competentes da Administração Pública, a tomada de todas as medidas que a salvaguarda de um Monumento Nacional exijam, incluindo a sua expropriação, caso se conclua que essa é a solução mais adequada à sua proteção.

5.       Dar amplo conhecimento público desta tomada de posição da Assembleia de Freguesia, através de nota a enviar à Câmara Municipal, à Direção Regional de Cultura do Alentejo, aos Grupos Parlamentares da Assembleia da República e à Comunicação Social.


Guadalupe, 11 de Dezembro de 2016



Naturalmente, esta situação não é só de hoje e arrasta-se praticamente desde a identificação do monumento há 53 anos, por Henrique Leonor de Pina. Já nessa altura (1964) apenas a intervenção da Junta Distrital de Évora, permitiria a realização dos primeiros trabalhos arqueológicos no local, face às dificuldades levantadas pelo proprietário de então (Eng. Miguel Soares). De realçar que a recuperação do monumento e a construção do acesso, apenas viriam a ser viabilizados e assumidos pela Câmara Municipal de Évora nos anos oitenta, numa época em que a propriedade fazia parte da Cooperativa de Guadalupe.

A visita do Deputado Jorge Campos aos Almendres, fez-nos entretanto recordar uma outra intervenção da Assembleia da República de quase há três décadas e também já relacionada com esta problemática, protagonizada pelo saudoso Deputado do PCP, Lino de Carvalho (1946-2004), secundado pelo Deputado José Manuel Mendes. Lino de Carvalho, com quem me cruzava  nessa época amiúde em Évora, e com quem discutia estas questões, interpelava em requerimento o Ministério da Agricultura sobre uma iniciativa que partira da própria Secretaria de Estado da Cultura (então sob a titularidade de Teresa Patrício Gouveia), e que visava a salvaguarda para o domínio público de alguns monumentos nacionais localizados em Herdades que estavam prestes a ser devolvidas aos proprietários no âmbito do desmantelamento da "Reforma Agrária". Nessa situação, entre outros, encontrava-se o Cromeleque dos Almendres. No afã de completar a sua "tarefa", o mais rapidamente possível, o Ministro da Agricultura de então, Álvaro Barreto, ignorou a proposta do próprio Governo, adiando para data posterior à entrega das propriedades, a resolução do "problema". O que, como é público e notório, com uma única excepção (Gruta do Escoural, após pesada indemnização aos proprietários pelo cancelamento da exploração de mármore em 1963), nunca veio a acontecer...

Texto do requerimento dos Deputados Lino de Carvalho e José Manuel Mendes (7 de Julho de 1989)






Insistência do Presidente do IPPC (Eng. António Lamas), já depois do requerimento dos deputados do PCP, solicitando de novo a intervenção da Secretária de Estado da Cultura, junto do Ministro da Agricultura, para que este revisse a sua posição de indeferimento da proposta de "salvaguarda para o domínio público" dos monumentos nacionais localizados nas Herdades a devolver.




segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

ALMENDRES
A inexplicável situação do "Stonhehenge português"



Face à continuada ausência de qualquer tipo de gestão ou controle de visitas ao Cromeleque dos Almendres, uma situação que não é de agora mas que se tem vindo a agravar nos últimos anos face ao aumento exponencial de visitantes, a Assembleia da União de Freguesias da Tourega e de Guadalupe, aprovou ontem dia 11 de Dezembro uma Moção manifestando a sua preocupação face à "inexplicável" situação em que se encontra este monumento nacional. 

Apesar de protegido por "lei", a sua localização em propriedade privada, parece (?) impedir as entidades de tutela (nacionais ou regionais) de intervir. Por outro lado, os proprietários, embora não impeçam as visitas, lavam as mãos da sua salvaguarda, embora tal atitude também possa um dia vir a prejudicar os seus interesses. 

Neste contexto o executivo da Junta de Freguesia, ainda que tal não seja propriamente da sua competencia, não quis deixar de assumir a sua quota de responsabilidade no processo e resolveu propor aos proprietários, um modelo de gestão que permitiria ultrapassar o absurdo da presente situação. 

Infelizmente, não foi possível chegar a acordo e o monumento continuará, até ver, entregue ao seu "destino" até que um dia algum acidente grave aconteça que ponha em causa um legado que, ao contrário do que seria de supôr como "nacional", parece afinal estar refém dos interesses de alguns.

