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terça-feira, 27 de outubro de 2015


Uma oportunidade perdida

O núcleo da memória da Aldeia da Luz: Monte dos Pássaros, cemitério, Museu e Igreja Matriz


Sempre que passo no Museu da Luz, tenho uma indisfarçável sensação de "oportunidade perdida". Não que isso tenha algo a ver com o Museu ou o modo como tem sido gerido, bem pelo contrário... (até porque considero aquele Museu, para o qual ainda dei algum contributo, como uma das heranças mais interessantes do Alqueva). Mas porque com um pouco mais de visão e de capacidade interventiva da parte do acompanhamento cultural do "projecto Alqueva", esta estrutura poderia ter ajudado a minorar aquela que considero a falha mais grave do Plano Arqueológico do Alqueva (na sua fase "barragem"), que em quase todos os restantes aspectos correu relativamente bem, incluindo a fase de publicação e divulgação de resultados recentemente concluída. Refiro-me em concreto aos problemas de gestão dos numerosos espólios arqueológicos recolhidos, hoje dispersos pelas mais variadas instituições (se não mesmo, nalguns casos ainda à "guarda" dos arqueólogos coordenadores de projectos). Consciente das previsíveis dificuldades neste domínio, bem cedo procurei como responsável geral do Projecto, constituir uma "Reserva Arqueológica do Alqueva", inicialmente integrando os materiais recolhidos no âmbito das prospecções e dos diversos EIAs, mas que verdadeiramente  pouco mais representava nos seus primeiros tempos, do que um espaço de armazenamento temporário, dada a total falta de meios humanos que assegurassem o normal funcionamento de uma estrutura deste tipo. Já com as escavações em curso ao longo do Vale do Guadiana, a Câmara Municipal de Reguengos de Monsaraz, chegar-se-ia "à frente", com a proposta de um Museu Regional de Arqueologia que viesse a absorver os resultados científicos e materiais do grande projecto, propondo-se desde logo assegurar a constituição da respectiva "reserva". Paralelamente a EDIA, no âmbito das contrapartidas pelo "afundamento" da Aldeia da Luz, propunha-se construir um Museu na nova aldeia. Porém, porque se tratava á partida de um museu etnomonográfico e por outro porque os orçamentos eram curtos face às múltiplas exigências de uma população desgastada pela "espera" e acicatada pelos "media", o programa original deste museu nunca foi além dos estreitos limites da "memória da aldeia" (felizmente a sua direção tem sabido ultrapassar o que são as suas limitações de espaço e meios, com actividades que extravasam em muito o  âmbito local a que parecia condenado...). Cumulativamente, a Administração da EDIA, algo assustada com a dimensão que os trabalhos arqueológicos haviam assumido, julgo que terão rejubilado com a proposta da Câmara Municipal de Reguengos. De facto, em vez de reagir negativamente a uma proposta que poderia acarretar grandes custos financeiros para o Empreendimento (mas que, de facto seria uma sua responsabilidade), aceitaram de bom grado a iniciativa autárquica, financiando até alguns dos estudos  museológicos então promovidos pela Câmara. Mas, tornou-se rapidamente óbvio que a Empresa EDIA não tinha qualquer intenção de se comprometer com o projecto de um grande Museu de Arqueologia remetendo sempre para o "Estado" accionista e concretamente para o Ministério da Cultura, uma qualquer decisão nesse sentido. Para mim, embora já fosse tarde para reverter a situação, tornou-se evidente a certa altura de que a solução ideal, teria passado por um Museu da Luz com outra ambição e naturalmente com outro programa. Mesmo sem imaginarmos uma estrutura muito pesada do ponto de vista técnico ou administrativo (que hoje seria incomportável) poderíamos no entanto imaginar, ao lado da relativamente contida área expositiva e social do actual Museu e tirando partido do próprio terreno, um grande mas simples armazém capaz receber e conservar a grande maioria dos materiais arqueológicos do Alqueva, hoje completamente dispersos. Há no entanto uma feliz excepção àquela dispersão: desde há bastante tempo que o Museu da Luz, tirando partido do espaço anexo do vizinho Monte dos Pássaros, conserva os materiais das escavações realizadas na Freguesia da Luz, incluindo as das escavações no Castelo da Lousa.
Com um pouco mais de visão, o Museu da Luz, a par da memória da velha aldeia, poderia ter agregado a função de Centro de Património e Arqueologia do Alqueva, integrando um Centro de Documentação e uma Reserva Arqueológica.
Algures em 2002, numa altura em que o Museu da Luz estava já em adiantada construção, tendo consciência de que o projecto da Câmara Municipal de Reguengos de Monsaraz, na sua concepção original de grande Museu Regional de Arqueologia, estava condenado ao insucesso, ainda tentei junto da administração da EDIA fazer passar uma proposta faseada que me parecia aceitável: num primeiro momento, tirando partido do terreno disponibilizado pela autarquia para a reconstituição do "Cromeleque do Xerez", salvo das águas, sugeria a instalação de um "Centro de Património e Arqueologia de Alqueva", com uma dupla função: enquadrar a visita pública ao monumento reinstalado, ele próprio um símbolo do projecto de salvamento arqueológico e constituir uma área de reserva documental e armazém dos espólios do projecto arqueológico do Alqueva. Se tudo corresse bem e se angariassem futuramente os meios necessários, o Centro poderia mais tarde evoluir para um verdadeiro Museu. Infelizmente, a proposta cairia em saco roto e hoje, até o "Cromeleque" reconstituído parece esquecido e abandonado na baixa de Monsaraz.

