A REINVENÇÃO DO CASTELO DA LOUSA
No próximo Sábado, 19 de Dezembro de 2015, o Arquitecto Pedro Pacheco, autor do projecto de arquitectura do premiado MUSEU DA LUZ, irá apresentar a público naquele Museu uma exposição sobre o "Castelo da Lousa", o sacrificado sítio romano localizado junto ao Guadiana no território da velha Aldeia da Luz. Mas ao contrário do que sucedeu com a aldeia, desmantelada por razões ecológicas e psicológicas, casa a casa, rua a rua, o "Castelo da Lousa" viria a ser objecto de uma complexa e pouco usual intervenção de protecção, precavendo a possibilidade de num futuro incerto e distante, já sem o lago do Alqueva (?) os nossos descendentes poderem decidir repôr à vista, - eventualmente numa paisagem lunar- o que restar das ruínas de há 2 100 anos atrás.
Desenganem-se porém os arqueólogos. Não se trata de uma exposição de "arqueologia", embora essa dimensão, como não poderia deixar de ser, também esteja presente. Artistas plásticos, arqueólogos, historiadores, mas também habitantes da velha aldeia vizinha, à sua maneira e com a sua sensibilidade e experiência falam de um sítio que já é apenas memória ou, quanto muito, restos de objectos descontextualizados ("fiapos da memória" como lhe chamava o Benjamim Pereira, o etnólogo responsável pelo excelente projecto de museologia do Museu da Luz) e, por consequência, porque no sítio em causa aparentemente não existe nada, no título da exposição temos uma coordenada geográfica, um ponto no espaço que assinala algo que já não se vê mas que persiste no nosso imaginário.
Uma das mais interessantes novidades das escavações da ARKHAIOS_ a identificação da pedreira romana original |
Escavações da ARKHAIOS |
Jürgen e Regula Wahl, em Outubro de 2001, na Lousa |
Ainda no que respeita à Arqueologia e a este projecto também não posso esquecer a estreita colaboração com a Universidade da Beira Interior que através do meu velho amigo Martin Hock actualizou, com milimétrica precisão, os levantamentos arquitectónicos. É uma lista enorme de colaborações, até porque ao nível da divulgação houve uma especial preocupação desde os primeiros momentos, não só para proporcionar enquanto era possível a visita ao sítio (melhorando caminhos, instalando passadiços, etc.. e nisso teve um papel preponderante o meu directo colaborador Zé Perdigão) mas também para produzir todo um conjunto de material (CDROM, Video, publicações) que minimizasse a grande "maldade" que se anunciava. O afundamento do monumento. Quando se começou a levantar a hipótese da sua protecção, naturalmente com muitas dúvidas e hesitações técnicas e éticas, foi decisiva a colaboração com o prestigiado LNEC, onde tive todo o apoio de outro velho amigo (desde os tempos dos estudos sobre a conservação dos monumentos megalíticos no Alentejo), o Delgado Rodrigues que coordenou a equipa que produziu o respectivo estudo e cujas conclusões foram decisivas para o projecto posteriormente concebido pelo malogrado Eng. Diamantino Saraiva. (ver a este propósito: https://www.academia.edu/6072576/Reburying_the_archaeological_structures_in_the_Alqueva_Project )
O Castelo da Lousa, antes do início dos trabalhos de protecção. A sinalética e o passadiço era já da responsabilidade da EDIA |
O início dos trabalhos de proteção |
A cobertura do monumento em fase avançada, Fevereiro de 2002, por altura do fecho das comportas de Alqueva. |
Para registo e memória futura, aqui transcrevo a Nota de Imprensa que preparei para os serviços de comunicação da EDIA, em 22 de Outubro de 2001
Protecção do Castelo da Lousa
Conforme programado, iniciaram-se recentemente os
trabalhos preparatórios com vista à concretização da "selagem e
protecção" das ruínas do Castelo da Lousa, operação já adjudicada e
que deverá estar concluída quando se iniciar a formação do Regolfo de Alqueva.
Por motivos de segurança a partir de agora as visitas a este sítio
arqueológico, já de si de acesso difícil em época de invernia, ficam fortemente
condicionadas.