Para que se possa ter uma percepção global do problema em causa, e para registo futuro, aqui se transcrevem alguns documentos: a proposta apresentada aos proprietários pela Junta de Freguesia; a Moção aprovada na Assembleia, e por fim, a Nota de Imprensa distribuída pela Junta.







Proposta aprovada em reunião do executivo da União de Freguesias, de 22 de Março de 2016, a ser presente à Sociedade Agrícola dos Almendres

CROMELEQUE DOS ALMENDRES
Monumento Nacional (MN)- Decreto n.º 4/2015, DR, 1.ª série, n.º 44, de 4-03-2015

O Cromeleque dos Almendres, reclassificado recentemente como MONUMENTO NACIONAL, é hoje um sítio arqueológico emblemático, referenciado por todos os guias turísticos e local quase de visita obrigatória para os muito milhares de visitantes que regularmente procuram Évora enquanto cidade e região de cultura, classificada pela UNESCO em 1986 como “Património da Humanidade”.
Localizado em propriedade privada (Herdade dos Almendres- Sociedade Agrícola dos Almendres) este recinto megalítico foi recuperado arqueologicamente por iniciativa do município de Évora nos anos 80, numa altura em que a propriedade estava intervencionada no âmbito da Reforma Agrária. Data da mesma época a requalificação do estradão de acesso.

Após a aquisição da Herdade pelos actuais proprietários (1997) e com o seu acordo, a Câmara Municipal procedeu a uma correção do traçado do estradão original, afastando-o da área habitacional da Herdade e criou um acesso pedonal vedado permitindo a visita ao Menir dos Almendres, localizado na proximidade do monte. Mais recentemente (2012), visando disciplinar o acesso e estacionamento de viaturas, a Câmara Municipal, obtido o acordo prévio dos proprietários, criou uma bolsa de estacionamento a cerca de 200 metros do Cromeleque.

Pese embora estas intervenções de iniciativa municipal, o acesso e visita ao Cromeleque dos Almendres continua a não obedecer a qualquer regra, condicionamento ou restrição (24 horas por dia, 365 dias por ano) com todos os inconvenientes e ameaças daí resultantes, nomeadamente para a salvaguarda e integridade do monumento nacional, para a proteção e conservação ambiental da própria Herdade e até para a segurança dos próprios visitantes. Apesar da ausência de qualquer estatística fiável, é notória a crescente, permanente e massiva devassa do monumento, tornando insustentável a actual situação de indefinição estatutária e legal, quer no que se refere à gestão e controle do acesso e visita pública a este monumento, quer no que concerne à responsabilidade civil ou mesmo criminal decorrentes de quaisquer actos que aí possam vir a ocorrer, atentatórios da integridade do monumento ou dos próprios visitantes.

Face a este contexto de indefinição e de real ameaça à preservação do Cromeleque dos Almendres, o executivo da União de Freguesias da Tourega e de Guadalupe, fazendo-se eco das legítimas preocupações de muitos cidadãos relativamente à salvaguarda e valorização dos recursos culturais do seu território, em particular os declarados formalmente de interesse público ou nacional, sente-se no dever de assumir a sua quota parte de responsabilidades perante este problema.
Nesse sentido e ainda que considerando que essa não será a solução mais adequada face à reconhecida importância nacional do monumento, que justificaria da parte da Administração Pública um outro nível de intervenção, a União de Freguesias manifesta a sua disponibilidade para em conjunto com a entidade proprietária, encontrar uma plataforma de entendimento que permita clarificar a situação estatutária do “monumento” e estabelecer um modelo de gestão da visita pública que garanta as melhores condições para a sua protecção, salvaguarda e valorização.