O cartaz que anunciava o ambicioso projeto da Câmara Municipal de Reguengos para constituição do "Museu de Arqueologia do Alqueva"
O Cromeleque do Xerez pouco depois de reinstalado nas proximidades do Convento da Orada (Monsaraz), e que deveria ficar associado ao futuro Museu de Arqueologia do Alqueva


Em anexo, divulgo um pequeno memorando que reencontrei nos meus "papéis" sugerindo a constituição de um Centro de Património e Arqueologia do Alqueva", como primeira fase para o projeto do Museu...







quinta-feira, 7 de maio de 2015



Para a história do "Cromeleque do Xerez"

O Cromeleque do Xerez, ainda na sua localização resultante do restauro de Pires Gonçalves, na Herdade do Xerez. Toda esta área encontra-se actualmente submersa
Em recente entrada para este Blog referi a actual situação do "remontado" Cromeleque do Xerez e recordei as circunstancias decorrentes dos trabalhos arqueológicos realizados no Alqueva que estiveram na origem daquela que foi a única "transposição" de um monumento arqueológico ensaiada no âmbito daquele projecto. Poderíamos referir a situação da antiga Igreja da Luz (e valerá a pena um dia recordar esse tema) mas nesse caso, assistimos à construção de um "pastiche", a que se agregaram alguns elementos recuperados da igreja antiga, entretanto demolida. Volto ao tema do Cromeleque, porque reencontrei um delicioso texto do Professor Raul Miguel Rosado Fernandes que, com a devida vénia, não resisto em reproduzir na íntegra, até porque o original, constando de um livro de 2009 de homenagem ao Professor Doutor Mário de Albuquerque, não deve ser muito acessível para arqueólogos. Rosado Fernandes, conhecido do grande público por ter sido a certa altura dirigente da CAP (Confederação dos Agricultores Portugueses) foi até à construção da Barragem do Alqueva proprietário da Herdade do Xerez, que coincidia em parte com uma uma extensa bacia na margem direita do Guadiana, a Sul de Monsaraz, a qual pelas suas características e localização, se revelou como um verdadeiro "palimpsesto" pré-histórico. Para além do Cromeleque e outros menires avulsos identificados por Pires Gonçalves e da Anta do Xerez, referenciada pelos Leisner como bem refere no texto, os trabalhos associados ao Alqueva aí levaram à identificação de uma miríade de vestígios de ocupações humanas pré-históricas, obrigando a uma especial concentração nesta área de acções de investigação. De entre os sítios mais importantes aqui referenciados, recordamos ainda o acampamento epipaleolítico da Barca do Xerez ou o habitat do neolítico antigo do Xerez 12, onde foram descobertos e escavados vários fornos culinários. Foi precisamente a descoberta do sítio da Barca do Xerez que motivou uma visita a esta Herdade, algures no início de 1998, da Comissão Científica instituída pela EDIA para acompanhamento dos trabalhos arqueológicos do Alqueva. Esta integrava os arqueólogos Luis Raposo, Vitor Oliveira Jorge e Jorge Alarcão, a historiadora Maria José Ferro e o Arquitecto Pedro Fialho (já falecido), académicos quase todos conhecidos de Rosado Fernandes, ele próprio Catedrático da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Recordo bem o momento em que alertado pela passagem de várias viaturas no casario do Monte do Xerez de Baixo, Rosado Fernandes apareceu em fato de macaco que já conhecera melhores dias, e de como, ao reconhecer tantos e distintos colegas, citou Tolstoi, ironizando com a sua desajeitada indumentária rural. No texto que aqui divulgo, Rosado Fernandes dá conta das circunstancias da descoberta dos menires do Xerez, relatando e comentando a reconstituição feita por Pires Gonçalves e reflectindo, sem ser arqueólogo, sobre as dificuldades e armadilhas da produção do conhecimento nesta área. De facto, apesar das novas escavações conduzidas na altura por Mário Varela Gomes terem sido inconclusivas no que respeita á forma original do monumento, foi (quase) consensual a decisão tomada de se respeitar o quadrilátero proposto por Pires Gonçalves, na reconstituição feita anos mais tarde na Orada de Monsaraz. Afinal, os arqueólogos devem ser os primeiros a lembrar que os sítios e os monumentos arqueológicos, são antes de mais uma "construção", quantas vezes meramente plausível, dos seus descobridores, que ao escavarem ou restaurarem fazem opções, quantas vezes condicionadas pela sua formação, experiência ou mesmo pelas suas obsessões...
Visita os membros da Comissão científica de acompanhamento dos trabalhos arqueológicos do Alqueva, acompanhados por outros arqueólogos, à  Herdade do Xerez onde se havia localizado o acampamento epipaleolítico da Barca do Xerez (1998)