Singular monumento da época romana, o impropriamente chamado "Castelo
da Lousa", está localizado a 3 quilómetros da Aldeia da Luz na margem
esquerda do Guadiana entre as cotas 120 e 130. A estreita relação com o Rio,
factor que terá sido determinante na escolha do local para a sua implantação,
acarreta também a inevitabilidade da
próxima submersão pela Barragem do Alqueva, hipótese que estava já presente
quando nos anos 60 Afonso do Paço e Bação Leal aí realizaram as primeiras
escavações. Àqueles investigadores se deve não só o reconhecimento do interesse
arqueológico do local, desde logo interpretado como "fortim romano",
mas também a descoberta das suas ainda imponentes estruturas arquitectónicas
graças a sucessivas campanhas de escavação realizadas entre 1963 e 1970. A
teoria da sua função militar viria, no entanto, a ser contestada nos anos 80
pelo arqueólogo alemão Yurgen Wahl que aí procedeu a novos levantamentos e
estudos. Para este arqueólogo ligado à Universidade de Colónia e que tem vindo
a colaborar com a EDIA nas investigações mais recentes, a estrutura
arquitectónica do monumento corresponderia a uma "villa" ou grande
casa fortificada relacionada provavelmente com a actividade agro-pecuária. No
entanto, Yurgen Wahl, em artigo importante ainda hoje só disponível em alemão
confirmou as datações já antes avançadas pelos investigadores portugueses. O
monumento fora construído em meados do Século I antes de Cristo, nos finais da
época Republicana, tendo sido abandonado cerca de um século depois, já em pleno
Império.
Dada a particular importância deste monumento que durante
muito tempo partilhou com o "Cromeleque do Xerêz" especial
preocupação dos arqueólogos face ao Empreendimento de Alqueva, o mesmo viria a
ser objecto a partir de 1997 de um conjunto de acções específicas no quadro do
Plano de Minimização dos Impactes Arqueológicos do Alqueva elaborado pela EDIA
e aprovado pelo Ministério da Cultura. Destacam-se antes de mais todo um conjunto
de novas escavações arqueológicas realizadas por uma firma de Évora a ARKHAIOS
com a colaboração do Instituto de Arqueologia da Faculdade de Letras de
Coimbra, que nos dão hoje uma visão muito mais alargada do complexo
arquitectónico original. Ainda que em termos de informação genérica
(cronologias, espólios e funções) não se verifiquem grandes novidades em
relação aos dados já conhecidos, a zona com ruínas reconhecidas aumentou
sensivelmente para o dobro colocando novas questões interpretativas. Esta
oportunidade foi igualmente aproveitada para se realizarem novos levantamentos
topográficos, adjudicados à Universidade da Beira Interior e, mais
recentemente, prospecções geofísicas. Para lá de estar previsto o apoio à
publicação científica dos resultados das novas escavações, actualmente em vias
de conclusão, a EDIA prepara desde já a execução de meios museográficos com
vista ao futuro tratamento da memória do Castelo da Lousa, tema a que será dado
um destaque especial no Museu da Aldeia da Luz, já em construção na nova
aldeia. Referimo-nos à produção de maquetes das ruínas, bem como de um CDRom
interactivo que a par de outra informação disponibilizará um largo conjunto de
imagens panorâmicas (360º) do monumento e da paisagem envolvente, tal como ele se
encontrava na fase final das escavações.
Embora apenas decorresse das condicionantes impostas pelo
processo de Avaliação de Impactes Ambientais, a minimização de impactes através
do registo arqueológico, ou seja, através de novas escavações, situação comum a
outras dezenas de sítios que serão submersos pelo Alqueva, no caso do Castelo
da Lousa considerando o seu especial significado a EDIA tomou a iniciativa de
ir mais além. Solicitado ao Laboratório Nacional de Engenharia Civil um estudo
sobre os efeitos da submersão e a viabilidade de medidas de salvaguarda, os
técnicos do LNEC concluíram que, apesar dos graves problemas de conservação
estrutural detectados, era possível aumentar a capacidade de resistência das
ruínas à submersão se fossem tomadas algumas medidas preventivas. A busca de
uma solução técnica adequada não se revelou fácil nem consensual, tendo em
conta a total ausência de experiências semelhantes mesmo a nível internacional,
e a localização do monumento numa escarpa de xisto sobranceira ao Rio e
delimitada por duas ribeiras muito encaixadas. Depois de abandonada uma
primeira solução do tipo "enrocamento", quer pelas dificuldades de
execução quer pelas implicações negativas sobre as novas áreas arqueológicas
entretanto descobertas, viria a ser aprovada pelo IPA e pelo IPPAR, uma solução
com menos impacte arqueológico e que passa pela cobertura do monumento por uma
estrutura formada por alguns milhares de sacos de geotêxtil, resistentes à água
e preenchidos por areia. O projecto é da responsabilidade da COBA tendo a obra
sido adjudicada à firma CONDURIL, pelo valor de 47 600 000$00,* com um prazo de
execução previsto de 2 meses.
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* cerca de 240 000 €
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