Deste modo:

Na presunção de que a entidade proprietária da Herdade dos Almendres -apesar de estar no direito de o fazer- não tem interesse em promover ou assumir a gestão e controle das visitas a este monumento nacional localizado em plena Herdade mas com acesso público através de “caminho municipal”;

na presunção que, quer por parte da Administração Pública, quer por parte da Câmara Municipal, não existem planos de intervenção para além das responsabilidades próprias de tutela relativamente à salvaguarda do Monumento (Direção Regional de Cultura do Alentejo e DGPC) ou à manutenção do estradão municipal (C.M. de Évora);

A Junta de Freguesia, consciente das suas obrigações e responsabilidades, decide apresentar aos proprietários uma proposta de acordo que considera vantajosa para ambas as partes, visando em última análise a salvaguarda e valorização do monumento nacional “Cromeleque dos Almendres”, através da prossecução dos seguintes objectivos:

                - gestão, controle e enquadramento da visita pública ao Cromeleque;
                - conservação e manutenção do monumento e do seu espaço envolvente numa pespectiva de salvaguarda patrimonial e ambiental;
                - melhoria das condições de acesso, estacionamento, interpretação e visita pública;

Para prossecução daqueles objectivos, a União de Freguesias propõe à Sociedade Agrícola dos Almendres, o estabelecimento de um acordo de cooperação, assentando nos seguintes princípios:

1.       Sem abdicar da respectiva propriedade, a Sociedade Agrícola dos Almendres, entrega à responsabilidade da União de Freguesias (ao abrigo da figura legal de “comodato”) por um prazo a fixar, nunca inferior a 15 anos, o terreno onde se situa o Cromeleque dos Almendres, incluindo o “parque de estacionamento e a ligação pedonal entre ambos” de acordo com “planta a anexar”;

2.       A União de Freguesias compromete-se, num prazo inferior a um ano e ouvindo a entidade proprietária, a preparar um plano de gestão e controle das visitas, a submeter à aprovação da tutela do património e, que permita estabelecer um regulamento e um horário de visita ao monumento, uma vez criadas as condições materiais indispensáveis para a sua efectiva implementação no terreno;

3.       Deverá estar subjacente ao modelo de gestão, o princípio da “mínima intervenção física possível” no terreno cedido por comodato, até por razões de preservação das condições ambientais e paisagísticas, uma das grandes mais-valias deste monumento. As infraestruturas de apoio que sejam consideradas indispensáveis deverão, preferencialmente, ser localizadas na povoação de Guadalupe, em áreas públicas disponíveis e de passagem obrigatória pelos visitantes.

4.       Para efeito da conceção e implementação do modelo de gestão de visitas, a União de Freguesias, poderá obter o apoio ou a colaboração (administrativa, técnica, logística ou mesmo financeira) de entidades terceiras que aceitem cooperar ou participar na gestão e valorização deste monumento no quadro das condições gerais previstas neste acordo;

5.       Considerando a necessidade de tornar sustentável a gestão das visitas e a manutenção do monumento e da sua envolvente, a União de Freguesias deverá prever no modelo e plano de gestão, para além do concurso a candidaturas disponíveis para apoios financeiros, a capacidade de arrecadação de receitas, nomeadamente as resultantes da cobrança de ingressos, venda de mershandising, exploração dos direitos de imagem, organização de eventos culturais, etc…

6.       Eventuais resultados positivos de exploração, a verificarem-se, deverão ser exclusivamente reinvestidos, nos seguintes domínios:

a.       Valorização do próprio monumento e melhoria das condições de acesso e visita;
b.      Apoio a instituições de solidariedade social existentes em Guadalupe ou Valverde;

7.       Findo o período estabelecido no contrato de comodato, a área cedida incluindo benfeitorias, reverte à plena propriedade da Sociedade Agrícola dos Almendres, salvo se entretanto forem estabelecidas de comum acordo novas formas de cooperação entre as entidades signatárias;

8.       A falta de cumprimento dos princípios acordados, poderá ser motivo para denúncia do acordo e do contrato do comodato por qualquer das partes signatárias.


Moção 

A Assembleia da União de Freguesias de Nª ª da Tourega e Nª Sª de Guadalupe, reunida em sessão ordinária no dia 11 de Dezembro, tendo tomado conhecimento dos resultados inconclusivos das diligências efetuadas pelo executivo da freguesia junto dos proprietários da Herdade dos Almendres, relativamente à precaridade da presente situação do monumento nacional “Cromeleque dos Almendres”, deliberou:

         Manifestar publicamente a preocupação dos membros eleitos, relativamente à situação de total indefinição no que respeita à gestão e à salvaguarda de um dos principais monumentos pré-históricos do território português, o Cromeleque dos Almendres, visitado diariamente por centenas de turistas, sem qualquer regra ou controle por parte de qualquer entidade pública ou privada.