quinta-feira, 16 de abril de 2015




Cromeleque do Xerez



O Cromeleque no GoogleEarth, (imagem de Setembro de 2013), comprovando a desvirtuação do projecto paisagístico

Numa página do Facebbok que julgo oficial (Câmara Municipal de Reguengos?) acompanhando uma excelente foto, recolhi o seguinte texto:

Cromeleque do Xerez

Erguido cerca de 5000 anos antes de Cristo por uma comunidade pré-histórica de agricultores e pastores, talvez num ritual de apropriação do território, o Cromeleque do Xerez foi identificado em 1969 por José Pires Gonçalves após a sua descoberta por José Cruz e Leonel Franco. O seu singular formato quadrangular desenvolve-se em torno de um menir central de cerca de 4 metros de altura, que apresenta numa das suas faces diversas covinhas em toda a sua verticalidade. Este cromeleque foi o único monumento da região a ser transferido para outro local (junto ao convento da Orada), em 2004, devido à construção da barragem de Alqueva.


Dadas as minhas antigas responsabilidades em todo o processo que envolveu a (re)escavação do local original pelo Mário Varela Gomes (1998), a respectiva publicação e posterior decisão para desmontagem e reinstalação do monumento próximo da Orada, segundo projecto do Arquitecto Daniel Monteiro, executado pela Câmara Municipal de Reguengos (2004) e financiamento da EDIA, não resisti a ler os comentários deixados na rede social, alguns bem críticos do estado actual do monumento. De facto, tendo lá passado recentemente, também verifiquei com desagrado a situação de aparente abandono de um sítio que tinha todas as condições para ser um ícone quer do rico megalitismo de Reguengos, quer do projecto arqueológico do Alqueva, fazendo o contraponto com o Museu da Luz na outra margem do Lago. É certo que a (ambiciosa) intenção original da autarquia, passava pela construção neste mesmo terreno, em articulação com a reinstalação do Cromeleque, de um grande museu de arqueologia que tirasse partido das centenas de escavações arqueológicas realizadas no âmbito do Aqueva. Tal intenção, infelizmente, não teve condições para avançar (nomeadamente financeiras), limitando-se a intenção à concretização, parcial, do excelente projecto do arquitecto Daniel Monteiro (colaborador do Arquitecto Souto Moura na obra do estádio do Braga). A situação que observei no local, é de facto algo desoladora, mas felizmente não é irreversível, carecendo essencialmente de alguma manutenção e sobretudo, de alguma disciplina no controle do acesso indiscriminado de viaturas até junto do monumento, que acontece à revelia de toda a lógica do projecto, com espaço previsto e construído para estacionamento. É certo que o acesso pedonal deveria ser feito através de uma "casa abrigo" hoje fechada (mas onde chegou a haver exposições) e que dificulta a passagem dos visitantes ao longo da interessante "alameda" de alvenaria branca que nos leva ao cromeleque. A sua substituição por um simples telheiro que exponha alguma informação e, sobretudo, o "corte físico" do acesso de viaturas ao Cromeleque, é um primeiro passo para a requalificação que se espera a autarquia possa concretizar urgentemente.

Desmontagem e transporte dos menires do Xerez em Novembro de 2001
O "anúncio" do Museu que não chegou a sair do papel...

Remontagem do Croemeleque, junto da Orada em Junho de 2004

A degradação visual da envolvente imediata do Cromeleque. O placard do "Museu" anuncia agora o "Dark Sky do Alqueva"!


Nas proximidades, uma inefável rotunda megalítica (?), tem pelo menos melhor apresentação...