Ontem dia 1 de Junho começou a ser divulgado na NET o
cartaz-programa da 4ª festa do “Solstício Megalítico de Guadalupe”, que este
ano acontecerá no domingo dia 21 de Junho (o momento exacto do início do Verão será às 16,38 h). Será pois oportuno recordar as circunstancias que rodeiam esta
(quase) tradição local. É verdade que há muito tempo que os Almendres vinham a chamar
a atenção de grupos alternativos de variadas inspirações (new age, esotéricos,
neoceltas, etc…), sendo normalmente citado na “literatura especializada” nacional de lugares "misteriosos"ou
servindo mesmo de palco para “cerimónias rituais” dos mais variados tipos e géneros.
Pessoalmente como arqueólogo e residente, nunca me incomodaram tais
manifestações desde que estas respeitassem fisicamente o monumento, o lugar e a sua
envolvente, o que infelizmente nem sempre acontece. As fogueiras, eventualmente
provocadas em contextos menos “espiritualistas”, são apenas um dos aspectos
negativos mais evidentes ainda que não necessariamente associado às ditas manifestações. Recordo em especial, uma noite de “rave”, obviamente
clandestina, organizada por alternativos “hippies” há quase duas décadas (julgo que após expulsão da cidade de Évora) com
música em altos decibéis que ecoou pelo vale durante quase toda a noite…
Finalmente quando no Natal de 2011, após longos meses de “conversações”
com a família actualmente proprietária dos Almendres, se conseguiu autorização
para a instalação de um parque de estacionamento, a uma distancia conveniente
do monumento, pareceu-me que estavam reunidas algumas condições para usar o
fantástico sítio dos Almendres, como
cenário ideal para eventuais manifestações artístico-culturais que ajudassem a população local a envolver-se mais na salvaguarda e valorização do monumento. Naturalmente,tais manifestações ainda que de âmbito mais laico, poderiam integrar eventualmente essa já forte tradição de relacionamento do local com o
calendário cósmico, que como já aqui referimos em anterior post a propósito do último equinócio, tem algumas raízes factuais em estudos já bem antigos
do Professor Marciano da Silva.
http://pedrastalhas.blogspot.pt/2015/03/almendres-o-sol-falhou-o-equinocio-hoje.html.
http://pedrastalhas.blogspot.pt/2015/03/almendres-o-sol-falhou-o-equinocio-hoje.html.
Em 2012, uma vez criado o parque (provisório) de
estacionamento, e realizado pela eco-brigada
municipal, um significativo esforço de recuperação do solo do Cromeleque, muito
degradado pelo pisoteio turístico e pela erosão pluvial, a população de
Guadalupe, enquadrada pela Associação de Idosos e pela Junta de Freguseia,
decidiu lançar mãos ao projecto de, em torno do monumento, construir uma tradição
de festa, associada ao Solstício de Verão. É verdade que a data não é a mais original
nem mais adequada no contexto regional, já que a tradição das festas joaninas
com grande expressão em Évora (feira de São João), não são mais do que a
continuação cristã de um antiquíssimo costume que tem a sua origem registada em
época romana mas que certamente remontará a períodos bem mais antigos… Mas, se
qualquer dos equinócios poderia servir (há quem defenda que essa seria a
orientação estrutural do Cromeleque), já o ambiente climatérico poderia não ser
tão agradável. De qualquer modo em 2012 fizémos a 1ª festa, um tanto ou quanto
ambiciosa, repartida entre o Cromeleque e a aldeia, entre a despedida ao Sol
poente na véspera do Solstício, e a saudação ao Sol nascente na madrugada
seguinte. Os passeios pedestres, dando a conhecer a locais e forasteiros a
paisagem envolvente, têm sido recorrentes, tal como alguma pedagogia ambiental e patrimonial, concretizada com a participação de colegas arqueólogos e biólogos em ateliers de temáticas diversas. Finalmente em 2014, a própria autarquia produziu no local o primeiro espectáculo erudito. Pelas imagens anexas e quando preparamos a 4ª festa do solstício por várias razões bem menos ambiciosa),
relembramos o essencial da experiência passada. Julgo que o desejado envolvimento da população de Guadalupe está longe de atingir o nível que procurávamos há quatro anos mas uma coisa é certa já. A nenhum dos nossos vizinhos é agora indiferente o interesse forasteiro que sentem em torno de um sítio, as Pedras Talhas, que há muito conheciam mas que pouco ou nada valorizavam. Falta talvez apenas um pequeno passo para que finalmente o assumam como uma herança colectiva, recebida dos pais e avós, a qual devem legar aos seus filhos e netos, se possível, enriquecida com o seu próprio contributo. A isso se chama "património".
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