     Lamentar a ausência de acordo da parte dos proprietários da Herdade dos Almendres à proposta de modelo de gestão do monumento sugerida pela União de Freguesias, situação agravada pela ausência, tanto quanto é do conhecimento público, de qualquer solução alternativa por parte dos próprios proprietários.

    Mandatar o executivo da União de Freguesias, no sentido de este alertar as entidades com responsabilidades legais na salvaguarda do património cultural, nomeadamente no património classificado como “nacional”, sobre as graves ameaças que nas presentes circunstâncias, se colocam à salvaguarda deste monumento e à segurança dos milhares de visitantes que o procuram.

   Lembrar que, nos termos da Lei de Bases do Património Cultural, compete às entidades competentes da Administração Pública, a tomada de todas as medidas que a salvaguarda de um Monumento Nacional exijam, incluindo a sua expropriação, caso se conclua que essa é a solução mais adequada à sua proteção.

  Dar amplo conhecimento público desta tomada de posição da Assembleia de Freguesia, através de nota a enviar à Câmara Municipal, à Direção Regional de Cultura do Alentejo, aos Grupos Parlamentares da Assembleia da República e à Comunicação Social. 

São Brás do Regedouro, 11 de Dezembro de 2016




Nota para a comunicação social
A inexplicável situação de um Monumento Nacional
Aprovada “moção” na Assembleia da União de Freguesias da Tourega e Guadalupe sobre o “Cromeleque dos Almendres”

