São João dos Azinhais, Torrão
Poderia ser apenas mais uma das dezenas (centenas?) de
capelas rurais isoladas do Alentejo, arruinadas pelas catástrofes ou pelo
abandono provocado pelo despovoamento ou pela desmemória das gentes. Mas não! Como
em muitos outros exemplos, estas capelas ainda que revelando nas suas
estruturas, a religiosidade construtiva que nos séculos XV e XVI atravessou as
terras de aquém Tejo, não surgiam do nada. Quase sempre lhes está subjacente
uma longa história de séculos normalmente iniciada em época romana senão ainda
bem antes disso (lembremos as “antas-capelas”!). No caso de São João dos
Azinhais, já uma ruína há muito abandonada pela paróquia do vizinho Torrão a
quando da construção da Barragem do Vale do Gaio em meados do século passado,
que quase a submergiu, os seus antecedentes já estavam assinalados por André de
Resende, dada a presença de inscrições de época romana e visigótica. Leite de
Vasconcelos que andou por terras do Torrão, quis ver as lápides publicadas pelo Mestre Renascentista mas não
chegaria a ter oportunidade para isso. Seria bastante mais tarde em 1975, que
Fernando de Almeida, professor da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa
com a colaboração de dois discípulos, António Cavaleiro Paixão, um colega e
amigo recentemente desaparecido, e Judite Paixão aí procederiam à recolha e
estudo de diversos materiais, comprovando que a localização da Igreja tina
atrás de si um longo historial. Pode ler-se no final do artigo que publicaram
em 1978 na Revista Setúbal Arqueológica: “O
Dr Leite de Vasconcelos encontrou por ali materiais neolíticos. Depois
surge-nos bem marcada a ocupação romana evidente pelo monumento funerário a um
jovem, talvez inscrito na Ordem Senatorial. Vem depois o período visigótico com
a capela ali construída em data assinalada e uma série de pedras trabalhadas da
mesma época, a confirmarem a existência do templo e os cuidados postos no seu
embelezamento. Por fim aparece a lápide com a Cruz de Santiago, como que a
recordar os direitos da Ordem por aquelas paragens.” Das inscrições e
lápides já nada subsiste no local, estando algumas preservadas no Museu de Arqueologia de
Setúbal ou no próprio Torrão, na Igreja da Misericórdia. A Igreja propriamente
dita, não passa hoje de uma ruína que, apesar de tudo, mereceria pelo menos o
respeito e a reflexão de uma população mais culta que aqui teria um espaço
ideal de reflexão sobre o tempo e a inevitabilidade dos seus efeitos. Talvez
por isso e só por isso, após uma proposta de 1991 da Câmara Municipal de
Alcácer, o que resta de São João dos Azinhais, foi finalmente classificado em 2013 como
Monumento de Interesse Público.
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São João dos Azinhais, em foto fo site da C.M. de Alcácer do Sal, talvez dos anos 80 |
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A galilé já derrubada, em foto de 2008 |
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Restos de pintura a fresco no interior (2008) |
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Vista de conjunto de 2008 |
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Vestígios arqueológicos que a erosão provocada pela albufeira da Barragem do Vale do Gaio (ou Trigo de Morais) vai mostrando. Nas proximidades na margem contrária da Ribeira do Xarrama, hoje represada, Carlos Tavares da SIlva e Joaquina Soares viriam a identificar nos anos 80 o conhecido povoado calcolítico do Monte da Tumba. |
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