O Cromeleque dos Almendres, identificado arqueologicamente há cerca de meio século e recentemente reclassificado como Monumento Nacional (Decreto 4/2015 de 4 de Março), é atualmente um dos monumentos pré-históricos mais conhecido e visitado em todo o país, sendo hoje um verdadeiro “ex-libris” da cultura megalítica do Ocidente Ibérico. Foi objeto de restauro e de valorização durante os anos 80 do século passado por iniciativa do município de Évora, numa época em que a Herdade dos Almendres estava intervencionada no âmbito da Reforma Agrária. Após a devolução da propriedade aos seus antigos donos, o monumento, ainda que classificado desde 1974 como “Imóvel de Interesse Público”, deixou de estar na alçada pública. Apesar da Herdade ter sido vendida no final dos anos 90, o Estado não exerceu então o direito legal de preferência, até porque estava em causa uma área muito restrita de uma propriedade agrícola com quase 1000 hectares. Na altura, de acordo e por interesse dos novos proprietários, foram apenas feitas algumas alterações nos acessos públicos, quer ao Cromeleque, quer ao vizinho Menir dos Almendres, também abrangido pela classificação.
De então para cá e pese embora o facto de os proprietários nunca terem levantado dificuldades à visita, também se tornou evidente que a capacidade de intervenção pública estava fortemente condicionada pela titularidade privada do monumento, inviabilizando qualquer possibilidade de novos investimentos públicos na salvaguarda ou valorização de um monumento cada vez mais conhecido e procurado pelo turismo. Ainda assim, em 2012, após um processo negocial demorado e face a uma situação que se tornava calamitosa e insustentável, com autocarros, autocaravanas e todo o tipo viaturas a estacionarem e manobrarem dentro do próprio monumento, a Câmara Municipal conseguiria autorização dos proprietários para instalar um parque de estacionamento provisório a uma distância razoável de segurança.
Tal facto, ao melhorar significativamente as condições ambientais na envolvente do monumento, acabou por ter outras consequências. Sem qualquer publicidade ou marketing especial, para além do seu valor intrínseco, do passa-palavra dos próprios visitantes e da proximidade de Évora, o Cromeleque dos Almendres transformou-se rapidamente no monumento arqueológico mais conhecido da região, um verdadeiro “Stonehenge” português, procurado quer por turistas individuais, quer por grupos enquadrados por operadores turísticos de todo o tipo, atuando a partir de Évora, de Lisboa, do Algarve ou mesmo de Espanha. Até porque, com todas as implicações imagináveis, a ausência de qualquer gestão do monumento, permite a visita 365 dias por ano e, literalmente, 24 horas por dia.
Assim, são já hoje evidentes os efeitos da excessiva e desregulada carga de visitantes, acelerando a erosão do terreno e pondo em perigo a estabilidade dos menires, tornando-se também frequentes os actos de vandalismo, por ausência de qualquer vigilância, traduzidos em usos indevidos do local, “grafitis”, lixo e perigosos vestígios de fogueiras deixados por “visitantes” noturnos. Acresce a esta situação, o agravamento dos problemas de manutenção do estradão de acesso, face ao aumento do tráfego incluindo pesados de passageiros. Ultimamente, e apesar da atenção dada ao assunto pela GNR, o local tem também atraído o “interesse” dos gatunos, multiplicando-se os assaltos às viaturas estacionadas. 
Perante uma situação que se tem vindo a agravar, com riscos cada vez mais elevados para a salvaguarda do monumento e para a segurança dos visitantes, quer a Câmara Municipal de Évora, quer a União de Freguesias de Valverde e Guadalupe, têm procurado atuar dentro dos limites das suas capacidades e competências embora muito condicionadas pelo estatuto privado do monumento. Alertando as autoridades policiais para os problemas de vigilância e segurança, reparando periodicamente o estradão de acesso ou procurando manter a limpeza possível dos espaços. Mas há consciência de que se trata de mero paliativo para uma situação sem qualquer controlo e inexplicável para a maioria dos visitantes, nacionais ou estrangeiros, convencidos que estão a visitar um “monumento público”.
Foi neste contexto, visando encontrar uma solução que permitisse congregar esforços e meios para instauração urgente de um qualquer modelo de gestão de visitas e de clarificação do estatuto do monumento, que a União de Freguesias decidiu avançar recentemente com uma proposta concreta junto dos proprietários, a “Sociedade Agrícola dos Almendres”. Fê-lo partindo dos seguintes pressupostos: embora estivessem no direito de o fazer, os proprietários já demonstraram não estar interessados em explorar comercialmente a visita pública ao monumento; a gestão da visita ao Cromeleque dos Almendres, nos moldes propostos pela Junta, em nada interferiria, direta ou indiretamente, com a atividade económica da Herdade; bem pelo contrário, essa gestão, aumentando a vigilância e evitando as presenças indesejáveis, em particular durante a noite, constituiria uma assinalável mais valia para a própria propriedade.
A proposta presente à Sociedade Agrícola dos Almendres, previa a cedência à União de Freguesias, por contrato de comodato e por um período de 15 anos, do terreno do monumento, incluindo acessos e estacionamento, transferindo para esta entidade a responsabilidade da sua manutenção e do controle da sua visita pública. Para esse efeito a União de Freguesias, comprometia-se a elaborar um plano de gestão, associando-se a entidades terceiras (Câmara Municipal e Entidade Regional de Turismo, entre outras) com vista à obtenção dos necessários meios técnicos e financeiros. Do ponto de vista da intervenção física, seria evitada qualquer construção na propriedade privada, para além da estritamente necessária (vedação e arranjos paisagísticos de espaços exteriores) até por razões de preservação paisagística e ambiental. Do ponto de vista da exploração comercial das visitas, indispensável à sustentabilidade da própria gestão, ficava estabelecido que em caso de resultados positivos, estes seriam investidos na valorização do monumento ou canalizados para apoio às instituições sociais da aldeia de Guadalupe.

Numa primeira reunião, a reação do representante dos proprietários foi de aparente recetividade. Infelizmente a União de Freguesias viria a ser informada posteriormente que a eventual aceitação daquela proposta por parte da Sociedade proprietária, estaria dependente de uma condição prévia, relacionada com a “viabilização” pelas autoridades competentes da renovação do licenciamento para um empreendimento turistico na Herdade, um antigo “PIN” conhecido como “Resort dos Almendres”. Face a uma condição prévia que nada tinha a ver com os objetivos da proposta de salvaguarda do monumento nacional e que, independentemente de considerações sobre as respetivas motivações éticas ou enquadramento legal, ultrapassam completamente as competências de uma Junta de Freguesia, a posição do executivo só poderia ser de recusa, ainda que mantendo em aberto o interesse na negociação de quaisquer outras condições particulares, desde que legitimas e dentro das suas competências, tendo sempre em vista a salvaguarda do interesse público em causa, ou seja a salvaguarda do Cromeleque dos Almendres para as gerações futuras.


segunda-feira, 21 de novembro de 2016

AS PEDRAS TALHAS DOS ALMENDRES

nas memórias dos mais velhos


Recentemente a União de Freguesias da Tourega e de Guadalupe, estrutura administrativa que abrange um território conhecido pela sua riqueza megalítica, única em todo o país, promoveu a gravação dos depoimentos de três dos seus habitantes, visando o registo das suas memórias pessoais sobre o Cromelque dos Almendres, ou "Alto das Pedras Talhas", como localmente era conhecido. Com efeito, a identificação arqueológica dos Almendres, apenas aconteceria em 1964 quando o local foi visitado pela primeira vez por Henrique Leonor de Pina, conduzido pelo guarda da Mitra "António Gadunhas", um "verdadeiro camponês arqueólogo", nas palavras do próprio Pina. A divulgação científica aconteceria alguns anos mais tarde, no II Congresso Nacional de Arqueologia que teve lugar em 1971 na cidade de Coimbra.

À data daquele reconhecimento, já todos os três entrevistados eram homens adultos, residentes em Guadalupe e interessava-nos ouvir as suas próprias experiências relativamente ao "antes", ao "durante" e ao "depois". Com efeito o Ti Bento Rosa Calhau, nascido em 1936 na Torre dos Coelheiros, viria ainda criança para a Herdade dos Almendres, onde fez de tudo um pouco como "jornaleiro". É o único sobrevivente do trio de trabalhadores (integrado também por Jacinto Samina, do Monte das Pedras e António Canaverde, da Boa Fé) que por volta de 1959, às ordens e sob a orientação do proprietário da Herdade, Eng. Miguel Soares, procedeu aos primeiros levantamentos de menires no Cromeleque. Ainda que sem qualquer enquadramento científico, presume-se que às motivações de Miguel Soares, estaria já subjacente algum reconhecimento empírico da natureza pré-histórica do local. Cruzando várias informações, incluindo entrevista realizada em 2014 com o Ti Bento, o malogrado arqueólogo Pedro Alvim (falecido em 2015), chegara à conclusão que aqueles trabalhos de 1959, incidindo sobre menires semitombados e realizados apenas com meios tradicionais e força humana, não terão desvirtuado no essencial, a estrutura básica do monumento, posteriormente completada com os trabalhos arqueológicos de Mário Varela Gomes.





Sobre Joaquim Feliz Casquinha, mais conhecido por Joaquim Cristéta, já aqui tinhamos deixado anterior notícia ( http://pedrastalhas.blogspot.pt/2016/11/o-ti-cristeta-e-as-pedras-talhas.html ). Nascido em 1925, é o mais idoso dos três entrevistados. Já aposentado de uma longa vida de trabalhador rural, foi um entusiástico colaborador nas escavações realizadas nos anos oitenta no Cromeleque e dirigidas por Mário Varela Gomes, com a colaboração de Francisco Serpa. Era importante registar o seu testemunho pessoal sobre essa sua experiência, que inclui até algumas "quadras" dedicadas ao Cromeleque.




Por fim, seria também importante recolher o testemunho de Manuel Estevão, nascido em 1935 no Monte da Pedreira, ao Escoural. Tal como os outros entrevistados, Manuel Estevão trabalhou desde criança na agricultura, onde fez de tudo um pouco. Ainda jovem já era pastor mas a dureza daquela vida ("estava meses sem poder ir a casa") levaram-no a procurar outros trabalhos após o serviço militar. Viria a especializar-se como "canteiro", profissão que chegou a exercer na emigração. No entanto seria como funcionário da pedreira municipal da Fiúza (Évora) que viria a ser chamado no final dos anos 80 para colaborar nos grandes trabalhos de restauro coordenados por Mário Varela Gomes e promovidos pela autarquia eborense (na altura a Herdade dos Almendres estava ainda integrada na UCP de Guadalupe). À sua experiencia e conhecimento técnico se ficou a dever não apenas a reerecção de diversos menires mas também a remontagem e colagem de alguns que se encontravam partidos. Reconhecida a qualidade do seu trabalho, viria a colaborar também no restauro do vizinho Cromeleque da Portela de Mogos, e mais tarde, há cerca de duas décadas, na delicada operação de remontagem do gigantesco menir de Meadas em Castelo de Vide. Interessava pois também gravar as suas memórias pessoais das Pedras Talhas.





À esquerda João Bacelar, o operador de câmara, e Panagiotis Sarantopolos (arqueólogo da Câmara Municipal de Évora), durante a recolha dos depoimentos